"Nós, os monarcas, somos incontestavelmente constantes em um mundo em constante transformação. Pelo motivo de termos estado sempre aqui, mas também por não nos envolvermos na política cotidiana. Estamos informados das mudanças políticas que acontecem em nossas sociedades, mas não fazemos comentários sobre isso. É nisso que assumimos uma posição única. Nenhum dos outros monarcas europeus interfere na política."

Margarethe II, Rainha da Dinamarca

sábado, 19 de novembro de 2011

Eles não conseguem desenhar o futuro


1930 foi um marco na história do Brasil. Inaugurou o moderno Estado e uma nova visão econômica para o país. 


A importância econômico-social do período acabou apagando a memória repressiva. Se devemos ter muito cuidado com a “contabilidade do mal”, porém não custa lembrar que a ditadura varguista prendeu e condenou muito mais presos políticos que o regime militar. Contudo, o período é lembrado pela legislação trabalhista e a industrialização. A memória seletiva e instrumental permitiu que cada corrente política escolhesse o que desejava resgatar do período.


A crise dos anos 60 sinalizou que o processo iniciado em 30 tinha se esgotado. Novos desafios estavam sendo colocados pelas modificações ocorridas nos anos 1950. A abertura ao capital estrangeiro, a intensificação do deslocamento populacional do Nordeste para o Sudeste, a crescente urbanização, os dilemas sobre a distribuição de renda, críticas ao funcionamento do sistema político, entre outros fatores, conduziram o país para um verdadeiro caldeirão de turbulência, que acabou no golpe civil-militar de 1964.


O regime militar fez várias reformas. Obteve êxito. O papel do Estado na economia foi ampliado numa escala nunca vista. Qualquer setor onde havia alguma dificuldade econômica, a saída encontrada era a criação de uma empresa estatal. E foram surgindo às pencas. O país melhorou a infraestrutura, desenvolveu novos setores produtivos e se integrou à economia mundial diversificando sua pauta de exportações. 


Virou uma página histórica: deixou de ser um país com “vocação agrícola”. Como é sabido, houve um duro ataque às liberdades democráticas, como se não fosse possível compatibilizar crescimento econômico e a existência de um estado democrático de direito.


A dificuldade de compreender, a partir de 1974, que estava ocorrendo uma transformação na economia mundial — com a quadruplicação do preço do petróleo, o surgimento dos “tigres asiáticos”, o início das mudanças econômicas na China após a morte de Mao Tsé- Tung, o fortalecimento do Mercado Comum Europeu e a crise da economia americana — fez com que o regime militar endividasse o país, desorganizasse a economia e jogasse a inflação anual, no fim do governo Figueiredo, para três dígitos.


O término do regime militar, em 1985, iniciou uma década de promessas, soluções mágicas e voluntarismo. De rompantes dignos de uma republiqueta latino-americana. Como a economia não se impressiona com discursos, a fraseologia não trouxe qualquer resultado positivo. Mas o malogro não foi imputado à teoria, mas à economia de mercado.


Em meio ao fracasso dos planos de estabilização, veio a Constituição de 1988. Foram 20 meses de sessões. Nos últimos 60 anos, entre os países de democracia consolidada, não há registro de Constituinte tão longa. Foi feita a Carta mais extensa da nossa história. Transformou a Constituição em um programa de governo. Legislou sobre tudo. Concedeu benesses a todos os setores sociais. E o pior: em meio a uma grave crise econômica, que levou o país à maior inflação anual da nossa história.


A estabilização econômica parecia impossível. Dentro daquele espírito nativo tão adaptativo, surgiram até “teorias” que justificavam a inflação como um meio de crescimento econômico. Neste ambiente, tudo conspirava para que nada fosse modificado. A inflação e suas mazelas eram uma espécie de sina com que o país tinha de conviver.


Em 1994, o Plano Real mudou a história econômica do Brasil. Teve, à época, muitos detratores. Nenhum deles fez autocrítica. Preferiram esquecer o que falaram (hoje estão no governo). Se foi importante a moeda voltar a ter valor e derrubar os índices de inflação — sem qualquer tipo de congelamento de preços e salários —, mais complexa foi a reestruturação econômica, que envolvia, inclusive, redefinir o papel do Estado na economia.


Não foi tarefa nada fácil enfrentar mitos, preconceitos e acusações, tanto da direita como da esquerda. Afinal, o Estado brasileiro acabou, ao longo do tempo, soldando uma curiosa aliança das duas correntes, cada uma com seu projeto, mas identificando- se com o expansionismo estatal e a defesa dos interesses corporativos.


O surto de desenvolvimento que estamos assistindo é consequência direta dos efeitos do Plano Real. Sem ele, não teríamos um crescimento sustentável. E nem o Brasil estaria entre os países emergentes. Não é exagero afirmar que 1994 foi economicamente tão importante como 1930. E melhor ainda: manteve as plenas liberdades democráticas, diferentemente do que fez o regime de 30.


Assim como os atuais detentores do poder não reconhecem a importância histórica do Plano Real, também não conseguem desenhar o futuro. Revelam uma absoluta ausência de pensamento inovador. Olham o futuro com a ótica do passado. No fundo, odeiam o capitalismo e o livre mercado. São prisioneiros de uma visão de mundo do século XIX. 


Vivem uma eterna crise de personalidade, entre o que politicamente pensam e, algumas vezes, agem; e o que realizam no campo econômico. Daí as concessões aos “movimentos sociais” ou o apoio aos tiranos do antigo Terceiro Mundo. É como se as palavras lavassem a alma “contaminada” pela ação capitalista.


Mas a economia vai seguindo o seu próprio caminho. Só que necessita de correções. Dificilmente o governo vai identificar o rumo correto. A carcomida ideologia é um verdadeiro obstáculo epistemológico. Não é nenhum exagero afirmar que o Partido Comunista Chinês acredita mais no capitalismo do que o Partido dos Trabalhadores.

por: Marco Antonio Villa

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