Ah!, mas não existe voto distrital no Brasil. Então, caríssimo, você votou mas não é representado. O eleito não tem compromisso com o eleitor, e sim com a estrutura que recolhe e concentra os votos em um partido e depois os redistribui dentro desse mesmo partido aos seus caciques.
Você só não é representado se você votou num candidato cujo partido ou frente não elegeu um deputado sequer. Caso contrário, você tem um representante, seja ele o nome em quem você votou ou um dos deputados eleitos pelo partido ou frente. A mesma lógica proposta pelo autor vale aqui. Se o seu representante não o está representando, não vote mais nem nele nem no partido dele ou em qualquer outro que faça coligação com ele.
Outra falácia é que a redistribuição dos votos no sistema proporcional é feita pelos caciques dos partidos. Não é. Isso é feito automaticamente pela quantidade de votos nominais aos candidatos.
O máximo que os caciques partidários conseguem fazer é dispor uma estrutura melhor do partido para um candidato A ou B de sua preferência, mas não tem tanto poder quanto teriam no sistema distrital a ponto de impedir alguns candidatos a deputado de concorrerem à vaga, principalmente no sistema de lista aberta que é o que vigora hoje no país.
Agora os argumentos.
1 – Com o voto distrital é possível que quase a metade de uma região, Estado ou do País fique sem representação.
Não vejo como. Regiões pouco povoadas, tais como as da região norte, teriam distritos territorialmente muito grandes. Mas, o próprio Marcos Coimbra nota que são possíveis correções que garantam um mínimo de representatividade.
Eu vejo como e inclusive o próprio Marcos Coimbra mostra isso no texto dele.
Incrivelmente, o autor foge do que foi explicado, começa a falar de tamanho territorial e esquece da representação. Considerando-se dois partidos que possuam distribuição homogênea de votos em todos os distritos, digamos de 51 % para o partido A e 49 % para o partido B, a representação desses partidos não seria nunca 51 a 49 num parlamento de 100 cadeiras, mas sim seria 100 para A e 0 para B!
2 - E é certo que, para as minorias étnicas, religiosas, culturais, de gênero ou opinião, entre outras, seria quase impossível eleger deputados.
Hoje também não elegem. Principalmente hoje é que não elegem. Minorias não elegem ninguém no voto proporcional.
Existem sim deputados de bancadas que prepresentam minorias, o próprio Jean Wyllis já foi citado aqui como exemplo, assim como existem muitos deputados que não representam minorias mas sim os poderosos.
O poder que latifundiários e o setor financeiro possuem hoje não tem nada a ver com o sistema de votação para o legislativo, mas sim pelo fato destes estarem com o poder econômico em suas mãos. Isso para não falar do apoio velado da midia.
3 - A disputa de votos baseados na territorialidade faz com que o conteúdo político das candidaturas fique em plano secundário. O que predomina é a discussão dos “problemas concretos” e de quem tem “mais capacidade” de resolvê-los.
A situação com o voto proporcional é pior.
Um deputado pode apenas agir em favor do grupo que o financia e não tem que prestar contas ao eleitorado, já que a um voto em Ribeirão Preto soma um voto na Praia Grande para ser eleito, independente de haver 2 mil quilômetros entre as duas cidades.
O sistema majoritário de votação, que hoje já é utilizado para cargos do executivo, não impede que os eleitos ajam em favor de seus financiadores, haja visto os escândalos que aparecem vez em quando. Nem por isso também eles deixam de favorecer tericeiros só porque iria prestar contas ao eleitor na eleição seguinte.
No voto distrital, o deputado está tão dependente de seu financiador quanto no voto proporcional. Aliás, dado o nível da discussão em várias campanhas a prefeito que tenho visto, é bem provável que um deputado seja eleito com base na quantidade de verba que trouxe para a região ou pela quantidade de obras que conseguiu realizar do que por qualquer convicção política de ideologia.
Temas como estes só entrariam em pauta com o intuito de queimar o adversário assim como Serra tentou fazer com Dilma na campanha eleitoral trazendo à tona o tema do aborto da pior forma possível.
4 - No voto distrital, os candidatos não precisam de seu partido para se eleger. Só sua votação conta. Sentem-se, portanto, donos exclusivos de “seus” votos. Estar filiado a determinado partido chega a ser irrelevante.
Sempre haverá partidos, não sei de onde Marcos Coimbra tirou a idéia de uma democracia sem partidos políticos.
O que ocorre com o voto distrital é a perda de poder pelos caciques dos partidos. Isso é ruim? O poder migra para quem tem o voto? Isso é ruim?
Não sei de onde o autor tira de que com o voto distrital os caciques perdem poder. Muito pelo contrário. O mais provável, num país como o Brasil que não tem tradição de prévias dentro dos partidos e que as escolhas são feitas na base do "dedazo", é que os dirigentes patidários tenham um poder muito maior de impedir que seus rivais dentro do partido tenham alguma chance de paticipar.
Isso poderia nos levar a ter um sistema partidário mais fragmentado do que já temos hoje pois quem não pudesse concorrer dentro do partido iria se sentir tentado a fundar seu próprio partido (ou se juntar a um grupo de caciques excluídos de outros distritos para fundar um) muito provavelmente sem qualquer comprometimento com ideais.
5 - Talvez sejam os problemas do voto distrital que atraiam a direita.
Falácia final. Quer dizer que na opinião de Marcos Coimbra existe o modelo de votação da direita e da esquerda?
Não, o voto distrital é só uma maneira de computar os votos, não é de direita nem de esquerda.
Recomendo que o autor releia este trecho do texto de Marcos Coimbra prestando mais atenção no conceito de gerrymandering.
A simples possibilidade (em vários casos necessidade) de que a cada eleição os distritos eleitorais sejam mudados possibilitando isolar e impedir a representação de grupos políticos é algo que direita vê com muito carinho sim.
Contando-se que a nossa justiça eleitoral não possui nenhum vínculo com a população e seriam eles que iriam se encarregar de fazer o mapa eleitoral de distritos, eu diria que o grande charme que o voto distrital apresenta para a direita é justamente este: a possibilidade de excluir convenientemente partes da população da representação da maneira que lhe convenha e de maneira silenciosa.
Outros argumentos
O voto distrital elimina o puxador de votos. Figuras notórias como Tiririca, Frank Aguiar, Romário ou Bebeto, passam a ter importância reduzida.
Tais figuras continuariam a ter a importância que possuem, a única diferença é que sua influência estaria restrita ao distrito em que concorreriam.
A diferença é que o voto distrital aumenta a competitividade, pois os “campeões” teriam de enfrentar a cada eleição os desafiantes pequenos mordendo seus calcanhares.
Hoje com o advento da reeleição nos cargos executivos o que se vê é o contrário. Quem já tem o poder tende a permanecer nele pois já possui a máquina do estado em seu favor. Veja a porcentagem de reeleições para cargos no executivo que inclusive tem uma visibilidade e nivel de cobrança maior da população que o legislativo e pode tranquilo chutar o complentto a 100% desse percentual como uma provável taxa máxima de renovação.
Isso sem contar que no voto distrital a princípio não seria necessário votação em dois turnos e nem haveria necessariamente número máximo de reeleições. Se fossemos contar com estes agravantes, aí é que a renovação seria residual de eleição para eleição.
O voto distrital barateia a eleição, pois a campanha pode ser concentrada em uma área territorialmente menor.
As campanhas não são caras porque se gasta muito com transporte, mas sim porque a acesso aos meios de comunicação é muito caro. Ainda que isso fosse verdade, devido a demografia no Brasil ser muito concentrada em algumas poucas regiões, apenas para estar é que valeria este preceito.
Por outro lado, se formos tomar como exemplo as eleições majoritárias para cargos do executivo, estas são muito mais caras do que para cargos legislativos. Inclusive porque utilizam muito mais propaganda.
O voto distrital aumenta o poder dos pequenos partidos, dos partidos mais ideológicos, pois permite que o partido concentre suas ações um poucos distritos segundo seus recursos ou simpatizantes e assim tenha condições de eleger pelo menos um representante.
Pode até aumentar o poder dos pequenos partidos desde que estes concentrem suas representações em algumas regiões específicas, mas falar que aumenta o poder dos partidos mais ideológicos é realmente um escárnio. O mais provável é que, assim como ocorre nas eleições executivas, os candidatos ao legislativo comecem a procurar um perfil "sabonete" de candidato, o que possa ser vendido mais facilmente para o eleitor médio, pois é este quem faz a bancada.
No caso brasileiro, o eleitor médio é claramente avesso a discussões ideológicas e é bastante influenciado pelos meios de comunicação.
Por: Bernardo F. Costa
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