A
Constituição de 1988 previu a realização de plebiscito em 1993, para que o povo
se manifestasse entre os sistemas de governo parlamentarista ou
presidencialista, sendo largamente vencedora a opção pelo presidencialismo.
Embora esta decisão resultante do plebiscito, o tema tem voltado a tona com
freqüência no debate político, sendo, portanto, um tema atual para o
constitucionalismo brasileiro. No entanto, as doutrinas ficam na superficialidade
do debate, apontando vantagens e desvantagens dos sistemas clássicos, sem uma
maioria vinculação com a realidade brasileira. Por isto a necessidade de
estudos mais concretos, com o que desejamos contribuir.
Em relação
ao federalismo adotado no Brasil, a doutrina em geral é unanime em apontar as
deficiências históricas da sua implantação na nossa realidade. É uma forma de
Estado acentuadamente centralizada, apesar dos avanços ocorridos com a Constituição
de 1988.
Deste
modo, este artigo se propõe a fazer uma analise da distribuição do poder
estatal brasileiro, tanto a nível vertical, entre os membros da Federação, como
a nível horizontal, entre os três Poderes da União, fazendo o emprego do
principio de subsidiariedade na redistribuição do poder. Deste modo, queremos
de um lado indicar elementos para um novo sistema de governo que torne o poder
Executivo mais democrático e eficaz. De outra parte, queremos indicar elementos
para uma nova redistribuição do poder a nível territorial, reforçando o poder
regional e local. Mais especificamente desejamos apontar alguns elementos para
uma maior redistribuirão do poder a nível estatal, tanto na relação entre os
poderes centrais quanto destes com as esferas regionais e locais. Esta nova
reengenharia do poder envolve a questão da origem do poder estatal, e,
portanto, repensar a delegação do poder popular e um maior controle popular
sobre o Estado. Um instrumento fundamental nesta reflexão é o principio da
subsidiariedade, constituído essencialmente por dois elementos: liberdade e
solidariedade.
Este
estudo abrange, portanto, dois grandes pontos do Direito Constitucional, a
forma de Estado e o sistema de governo. O objetivo é apontar para o sistema de
governo e a forma federativa de Estado que julgamos mais adequados para a
realidade brasileira, analisando as suas diversas particularidades, e indicando
as vantagens e desvantagens de adotar um modelo e não outro.
Num
primeiro momento vamos tratar de um novo pacto político, que organize a
distribuição do poder. Num segundo momento trataremos do federalismo baseado em
regiões. Finalmente, na parte final, de um Poder executivo dualista, mais
racional e menos concentrador de poder.
Um novo pacto político
Desejamos
dar um maior equilíbrio na distribuição do poder, tanto a nível central como
regional. Neste aspecto é fundamental a noção de subsidiriariedade. Segundo
este principio o poder deve estar mais próximo possível dos cidadãos, ou seja,
das instâncias de poder de proximidade. Este princípio nos permitirá verificar
quais poderes podem ser delegados ao Estado, e, qual o melhor modo do exercício
do poder estatal que permite um maior controle popular.
De maneira
geral, segundo a doutrina, a horizontalidade é a técnica para permitir a
separação entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, enquanto que a
verticalidade é para permitir a distribuição de competências entre os membros
da Federação.
O poder de Estado é uno e indivisível,
de acordo com o principio da soberania, então se torna fundamental pensar o
poder estatal como um sistema central e descentralizado, de maneira
estruturante e não simplesmente funcional. Apesar da abrangência do tema,
queremos analisar o poder estatal como um todo, pois os estudos segmentados, no
nosso entender, pecam por não levar em consideração o poder enquanto sistema,
onde a alteração de uma estrutura pode ter conseqüências sobre outra.
O pacto
federativo
O modo
empregado para a distribuição do poder entre os integrantes da Federação é o
pacto federativo. O pacto federativo vai criar uma nova Constituição, ou como
sustenta André HAURIOU, o pacto federativo deve estar dentro da
Constituição. Desta forma, o pacto federativo se dá através da distribuição das
competências que constam dentro da Constituição federal.
Mesmo que
a idéia de pacto federativo não é presente na cultura política brasileira, as
constituições federais sucessivas tiveram teóricamente o papel, inicialmente de
elaborar o pacto fundador, e sucessivamente, de reafirmar os pactos
federativos.
Os pactos
federativos no caso brasileiro não passam de uma ficção constitucional, porque
inicialmente não houve pacto entre os Estados soberanos para constituir um novo
Estado. Na realidade, seria mais correto afirmar que no início, de 1889 até
1930, existiram pactos políticos entre as oligarquias, e mais tarde, à partir
dos anos 30, pactos políticos entre as elites políticas e econômicas, durante o
processo de edificação do Estado nacional. Deste modo, o que são chamados de «
pactos federativos » são em realidade alianças, na maioria das vezes pouco
explícitas, constituidas normalmente em torno de recursos públicos, No caso
brasileiro, os recursos têm uma importância fundamental na distribuição do
poder, devido a assimetria econômica e social entre os Estados e as regiões. Os
recursos públicos são constituidos de receitas fiscais ( próprias e transferidas,
constitucionais ou negociadas), de receitas disponíveis da União (a maior parte
é gasta nos Estados e nos Municípios), das despesas das empresas estatais
federais, dos incentivos fiscais regionais, setorais e de empréstimos junto ao
sistema financeiro público.
Um
pacto diferente
Nós
propomos um "pacto político" da totalidade do povo brasileiro
através de seus delegados, constituintes, ratificado tanto através de referendo
nacional por todo o povo, como pelo povo, via seus delegados, em ao menos 2/3
dos Estados, o que é chamado de "democracia consociativa". Nós
pensamos que um pacto desta natureza pode assegurar uma democracia ao mesmo
tempo majoritária e respeitosa das minorias territoriais.
Para nós,
o Brasil não é uma Federação, mas mais precisamente um Estado federal. Neste
caso, o poder é distribuído entre a União e as coletividades territoriais
(regionais, estaduais e municipais). A União (todo o povo) deve ser a
representação de todas as coletividades (os grupos de indivíduos). A
distribuição do poder deve obedecer ao principio de subsidiariedade. O poder
deve ficar o mais próximo possível dos cidadãos. No início todo o poder deve
ficar mantido ao nível do Município, e passa em seguida para as outras
coletividades, e enfim, para a União. A União deve ter apenas os poderes
necessários para assegurar a unidade nacional. Todavia, o essencial em um novo
pacto é a tomada de consciência das autoridades centrais a respeito da obediência
ao principio de subsidiariedade. Na verdade, é preciso criar uma cultura da
subsidiariedade na sociedade.
Para
manter o pacto é necessário criar organismos encarregados da coordenação
permanente em vários domínios, entre os representantes do governo central e dos
governos regionais e dos governos regionais entre si, a começar pelas
conferências permanentes entre o Presidente da República e os governadores, e
isto, dentro de uma relação igualitária e de respeito e não de subordinação e
de desprezo como é possível se verificar nos dias de hoje. Da mesma maneira,
devem ocorrer conferências entre os ministros federais e os secretários das
coletividades regionais. A procura de consenso deve guiar as relações entre os
organismos centrais e regionais.
O Senado
pode exercer o papel de responsável da suspensão de atos normativos e
administrativos da União e dos Estados, que possa ir além das limitações de
cada um. O Supremo Tribunal tem também um papel fundamental através da
jurisprudência.
Para
pensar o "pacto político" não se deve dissociá-lo da busca de um novo
papel do Estado na sociedade. Neste contexto, o principio de subsidiariedade
adquiriu uma grande importância, porque segundo este princípio não se deve
transferir para a sociedade tudo aquilo que o cidadão pode fazer por ele mesmo,
e essa não deve transferir ao Estado aquilo que a sociedade pode fazer por ela
mesma.
Refazer o
"pacto político", no nosso entender, é uma passagem obrigatória para
o Estado brasileiro, porque dentro do contexto atual, ele não assegura nem a
unidade e nem a diversidade territorial. O pacto deve vir de baixo em direção
ao alto, o povo deve se sentir parte integrante e fundamental na construção de
um novo Estado. O Estado deve claramente ficar no seu lugar, ele deve ser um
instrumento da sociedade, e em conseqüência a seu serviço e sob o seu controle
permanente.
Federalismo de regiões
A Região
seria um espaço político, econômico, social, cultural, geográfico e histórico,
portadora de uma certa homogeneidade.
A região
se impõe como uma necessidade para preencher a assimetria entre as
coletividades brasileiras. Na "primeira República", os Estados mais
fortes dominaram a política nacional. A "revolução 1930" criou um
Estado unitário nacional. Desde 1946, o poder político deslocou-se para o
Nordeste. Hoje, o poder político está nas mãos do Nordeste e o poder econômico
situa-se em São Paulo. Autores compartilham da opinião de que no Brasil, o
Estado federal é irreal. Deste modo, as Regiões podem restabelecer o equilíbrio
do poder no sentido vertical e voltar a dar a legitimidade às coletividades,
tornando o Estado mais eficaz e mais próximo dos cidadãos. Quanto aos meios
para criar as Regiões, já existem hoje Regiões administrativas de
desenvolvimento. Elas são formadas por Estados federados mais ou menos
homogêneos aos níveis político, econômico, social, cultural, histórico e
geográfico. Assim, seria necessário dar a autonomia político-constitucional
para estas Regiões. Mantendo certas competências atuais dos Estados federados e
dos Municípios, poderia ser destinado para as Regiões certas matérias que
pertencem hoje a competência exclusiva da União e matérias da competência
concorrente entre a União e os Estados federados.
A
criação e a organização das Regiões
A
Constituição federal de 1988 não fez muito progresso a respeito da questão
regional. Ela trata apenas das políticas regionais federais ou das ajudas
financeiras às Regiões menos desenvolvidas. Pelo menos foi a Constituição
federal de 1988 que pela primeira vez deu um estatuto constitucional às
Regiões. A Constituição reservou uma seção especial, "Das Regiões",
para tratar da ação administrativa da União a nível regional.
Nina RANIERI observa que a
Constituição de 1988 trouxe certas inovações ao nível do federalismo, como a
supremacia da nação sobre o Estado e a descentralização fiscal, administrativa
e legislativa, tudo isto com o objetivo de atingir um novo pacto federativo,
mas a fisionomia do federalismo brasileiro não alterou. De acordo com ela, a
criação das Regiões administrativas constitui uma verdadeira inovação.
A
noção de regionalismo no Brasil
No Brasil,
a Constituição de 1946 foi a primeira a dar mais atenção para a questão
regional. Neste contexto, foram criados grandes organismos federais de
desenvolvimento regional, como : SUVALE, CODEVASF, SUDAM, SUDENE, SUDESUL et
SUDECO.
Nos anos
70 e 80, apareceram estudos de publicistas brasileiros que tratavam da divisão
do país em Regiões. Paulo BONAVIDES é o publicista mais conhecido nesses
estudos. Ele tem uma visão muito crítica no que diz respeito ao federalismo
cooperativo. No lugar do "federalismo cooperativo", ou do
"Estado Leviatã", BONAVIDES propõe um "federalismo das
regiões", uma quarta esfera autônoma de governo, acima dos Estados
federados e dos Municípios. Isto, no seu entender, pode constituir um
"verdadeiro instrumento renovador e estimulante da reorganização
político-econômica do sistema, em termos mais realista". Ele observa
ainda o carácter ilusório de um federalismo de Estados federados em níveis
desiguais de desenvolvimento econômico. De acordo com BONAVIDES, a politização
das atuais Regiões deve ser conduzida no sentido de uma reforma federativa.
Esta institucionalização política deve vir completar a institucionalização
econômica já em curso. Ele indica também os benefícios fiscais destinados
às Regiões como um bom método para incentivar o desenvolvimento.
O
constitucionalista Manoel GONÇALVES FERREIRA FILHO admite igualmente que no
futuro poderá ocorrer « uma reorganização regionalista do federalismo
brasileiro », aproveitando-se da experiência das regiões de desenvolvimento que
já existem.
Organização das futuras Regiões autônomas
As Regiões
devem ser constituídas por Estados federados homogêneos do ponto de vista
histórico, geográfico, econômico, social e político.
Paulo
BONAVIDES propõe a distribuição geográfica do Brasil em cinco Regiões, como
sendo a base do federalismo regional: o Norte, o Nordeste, o Sudeste,
Centro-Oeste e o Centro-Sul, como existem hoje. Assim, de acordo com ele,
haveria o Estado regional, o Estado-Membro e o Estado Federal. Nesta nova
divisão das coletividades, BONAVIDES não concentra a sua atenção sobre os
Estados federados, e menos ainda sobre os Municípios. Ele fala da criação de um
estatuto de autonomia das Regiões. Na sua proposta, inicialmente só uma Região
seria criada, a Região Nordeste, porque constituiria, de acordo com ele, a
experiência mais sólida de regionalização que existe no Brasil. Não
compartilhamos com esta proposta de criação de uma só Região no início, porque
isto geraria uma grande assimetria ao nível da distribuição do poder no Estado
brasileiro. Além disso, organizações regionais existem atualmente em outras
partes do país. Por exemplo, existe projeto de lei tramitando no Congresso
Nacional, que propõe a criação de um Parlamento da Região Amazônica (que
agruparia os Estados do Norte), formado pelos representantes das Assembléias
Legislativas dos Estados federados que pertencem a esta Região. Uma das
principais atribuições deste Parlamento seria a elaboração de uma legislação
sobre o desenvolvimento e o meio ambiente. Ou ainda, existe ao Sul do
Brasil, um Conselho intergovernamental chamado CODESUL (Conselho de
desenvolvimento dos Estados do Sul), ao qual participam os governos dos Estados
do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina, do Paraná e do Mato Grosso do Sul.
Estes Estados estão na fronteira com os países do MERCOSUL.
No nosso
entender, uma reorganização regional no Brasil deve conservar mais ou menos a
divisão regional existente atualmente, o que é aceitável para uma grande parte
dos políticos e intelectuais. Contudo, os Estados da Região Centro-Oeste podem
integrar outras Regiões. Por exemplo, o Mato Grosso integraria a Região Norte;
o Mato Grosso do Sul pertenceria a Região Sul, e Goiás para a Região Centro.
Nesta reorganização, nós propomos cinco Regiões políticas (Norte, Nordeste,
Centro, Centro-Sul e Sul), ou seja, as Regiões Amazônica, Nordestina, Central,
Paulista e Sulina), no lugar das cinco Regiões administrativas existentes hoje
(Norte, Nordeste, Centre-Oeste, Sul. Estas novas Regiões, para nós, seriam
homogêneos aos níveis históricos, culturais e geográficos, como do ponto de
vista econômico, social e político.
Por
conseguinte, a Região Amazônica poderia reunir os Estados de Rondônia, do
Amazonas, do Acre, do Mato Grosso, do Pará, do Amapá, de Tocantins e de
Roraima; a Região Nordestina permaneceria com os Estados da Bahia, de Sergipe,
de Alagoas, de Pernambuco, da Paraiba, de Rio Grande do Norte, do Ceará, do
Piauí e de Maranhão; a Região Central seria composta pelos Estados de Rio de
Janeiro, de Minas Gerais, de Goiás, do Espirito Santo e pelo Distrito Federal
(Brasília); a Região Sulina poderia reunir os Estados de Rio de Grande do Sul,
de Santa Catarina, do Paraná e do Mato Grosso do Sul; e a Região Paulista seria
constituída unicamente pelo Estado de São Paulo. Neste último caso, São Paulo
seria ao mesmo tempo Região e Estado federado.
Para Jean
BEAUFAYS, o número de Estados não resulta habitualmente de uma escolha
racional, "pois se deve levar em conta um número determinado pela
geografia, pela história, pela língua, pois convem encontrar as instituições
que se adaptam melhor." Um segundo princípio mostra-nos que mais a homogeneidade
é grande na federação menos este problema apresenta importância. Uma grande
heterogeneidade sentida por um só pode ser suficiente para causar graves
dificuldades ao conjunto (Quebec).
No que diz
respeito aos órgãos da Região, no nosso entender poderia haver um Executivo, um
Conselho e uma Assembléia Regional. O Executivo seria conduzido por um
Presidente da Região eleito pelo sufrágio direto e universal. O Conselho
Regional seria constituído por delegados designados pelos Governadores dos
Estados e um número igual de representantes designados pelos Prefeitos dos
Municipios de cada Estado federado. A Assembléia Regional seria constituída por
Deputados regionais eleitos pelo sufrágio direto e universal.
A Região
não deve vir para enfraquecer ainda mais os Estados federados, pelo contrário,
ela deve ser um órgão a serviço dos Estados federados e dos Municipios. No caso
da União Européia, por exemplo, constata-se que a União procura se impor
através do enfraquecimento do poder dos Estados nacionais. O desejo de alguns é
transformar os cidadãos nacionais em cidadãos europeus, falando antes de uma
Europa das regiões do que de uma Europa dos Estados-nações. Deste modo,
Jean-Louis CLERGERIE se interroga se "o reconhecimento do papel das
regiões na construção européia, que levou os editores do Tratado de Maastricht
a instituir um Comité das Regiões de carácter consultivo, composto de
representantes das coletividades regionais e locais (art.198 A a 198 C), não é
igualmente com a intenção de diminuir progressivamente a influência dos
Estados". Além disso, no Parlamento Europeu, os seus membros são eleitos
nas regiões européias.
No
interior dos Estados federados, entendemos ser necessário a criação de órgãos
que agrupem os Municípios, a fim de preencher certas necessidades que excedam
as capacidades dos Municípios tratarem sozinhos. Mas neste caso estes órgãos
teriam apenas um carácter administrativo. Já existe atualmente Associações de
Municípios em Estados federados; como é o caso do Estado de Rio Grande do Sul.
No entanto, essas associações têm antes um caráter revendicatório, sem contar
com estrutura e meios para intervir. Neste Estado também é possível de ser
encontrado Conselhos de desenvolvimento regional, constituídos por várias
organizações da sociedade civil e dos órgãos municipais. O agrupamento dos
Municípios é observado em países como a Alemanha, onde as associações
constituem um distrito (Landkreise). Estes distritos têm, como os Municípios,
uma personalidade moral própria e órgãos eleitos diretamente pela população.
Eles preenchem as atribuições próprias dos Municípios, sobretudo dos pequenos
Municípios situados no meio rural. Em contrapartida, as grandes metrópoles
constituem sozinhas distritos. No caso brasileiro, as Regiões
metropolitanas, constituídas pelas capitais dos Estados federados e pelos
Municipios vizinhos, poderiam ter um estatuto mais importante que o têm hoje,
com uma estrutura administrativa mais forte, que lhes permitiria intervir mais
eficazmente na resolução dos graves problemas metropolitanos.
Os
poderes atribuidos para as regiões autônomas
Os poderes
podem ser atribuídos para as Regiões através de competências próprias e
da participação no Senado.
As competências das Regiões
Numa forma
de Estado federal, a distribuição das competências aparece como um elemento
central no sistema, porque é a divisão das competências que deve determinar se
um Estado é centralizado ou descentralizado. Este opinião é compartilhada por
autores como Karl LOEWENSTEIN que qualifica a distribuição das competências
como "a chave da estrutura do poder central"; ou ainda conforme
Claude- Sophie DOUIN, que define a distribuição de comepetências como "o elemento
essencial da construção federal".
As
competências de todas as instâncias de poderes devem estar previstas na
Constituição federal. Consequentemente, a Região pode ter o seu próprio
estatuto, elaborado pela Assembléia Regional e sujeito ao Conselho Regional.
As
competências das Regiões poderiam vir de certas matérias, como a educação, a
saúde, a cultura, a segurança interna, o processo administrativo, o direito
eleitoral, agrário, penitenciário e do meio ambiente, a agricultura, o comércio
regional, o transporte, e outros ainda, que pertencem hoje às competências
exclusivas da União e às competências concorrentes da União e dos Estados
federados.
A
participação no Senado Federal
A regra da
participação dos Estados federados no Congresso Nacional é, sem sombra de
dúvida, um dos critérios mais importantes para a caracterização do Estado
federal e para diferenciá-lo das outras formas de Estado. Neste contexto, nós
queremos transformar o Senado brasileiro numa Câmara de representação das
Regiões, dos Estados e dos Municiípios, ou seja, uma Câmara das coletividades e
não somente dos Estados federados.
Cada
Região seria representada ao Senado federal por cinco senadores designados pelo
Presidente da Região. Assim, as Regiões teriam uma representação de 25
senadores ao Senado federal. Propomos também uma representação de 25 senadores
aos Estados federados e 25 senadores aos Municípios. Todavia, deixaremos para
outro se aprofundar no trato do Senado Federal.
Os senadores cessariam ser eleitos
diretamente pelo povo para serem designados pelos chefes dos Poderes Executivos
das coletividades territoriais. Isto para permitir ao Senado representar mais
eficazmente as coletividades, porque o senador eleito pelo povo, teria o mesmo
status que um deputado. Além disso, é comum os senadores serem de partidos de
oposição aos governadores dos Estados, neste caso a representação dos Estados
desaparece quase completamente, pois os senadores ficam mais ligados aos seus
partidos políticos. Em contrapartida, o fato a ser designado pelo chefe do
Poder Executivo retira uma grande parte da legitimidade dos senadores, como
podemos ver por exemplo no Bundesrat (Senado alemão). É por isto que nós
propomos que a escolha do chefe do Poder Executivo seja feita entre pessoas que
possuem um mandato popular, e no caso da Região, tratar-se-ia dos deputados
regionais, dos ex-deputados regionais ou ainda dos ex-presidentes da Região.
Por sua
parte, Paulo BONAVIDES propõe a criação de uma representação regional
composta, no mínimo, do dobro de senadores por Estado, ou seja de seis
senadores por Região. Todos os senadores seriam eleitos pelo voto direto e pelo
sufrágio universal. Ele fala também de uma Assembléia regional composta por
membros eleitos por este mesmo processo. A competência desta Assembléia seria
constituída pelas matérias sobre planejamento e de todas as matérias que
representam o interesse especial das Regiões.
Executivo dualista
Na relação
entre os três Poderes, ressalta-se a importância do Poder Executivo em razão
dos recursos políticos, técnicos e principalmente financeiro, que são muito
fortes, o que lhe permite ter uma intervenção em todo o território nacional. A
concentração de poderes no Executivo lhe permite ter superioridade, seja em
relação aos demais Poderes da União, como em relação aos demais membros da
federação. Esta concentração de poderes, portanto, é responsável pelo
desequilíbrio do poder estatal no Brasil.
O
Congresso Nacional sempre deu maioria ao Presidente da República, uma maioria
de centro-direita, e isto não permitiu a independência do Congresso Nacional.
Além disso, os instrumentos utilizados pelo Presidente da República para assegurar
a sua maioria não pertenciam sempre à boa moral política, as relações de
clientelismo sempre foi um elemento presente. Podemos dizer que a sociedade
política está mais próxima do Estado que da sociedade civil, o que retira uma
grande parte da sua legitimidade. O Senado federal não representa fielmente os
Estados federados e a Câmara dos deputados também não representa devidamente o
povo. O STF raramente cumpre com o seu papel de árbitro entre a União
(Executivo) e os Estados federados (Executivo) e entre a presidência da
República e o Congresso Nacional, porque os contenciosos constitucionais de
grande importância não ocorrem, e a grande parte das suas decisões vai no
sentido de reforçar o poder da presidência da República.
A
força do poder presidencial no Brasil
Inicialmente apresentaremos o Poder Executivo federal no Brasil. O
Executivo é único, o Presidente da República é ao mesmo tempo chefe de Estado e
chefe do governo. Neste presidencialismo, o Presidente é eleito diretamente
pelo povo, em eleição nacional, a cada 4 anos. O presidente não é politicamente
responsável frente ao Parlamento, e este não pode ser disolvido por aquele. O
impeachment é um procedimento que está nas mãos do Congresso Nacional, através
do qual o Presidente da República pode ser afastado do seu cargo, devido a
prática de crime de responsabilidade. No Brasil, como em outros países, a
presidência da República é uma instituição muito forte, podemos dizer que ela
está na primeira fila, na frente das outras instituições.
A
dicotomia entre o presidencialismo majoritário e excludente, de um lado, e o
federalismo consensual e integrador, por outro lado, faz parte da realidade
brasileira. O federalismo, ou a descentralização do poder, apareceu como uma
alternativa possível à transição democrática na América Latina nos anos 80. No
entanto, o presidencialismo constitui um obstáculo ao federalismo, porque o
poder é centralizado excessivamente na figura presidencial, tanto no que se
refere a distribuição horizontal como vertical do poder.
De acordo
com Paulo BONAVIDES, no Brasil sempre houve um Estado muito forte, porque
o Estado veio antes da nação e ele fez a independência do país. A existência
deste Executivo forte, de acordo com o autor, vem reforçar a tese de que
"nunca tivemos um federalismo autêntico e original, nem na doutrina, nem
nas instituições...". Também, ao nível dos Estados federados, a mínima
autonomia destes últimos é em proveito dos Poderes Executivos. Por último, BONAVIDES assinala que "o Decreto-lei, a tecnocracia, a planificação
autoritária e o presidencialismo" são os fatores mais antifederativos no
Brasil. Quando BONAVIDES nos fala de Estado forte queremos entender que esteja
falando de um Estado autoritário, o que historicamente, no nosso entender,
impediu o surgimento de uma sociedade civil fortemente organizada.
No mesmo
sentido, José Afonso da SILVA declara que "a verdade histórica é que
no Brasil o presidencialismo deformou-se na prática do federalismo". O
presidencialismo e o federalismo deformam-se entre si devido ao contexto
sóciopolítico em que se constituíram ao mesmo momento".
A figura
da reeleição do presidente da República foi possibilitada através da alteração
da Constituição federal pela Emenda constitucional n. 16, de 04.06.97. É a
primeira vez que uma Constituição brasileira prevê a reeleição dos chefes dos
Poderes Executivos (Presidente da República, governadores, e prefeitos, e
respectivos vices). A reeleição não fazia parte do constitutionalismo
latino-americano. Ela foi introduzida nos anos 90, após um fenômeno que Olivier
DABÈNE qualifica de contágio. O primeiro país a adotar a nova modalidade
foi o Peru em 1993, com a reeleição de Alberto FUJIMORI, quando era Presidente
e efetuou um golpe de Estado, fazendo passar uma alteração à Constituição que
lhe permitiu a reeleição. Logo após, em 1994, o Presidente Carlos MENEM, da
Argentina, impôs uma alteração à Constituição que permitiu a sua reeleição. Por
último, em 1997, o Presidente Fernando Henrique CARDOSO, no Brasil, apoiou a
proposta parlamentar de alteração à Constituição que autorizou a reeleição dos
chefes de Poder Executivo. A experiência da reeleição no caso brasileiro pode
demonstrar a inadequação deste novo instrumento que permite ao chefe do Poder
Executivo de manter-se no poder. A reeleição, no nosso entender, é associada a
dois problemas principais: por um lado os candidatos não disputam em condições
de igualdade, porque um dos candidatos exerce o poder com mais possibilidades
de visibilidade perante os meios de comunicação social; além disso o fato de
ter a máquina pública nas mãos permite ao candidato chefe do Poder Executivo
exercer muita influência sobre os eleitores, embora também haja a possibilidade
de desgaste por ser governo. Além disso, no caso da reeleição, seria difícil um
controle quanto ao uso da máquina pública pelo chefe de Poder Executivo.
A reforma
constitucional expõe a presidência da República a todas as formas de negociações
políticas. Por esta razão, a revisão da Constituição que durou 7 mês, de 6 de
outubro de 1993 a 31 de maio de 1994, teve como resultado a reforma de 6 dos
245 artigos da Constituição. Depois deste fracasso, o Executivo, que era o
principal interessado nas reformas constitucionais, escolheu a via ordinária de
alteração da Constituição. Nesta nova fase de mudança da Constituição, pode-se
ver claramente as negociações correntemente clientelistas entre o Executivo e
os parlamentares, tomados mesmo nas suas individualidades. Nesta última
situação, o voto do deputado é dado em troca da liberação de recursos para a
base eleitoral do deputado. Além disso, as novas Constituições elaboradas na
América Latina nos anos 80, são bem complexas e detalhadas o que torna difícil
a sua reforma.
O
Presidente da República dispunha, antes da Constituição de 1988, do poder de
legislar através do Decreto-lei. Isto sempre foi um instrumento forte nas mãos
do Presidente. O Decreto-lei dos regimes precedentes foi substituído pelas
"medidas provisórias". Elas se transformaram em instrumento
autoritário nas mãos do Presidente da República. O grande problema das medidas
provisórias era a sua sucessiva reedição, sem que o Congresso Nacional pudesse
apreciar a matéria. Em 11/09/1999 foi promulgada a Emenda Constitucional n. 32
que limitou a reedição de medidas provisórias por uma única vez. O Presidente
da República Fernando Henrique CARDOSO, no poder desde 1994, utilizou
abusivamente o instrumento das "medidas provisórias", usando do
expediente da reedição. O que significa governar sem a participação do
Congresso Nacional.
A relação
entre o Presidente da República e os governadores tem sido geralmente de
superioridade do primeiro em relação aos segundos. O Presidente trata os
governadores como se eles fossem seus subordinados, não existindo relações de
igual para igual. O Presidente da República convida muito raramente os
governadores à "visitarem Brasília", e assim mesmo para tratar de
assuntos gerais, o que normalmente não tem uma aplicação concreta.
Um
novo Executivo federal
O fato de
concentrar o poder na figura de um único chefe do Poder Executivo torna muito
difícil o bom exercício do poder, porque o Presidente da República possui as
atribuições de chefe de Estado e de chefe do governo, e esta situação ainda é
agravada pelo fato do Brasil ter uma dimensão continental.
No
referendo constitucional de 21 de abril de 1993, sobre a natureza do regime, o
presidencialismo chegou na frente, apesar da abstenção de 25,7% dos eleitores.
Para Olivier DABENE "o debate sobre a forma do regime no Brasil é
também o reflexo de um sentimento generalizado de descontentamento em relação a
personalização do poder e as derivações presidencialista. O parlementarismo é
frequentemente apresentado como sendo de natureza a favorecer a consolidação
democrática".
No nosso
entender, apesar dos problemas do presidencialismo, o parlementarismo no Brasil
não é o regime mais adequado. Este regime teve um grande progresso na Europa,
mas a sua adaptação em certas realidades é ainda difícil. No caso brasileiro,
no nosso entender, dois obstáculos principais se apresentam: a escolha dos
deputados e o regionalismo.
No que diz
respeito a escolha dos deputados, ela não é feita da mesma maneira que nos
países desenvolvidos. O Brasil é o país com maior desequilíbrio social no
mundo, onde uma minoria concentra a maior parte das riquezas. Os partidos de
direita e centro-direita têm sempre a maioria no Parlamento, porque para ser
eleito depende-se em grande parte de recursos financeiros. Além disso, grande
parte dos eleitores tem um baixo nível de escolaridade, uma parcela está na
pobreza, aliado ao fato da ausência de uma cultura democrática ao Brasil.
Nestas circunstâncias, o parlamentarismo iria institucionalizar a direita e
centro-direita no poder, porque o Brasil não conhece alternância ao poder entre
a direita e a esquerda. Além disso, na presidencial as possibilidades para os
partidos de centro-esquerda e de esquerda são mais evidentes.
Desde o
início do segundo mandato do Presidente CARDOSO (em janeiro de 1999), políticos
próximos a ele começaram a discutir uma proposta de alteração da Constituição
para a introdução do parlementarismo, mas isto foi percebido pelos partidos de
esquerda como uma tentativa de "golpe", para impedir a esquerda
chegar ao poder pela eleição presidencial.
Quanto ao
regionalismo, ele oferece inicialmente um problema de sub-representação de
certos Estados na Câmara dos deputados, uma situação que é favorável as Regiões
Norte, Nordeste e Centro-Oeste (as Regiões menos desenvolvidas) e desfavorável
as Regiões Sudeste e Sul (as Regiões mais desenvolvidas). Esta sub-representação
assegura uma maioria parlamentar às Regiões que são menos povoadas. Devido a
esta sub-representação, estas Regiões poderiam impôr de maneira duradoura o
chefe de governo, porque os fatos demonstram que elas se reunem sempre quando
os seus interesses estão em jogo.
Em
contrapartida, tentamos apresentar algumas propostas de um modelo que, no nosso
entender, é mais adequado à realidade brasileira. O Poder Executivo poderia
dividir-se em dois: um chefe de Estado e um chefe do governo. O Chefe de Estado
poderia ser eleito diretamente pelo povo, o Primeiro-ministro seria designado
livremente e destituido pelo Presidente da República. O cargo de
Vice-Presidente da República, existente hoje, poderia ser extinto. O
primeiro-ministro poderia ser destituído pela maioria do Parlamento após o
primeiro ano de governo, ou em qualquer momento por crime de responsabilidade.
O Presidente da República poderia livremente designar um novo chefe de governo.
Após um ano do segundo governo, poderia haver a destituição do
primeiro-ministro pela maioria do Parlamento. No caso de uma segunda
destituição do primeiro-ministro, o Presidente da República teria a seguinte
escolha, ou ele aceita que o Parlamento designa o novo primeiro-ministro, ou
ele dissolve o Parlamento e convoca novas eleições legislativas. Caso o
Presidente da República não puder adquirir a maioria no Parlamento haveria uma
nova eleição presidencial.
Para
garantir a governabilidade, a metade dos deputados poderiam ser eleitos segundo
a proporção de votos obtidos pelos partidos ou coligações na eleição
presidencial, pois pode ocorrer do Presidente ser eleito e ter uma minoria
considerável, o que iria afetar o equilíbrio governamental. No caso, os
candidatos à presidência da República que não fossem eleitos poderiam ter
assegurado cadeiras no Parlamento, sob a condição de que seus partidos ou
coligações tivessem obtido o percentual mínimo de votos necessários.
Neste novo
modelo, o chefe de Estado poderia adquirir novos papéis, como realizar
conversações com os governos das coletividades territoriais, ser o garantidor
do respeito da Constituição e das instituições, e igualmente o garantidor do
pacto político e social. O Presidente da República poderia se ocupar com mais atenção
das coletividades territoriais e o primeiro-ministro dos partidos políticos,
tendo em vista que os partidos políticos são com freqüência acusados de serem
responsáveis pelo enfraquecimento do poder dos Estados federados.
Considerações Finais
Procuramos ao longo deste trabalho fazer
uma reflexão a respeito de tema da maior relevância, que é a distribuição do
poder estatal, tanto do ponto de vista horizontal, entre os três Poderes da
União, como do ponto de vista vertical, entre os membros da Federação.
Primeiramente abordamos o pacto político, construído de baixo para cima,
envolvendo o povo e as coletividades territoriais, indo além da ficção
histórica da figura do pacto federativo, como se o Estado brasileiro tivesse se
originado a partir da união de Estados soberanos, como foi o caso dos Estados
Unidos. Neste novo pacto é importante a noção de subsidiariedade, ficando o
poder o mais próximo possível dos interessados.
O
federalismo de regiões é uma tentativa de reestruturar o Estado federal, dando
um maior equilíbrio entre os entes federativos. As Regiões iriam assumir papéis
que hoje são da União, e teriam uma atuação mais em acordo com as
particularidades regionais em um país continental como é o Brasil. Portanto,
com as Regiões teríamos um Estado federal com quatro níveis: União, Regiões,
Estados e Municípios. As Regiões viriam para fortalecer os Estados e Municípios
e não ao contrário.
Um Poder
Executivo dualista é a procura em tornar o Executivo mais racional e eficaz, e
ao mesmo tempo possibilitar uma certa responsabilidade política do Executivo
frente ao Parlamento. Todavia, este dualismo seria distinto daquele que
encontramos no parlamentarismo, pois aqui o governo seria ainda conduzido pelo Presidente
da República, através de um primeiro-ministro de sua livre escolha, sem contar
inicialmente com o referendo do Parlamento, mas onde o primeiro-ministro teria
parcela de responsabilidade junto ao Parlamento. Procuramos então, estabelecer
um equilíbrio entre a influência do Presidente da República e do Parlamento
sobre a condução do governo. Com isto esperamos assegurar que o Presidente da
República, eleito diretamente pelo povo, e com forte legitimidade popular,
governe, mas não governe só, concentrando muito poder numa única figura.
Paulo Vargas Groff
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