"Nós, os monarcas, somos incontestavelmente constantes em um mundo em constante transformação. Pelo motivo de termos estado sempre aqui, mas também por não nos envolvermos na política cotidiana. Estamos informados das mudanças políticas que acontecem em nossas sociedades, mas não fazemos comentários sobre isso. É nisso que assumimos uma posição única. Nenhum dos outros monarcas europeus interfere na política."

Margarethe II, Rainha da Dinamarca

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

União das Nações Sul - Americanas " UNASUL"




Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas.




Brasília, 23 de maio de 2008


(texto em português)



A República Argentina, a República da Bolívia, a República Federativa do Brasil, a República do Chile, a República da Colômbia, a República do Equador, a República Cooperativista da Guiana, a República do Paraguai, a República do Peru, a República do Suriname, a República Oriental do Uruguai e a República Bolivariana da Venezuela,


PREÂMBULO


APOIADAS na história compartilhada e solidária de nossas nações, multiétnicas, plurilíngües e multiculturais, que lutaram pela emancipação e unidade sul-americanas, honrando o pensamento daqueles que forjaram nossa independência e liberdade em favor dessa união e da construção de um futuro comum;

INSPIRADAS nas Declarações de Cusco (8 de dezembro de 2004), Brasília (30 de setembro de 2005) e Cochabamba (9 de dezembro de 2006);



AFIRMANDO sua determinação de construir uma identidade e cidadania sul-americanas e desenvolver um espaço regional integrado no âmbito político, econômico, social, cultural, ambiental, energético e de infra-estrutura, para contribuir para o fortalecimento da unidade da América Latina e Caribe;


CONVENCIDAS de que a integração e a união sul-americanas são necessárias para avançar rumo ao desenvolvimento sustentável e o bem-estar de nossos povos, assim como para contribuir para resolver os problemas que ainda afetam a região, como a pobreza, a exclusão e a desigualdade social persistentes;


SEGURAS de que a integração é um passo decisivo rumo ao fortalecimento do multilateralismo e à vigência do direito nas relações internacionais para alcançar um mundo multipolar, equilibrado e justo no qual prevaleça a igualdade soberana dos Estados e uma cultura de paz em um mundo livre de armas nucleares e de destruição em massa;


RATIFICANDO que tanto a integração quanto a união sul-americanas fundam-se nos princípios basilares de: irrestrito respeito à soberania, integridade e inviolabilidade territorial dos Estados; autodeterminação dos povos; solidariedade; cooperação; paz; democracia, participação cidadã e pluralismo; direitos humanos universais, indivisíveis e interdependentes; redução das assimetrias e harmonia com a natureza para um desenvolvimento sustentável;


ENTENDENDO que a integração sul-americana deve ser alcançada através de um processo inovador, que inclua todas as conquistas e avanços obtidos pelo MERCOSUL e pela CAN, assim como a experiência de Chile, Guiana e Suriname, indo além da convergência desses processos;


CONSCIENTES de que esse processo de construção da integração e da união sul-americanas é ambicioso em seus objetivos estratégicos, que deverá ser flexível e gradual em sua implementação, assegurando que cada Estado assuma os compromissos segundo sua realidade;


RATIFICANDO que a plena vigência das instituições democráticas e o respeito irrestrito aos direitos humanos são condições essenciais para a construção de um futuro comum de paz e prosperidade econômica e social e o desenvolvimento dos processos de integração entre os Estados Membros;


ACORDAM:


Artigo 1- Constituição da UNASUL.



Os Estados Partes do presente Tratado decidem constituir a União de Nações Sul-americanas (UNASUL) como uma organização dotada de personalidade jurídica internacional.


Artigo 2 - Objetivo.



A União de Nações Sul-americanas tem como objetivo construir, de maneira participativa e consensuada, um espaço de integração e união no âmbito cultural, social, econômico e político entre seus povos, priorizando o diálogo político, as políticas sociais, a educação, a energia, a infra-estrutura, o financiamento e o meio ambiente, entre outros, com vistas a eliminar a desigualdade socioeconômica, alcançar a inclusão social e a participação cidadã, fortalecer a democracia e reduzir as assimetrias no marco do fortalecimento da soberania e independência dos Estados.


Artigo 3 - Objetivos Específicos.



A União de Nações Sul-americanas tem como objetivos específicos:


a) o fortalecimento do diálogo político entre os Estados Membros que assegure um espaço de concertação para reforçar a integração sul-americana e a participação da UNASUL no cenário internacional;


b) o desenvolvimento social e humano com eqüidade e inclusão para erradicar a pobreza e superar as desigualdades na região;


c) a erradicação do analfabetismo, o acesso universal a uma educação de qualidade e o reconhecimento regional de estudos e títulos;


d) a integração energética para o aproveitamento integral, sustentável e solidário dos recursos da região;


e) o desenvolvimento de uma infra-estrutura para a interconexão da região e de nossos povos de acordo com critérios de desenvolvimento social e econômico sustentáveis;


f) a integração financeira mediante a adoção de mecanismos compatíveis com as políticas econômicas e fiscais dos Estados Membros;


g) a proteção da biodiversidade, dos recursos hídricos e dos ecossistemas, assim como a cooperação na prevenção das catástrofes e na luta contra as causas e os efeitos da mudança climática;


h) o desenvolvimento de mecanismos concretos e efetivos para a superação das assimetrias, alcançando assim uma integração eqüitativa;


i) a consolidação de uma identidade sul-americana através do reconhecimento progressivo de direitos a nacionais de um Estado Membro residentes em qualquer outro Estado Membro, com o objetivo de alcançar uma cidadania sul-americana;


j) o acesso universal à seguridade social e aos serviços de saúde;


k) a cooperação em matéria de migração, com enfoque integral e baseada no respeito irrestrito aos direitos humanos e trabalhistas para a regularização migratória e a harmonização de políticas;


l) a cooperação econômica e comercial para avançar e consolidar um processo inovador, dinâmico, transparente, eqüitativo e equilibrado que contemple um acesso efetivo, promovendo o crescimento e o desenvolvimento econômico que supere as assimetrias mediante a complementação das economias dos países da América do Sul, assim como a promoção do bem-estar de todos os setores da população e a redução da pobreza;


m) a integração industrial e produtiva, com especial atenção às pequenas e médias empresas, cooperativas, redes e outras formas de organização produtiva;


n) a definição e implementação de políticas e projetos comuns ou complementares de pesquisa, inovação, transferência e produção tecnológica, com vistas a incrementar a capacidade, a sustentabilidade e o desenvolvimento científico e tecnológico próprios;


o) a promoção da diversidade cultural e das expressões da memória e dos conhecimentos e saberes dos povos da região, para o fortalecimento de suas identidades;


p) a participação cidadã, por meio de mecanismos de interação e diálogo entre a UNASUL e os diversos atores sociais na formulação de políticas de integração sul-americana;


q) a coordenação entre os organismos especializados dos Estados Membros, levando em conta as normas internacionais, para fortalecer a luta contra o terrorismo, a corrupção, o problema mundial das drogas, o tráfico de pessoas, o tráfico de armas pequenas e leves, o crime organizado transnacional e outras ameaças, assim como para promover o desarmamento, a não proliferação de armas nucleares e de destruição em massa e a deminagem;


r) a promoção da cooperação entre as autoridades judiciais dos Estados Membros da UNASUL;


s) o intercâmbio de informação e de experiências em matéria de defesa;


t) a cooperação para o fortalecimento da segurança cidadã, e


u) a cooperação setorial como um mecanismo de aprofundamento da integração sul-americana, mediante o intercâmbio de informação, experiências e capacitação.


Artigo 4 - Órgãos.



Os órgãos da UNASUL são:




1. O Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo;


2. O Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores;


3. O Conselho de Delegadas e Delegados;


4. A Secretaria Geral.


Artigo 5 - Desenvolvimento da Institucionalidade.



Poderão ser convocadas e conformadas Reuniões Ministeriais Setoriais, Conselhos de nível Ministerial, Grupos de Trabalho e outras instâncias institucionais que sejam requeridas, de natureza permanente ou temporária, para dar cumprimento aos mandatos e recomendações dos órgãos competentes. Essas instâncias prestarão conta do desempenho de seus atos por meio do Conselho de Delegadas e Delegados, que o elevará ao Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo ou ao Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores, conforme o caso.



Os acordos adotados pelas Reuniões Ministeriais Setoriais, Conselhos de nível Ministerial, Grupos de Trabalho e outras instâncias institucionais serão submetidos à consideração do órgão competente que os tenha criado ou convocado.



O Conselho Energético Sul-americano, criado na Declaração de Margarita (17 de abril de 2007), é parte da UNASUL.



Artigo 6 - O Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo.


O Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo é o órgão máximo da UNASUL.
Suas atribuições são:


a) estabelecer as diretrizes políticas, os planos de ação, os programas e os projetos do processo de integração sul-americana e decidir as prioridades para sua implementação;




b) convocar Reuniões Ministeriais Setoriais e criar Conselhos de nível Ministerial;




c) decidir sobre as propostas apresentadas pelo Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores;




d) adotar as diretrizes políticas para as relações com terceiros;



As reuniões ordinárias do Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo terão periodicidade anual. A pedido de um Estado Membro poderão ser convocadas reuniões extraordinárias, através da Presidência Pro Tempore, com o consenso de todos os Estados Membros da UNASUL.


Artigo 7 - A Presidência Pro Tempore.



A Presidência Pro Tempore da UNASUL será exercida sucessivamente por cada um dos Estados Membros, em ordem alfabética, por períodos anuais.



Suas atribuições são:


a) preparar, convocar e presidir as reuniões dos órgãos da UNASUL;


b) apresentar para consideração do Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores e do Conselho de Delegadas e Delegados o Programa anual de atividades da UNASUL, com datas, sedes e agenda das reuniões de seus órgãos, em coordenação com a Secretaria Geral;


c) representar a UNASUL em eventos internacionais, devendo a delegação ser previamente aprovada pelos Estados Membros;


d) assumir compromissos e firmar Declarações com terceiros, com prévio consentimento dos órgãos correspondentes da UNASUL.


Artigo 8 - O Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores.



O Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores tem as seguintes atribuições:




a) adotar Resoluções para implementar as Decisões do Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo;




b) propor projetos de Decisões e preparar as reuniões do Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo;




c) coordenar posicionamentos em temas centrais da integração sul-americana;




d) desenvolver e promover o diálogo político e a concertação sobre temas de interesse regional e internacional;




e) realizar o seguimento e a avaliação do proceso de integração em seu conjunto;




f) aprovar o Programa anual de atividades e o orçamento anual de funcionamento da UNASUL;




g) aprovar o financiamento das iniciativas comuns da UNASUL;




h) implementar as diretrizes políticas nas relações com terceiros;




i) aprovar resoluções e regulamentos de caráter institucional ou sobre outros temas que sejam de sua competência;




j) criar Grupos de Trabalho no marco das prioridades fixadas pelo Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo.



As reuniões ordinárias do Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores terão periodicidade semestral, podendo a Presidência Pro Tempore convocar reuniões extraordinárias a pedido de metade dos Estados Membros.



Artigo 9 - O Conselho de Delegadas e Delegados.



O Conselho de Delegadas e Delegados tem as seguintes atribuições:



a) implementar, mediante a adoção das Disposições pertinentes, as Decisões do Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo e as Resoluções do Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores, com o apoio da Presidência Pro Tempore e da Secretaria Geral;



b) preparar as reuniões do Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores;


c) elaborar projetos de Decisões, Resoluções e Regulamentos para a consideração do Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores;


d) compatibilizar e coordenar as iniciativas da UNASUL com outros processos de integração regional e sub-regional vigentes, com a finalidade de promover a complementaridade de esforços;


e) conformar, coordenar e dar seguimento aos Grupos de Trabalho;


f) dar seguimento ao diálogo político e à concertação sobre temas de interesse regional e internacional;


g) promover os espaços de diálogo que favoreçam a participação cidadã no processo de integração sul-americana;


h) propor ao Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores o projeto de orçamento ordinário anual de funcionamento para sua consideração e aprovação.


O Conselho de Delegadas e Delegados é formado por uma ou um representante acreditado(a) por cada Estado Membro. Reúne-se com periodicidade preferencialmente bimestral, no território do Estado que exerce a Presidência Pro Tempore ou outro lugar que se acorde.



Artigo 10 - A Secretaria Geral.



A Secretaria Geral é o órgão que, sob a condução do Secretário Geral, executa os mandatos que lhe conferem os órgãos da UNASUL e exerce sua representação por delegação expressa dos mesmos. Tem sua sede em Quito, Equador.



Suas atribuições são:



a) apoiar o Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo, o Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores, o Conselho de Delegadas e Delegados e a Presidência Pro Tempore no cumprimento de suas funções;




b) propor iniciativas e efetuar o seguimento das diretrizes dos órgãos da UNASUL;


c) participar com direito a voz e exercer a função de secretaria nas reuniões dos órgãos da UNASUL;


d) preparar e apresentar a Memória Anual e os informes respectivos aos órgãos correspondentes da UNASUL;


e) servir como depositário dos Acordos no âmbito da UNASUL e disponibilizar sua publicação correspondente;
f) preparar o projeto de orçamento anual para a consideração do Conselho de Delegadas e Delegados e adotar as medidas necessárias para sua boa gestão e execução;


g) preparar os projetos de Regulamento para o funcionamento da Secretaria Geral e submetê-los à consideração e aprovação dos órgãos correspondentes;


h) coordenar-se com outras entidades de integração e cooperação latino-americanas e caribenhas para o desenvolvimento das atividades que lhe encomendem os órgãos da UNASUL;


i) celebrar, de acordo com os regulamentos, todos os atos jurídicos necessários para a boa administração e gestão da Secretaria Geral.


O Secretário Geral será designado pelo Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo com base em proposta do Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores, por um período de dois anos, renovável apenas uma vez. O Secretário Geral não poderá ser sucedido por uma pessoa da mesma nacionalidade.



Durante o exercício de suas funções, o Secretário Geral e os funcionários da Secretaria terão dedicação exclusiva, não solicitarão nem receberão instruções de nenhum Governo, nem de entidade alheia à UNASUL, e se absterão de atuar de forma incompatível com sua condição de funcionários internacionais responsáveis unicamente perante esta organização internacional.



O Secretário Geral exerce a representação legal da Secretaria Geral.



Na seleção dos funcionários da Secretaria Geral será garantida uma representação eqüitativa entre os Estados Membros, levando-se em conta, na medida do possível, critérios de gênero, de idiomas, étnicos e outros.


Artigo 11 - Fontes Jurídicas.


As fontes jurídicas da UNASUL são as seguintes:


1. O Tratado Constitutivo da UNASUL e os demais instrumentos adicionais;


2. Os Acordos que celebrem os Estados Membros da UNASUL com base nos instrumentos mencionados no parágrafo precedente;


3. As Decisões do Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo;


4. As Resoluções do Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores, e


5. As Disposições do Conselho de Delegadas e Delegados.


Artigo 12 - Aprovação da Normativa.


Toda a normativa da UNASUL será adotada por consenso.


As Decisões do Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo, as Resoluções do Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores e as Disposições do Conselho de Delegadas e Delegados poderão ser adotadas estando presentes ao menos três quartos (3/4) dos Estados Membros.


As Decisões do Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo e as Resoluções do Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores acordadas sem a presença de todos os Estados Membros deverão ser objeto de consultas do Secretário Geral dirigidas aos Estados ausentes, que deverão pronunciar-se em um prazo máximo de trinta (30) dias corridos, a contar do recebimento do documento no idioma correspondente.




No caso do Conselho de Delegadas e Delegados, esse prazo será de quinze (15) dias.


Os Grupos de Trabalho poderão realizar sessão e apresentar propostas sempre que o quorum das reuniões seja de metade mais um dos Estados Membros.


Os atos normativos emanados dos órgãos da UNASUL serão obrigatórios para os Estados Membros uma vez que tenham sido incorporados no ordenamento jurídico de cada um deles, de acordo com seus respectivos procedimentos internos.


Artigo 13 - Adoção de Políticas e Criação de Instituições, Organizações e Programas.


Um ou mais Estados Membros poderão submeter à consideração do Conselho de Delegadas e Delegados propostas de adoção de políticas e de criação de instituições, organizações ou programas comuns para serem adotados por consenso, com base em critérios flexíveis e graduais de implementação, segundo os objetivos da UNASUL e o disposto nos Artigos 5 e 12 do presente Tratado.


No caso de programas, instituições ou organizações em que participem Estados Membros antes da entrada em vigor deste Tratado, poderão ser considerados como programas, instituições ou organizações da UNASUL de acordo com os procedimentos assinalados neste Artigo e em consonância com os objetivos deste Tratado.


As propostas serão apresentadas ao Conselho de Delegadas e Delegados. Uma vez aprovadas por consenso, serão remetidas ao Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores e, subseqüentemente, ao Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo, para aprovação por consenso. Quando uma proposta não for objeto de consenso, a mesma só poderá ser novamente submetida ao Conselho de Delegadas e Delegados seis meses após sua última inclusão na agenda.


Aprovada uma proposta pela instância máxima da UNASUL, três ou mais Estados Membros poderão iniciar seu desenvolvimento, sempre e quando se assegurem tanto a possibilidade de incorporação de outros Estados Membros, quanto a informação periódica sobre seus avanços ao Conselho de Delegadas e Delegados.


Qualquer Estado Membro poderá eximir-se de aplicar total ou parcialmente uma política aprovada, seja por tempo definido ou indefinido, sem que isso impeça sua posterior incorporação total ou parcial àquela política. No caso das instituições, organizações ou programas que sejam criados, qualquer dos Estados Membros poderá participar como observador ou eximir-se total ou parcialmente de participar por tempo definido ou indefinido.


A adoção de políticas e a criação de instituições, organizações e programas será regulamentada pelo Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores, com base em proposta do Conselho de Delegadas e


Delegados.


Artigo 14 - Diálogo Político.



A concertação política entre os Estados Membros da UNASUL será um fator de harmonia e respeito mútuo que afiance a estabilidade regional e sustente a preservação dos valores democráticos e a promoção dos direitos humanos.


Os Estados Membros reforçarão a prática de construção de consensos no que se refere aos temas centrais da agenda internacional e promoverão iniciativas que afirmem a identidade da região como um fator dinâmico nas relações internacionais.


Artigo - com Terceiros.


A UNASUL promoverá iniciativas de diálogo sobre temas de interesse regional ou internacional e buscará consolidar mecanismos de cooperação com outros grupos regionais, Estados e outras entidades com personalidade jurídica internacional, priorizando projetos nas áreas de energia, financiamento, infra-estrutura, políticas sociais, educação e outras a serem definidas.




O Conselho de Delegadas e Delegados é o responsável por dar seguimento às atividades de implementação com o apoio da Presidência Pro Tempore e da Secretaria Geral. Com o propósito de assegurar adequada coordenação, o Conselho de Delegadas e Delegados deverá conhecer e considerar expressamente as posições que sustentará a UNASUL em seu relacionamento com terceiros.



Artigo 16 - Financiamento.


O Conselho de Delegadas e Delegados proporá ao Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores, para consideração e aprovação, o Projeto de Orçamento ordinário anual de funcionamento da Secretaria Geral.


O financiamento do orçamento ordinário de funcionamento da Secretaria Geral será realizado com base em cotas diferenciadas dos Estados Membros a serem determinadas por Resolução do Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores, por proposta do Conselho de Delegadas e Delegados, levando em conta a capacidade econômica dos Estados Membros, a responsabilidade comum e o princípio da eqüidade.



Artigo 17 - Parlamento.


A formação de um Parlamento Sul-americano com sede na cidade de Cochabamba, Bolívia, será matéria de um Protocolo Adicional ao presente Tratado.



Artigo 18 - Participação Cidadã.


Será promovida a participação plena da cidadania no processo de integração e união sul-americanas, por meio do diálogo e da interação ampla, democrática, transparente, pluralista, diversa e independente com os diversos atores sociais, estabelecendo canais efetivos de informação, consulta e seguimento nas diferentes instâncias da UNASUL.



Os Estados Membros e os órgãos da UNASUL gerarão mecanismos e espaços inovadores que incentivem a discussão dos diferentes temas, garantindo que as propostas que tenham sido apresentadas pela cidadania recebam adequada consideração e resposta.



Artigo 19 - Estados Associados


Os demais Estados da América Latina e do Caribe que solicitem sua participação como Estados Associados da UNASUL poderão ser admitidos com a aprovação do Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo.


Os direitos e obrigações dos Estados Associados serão objeto de regulamentação por parte do Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores.



Artigo 20 - Adesão de Novos Membros.


A partir do quinto ano da entrada em vigor do presente Tratado e levando em conta o propósito de fortalecer a unidade da América Latina e do Caribe, o Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo poderá examinar solicitações de adesão como Estados Membros por parte de Estados Associados que tenhan esse status por quatro (4) anos, mediante recomendação por consenso do Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores. Os respectivos Protocolos de Adesão entrarão em vigor aos 30 dias da data em que se complete seu processo de ratificação por todos os Estados Membros e o Estado Aderente.


Artigo 21 - Solução de Controvérsias.


As controvérsias que puderem surgir entre Estados Partes a respeito da interpretação ou aplicação das disposições do presente Tratado Constitutivo serão resolvidas mediante negociações diretas.



Em caso de não se alcançar uma solução mediante a negociação direta, os referidos Estados Membros submeterão a controvérsia à consideração do Conselho de Delegadas e Delegados, o qual, dentro de 60 dias de seu recebimento, formulará as recomendações pertinentes para sua solução.



No caso de não se alcançar uma solução, essa instância elevará a controvérsia ao Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores, para consideração em sua próxima reunião.



Artigo 22 - Imunidades e Privilégios


A UNASUL gozará, no território de cada um dos Estados Membros, dos privilégios e imunidades necessários para a realização de seus propósitos.



Os representantes dos Estados Membros e os funcionários internacionais da UNASUL igualmente gozarão dos privilégios e imunidades necessários para desempenhar com independência suas funções relacionadas a este Tratado.



A UNASUL celebrará com a República do Equador o correspondente Acordo de Sede, que estabelecerá os privilégios e imunidades específicos.



Artigo 23 - Idiomas.


Os idiomas oficiais da União de Nações Sul-americanas serão o português, o castelhano, o inglês e o neerlandês.



Artigo 24 - Duração e Denúncia.


O presente Tratado Constitutivo terá duração indefinida. Poderá ser denunciado por qualquer dos Estados Membros mediante notificação escrita ao Depositário, que comunicará a denúncia aos demais Estados Membros.



A denúncia surtirá efeito uma vez transcorrido o prazo de seis (6) meses da data em que a notificação tenha sido recebida pelo Depositário.


A notificação de denúncia não eximirá o Estado Membro da obrigação de pagar as contribuições ordinárias que estiveram pendentes.


Artigo 25 - Emendas.


Qualquer Estado Membro poderá propor emendas ao presente Tratado Constitutivo. As propostas de emenda serão comunicadas à Secretaria Peral, que as notificará aos Estados Membros para sua consideração pelos órgãos da UNASUL.



As emendas aprovadas pelo Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo seguirão o procedimento estabelecido no Artigo 26 para sua posterior entrada em vigor.



Artigo 26 - Entrada em Vigor.



O presente Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-americanas entrará em vigor trinta dias após a data de recepção do nono (9º) instrumento de ratificação.



Os instrumentos de ratificação serão depositados perante o Governo da República do Equador, que comunicará a data de depósito aos demais Estados Membros, assim como a data de entrada em vigor do presente Tratado Constitutivo.



Para o Estado Membro que ratifique o Tratado Constitutivo após haver sido depositado o nono instrumento de ratificação, o mesmo entrará em vigor trinta dias após a data em que esse Estado Membro tenha depositado seu instrumento de ratificação.



Artigo 27 - Registro.



O presente Tratado Constitutivo e suas emendas serão registrados perante a Secretaria da Organização das Nações Unidas.



Artigo Transitório.



As Partes acordam designar uma Comissão Especial, que será coordenada pelo Conselho de Delegadas e Delegados e será integrada por representantes dos Parlamentos Nacionais, Sub-regionais e Regionais com o objetivo de elaborar um Projeto de Protocolo Adicional que será considerado na IV Cúpula de Chefas e Chefes de Estado e de Governo. Essa Comissão se reunirá na cidade de Cochabamba. Esse Protocolo Adicional estabelecerá a composição, as atribuições e o funcionamento do Parlamento Sul-americano.



Feito em Brasília, República Federativa do Brasil, no dia 23 de maio de 2008, em originais nos idiomas português, castelhano, inglês e neerlandês, sendo os quatro textos igualmente autênticos.




domingo, 15 de fevereiro de 2009

No Coração do Império


Com sua fina educação francesa, Luisa Margarida Portugal e Barros, a condessa de Barral, horrorizou-se com as maneiras toscas de um conterrâneo que visitava a Europa. Ele tinha as unhas sujas, comia com a faca e cultivava o desagradável hábito de bater nas costas dos interlocutores.


"O senhor Alcântara tem dois defeitos insuportáveis: é egoísta como ninguém e cabeçudo como todas as mulas do mundo", anotava a condessa em seu diário de 1871. Referia-se a Pedro de Alcântara, o imperador dom Pedro II, então em sua primeira excursão européia. Luisa brigou muito com ele: achava que sua figura simplória, sempre com o mesmo jaquetão preto, representava mal o Brasil.


Ela gozava da intimidade necessária para fazer críticas tão pessoais. Fora dama de honra da princesa Francisca, irmã de dom Pedro, e aia das filhas deste, Isabel e Leopoldina. Também era a mais querida amiga do imperador - e as palavras "amiga", "amigo", "amizade", recorrentes na correspondência entre os dois, são eufemismos: Luisa foi amante de dom Pedro II. Reconstituída com muita graça na biografia Condessa de Barral - A Paixão do Imperador , de Mary Del Priore, a vida extraordinária de Luisa permite um vislumbre único do que se passava no recesso das alcovas reais. A historiadora buscou fazer um retrato humano, despido da aura reverencial que cerca seus personagens. "Meu objetivo foi mostrar o imperador de pijama e a condessa de bobes na cabeça", brinca Mary, autora também de O Príncipe Maldito, biografia de Pedro Augusto, neto de dom Pedro II.


Nascida em Salvador, em 1816, Luisa era nove anos mais velha que dom Pedro II - mas, como certa vez disse o próprio imperador, uma "mulher de espírito" nunca envelhece. Os trechos dos diários e cartas da condessa que Mary reproduz na biografia revelam, de fato, um espírito agudo e jovial. Dom Pedro encontrava em Barral uma inteligência inquisitiva - como ele, uma amante dos livros, das línguas, da cultura, qualidades que a colocavam em franco contraste com a imperatriz Teresa Cristina, mulher de intelecto limitado.


A ligação entre imperador e condessa foi sobretudo intelectual. Nada disso significa que não tenha havido também um intenso relacionamento carnal, sobretudo entre 1856 e 1864, quando Luisa, na condição de aia das princesas Isabel e Leopoldina, tinha livre trânsito pelo paço imperial. As referências sexuais, porém, são muito veladas na correspondência trocada entre os dois (há indicações de que eles teriam destruído as cartas mais ardentes). O decoro parece ter regido a relação dos dois. Mais para o fim da vida, já viúva de Barral - o conde francês que ela traiu em seu affair com o imperador brasileiro - , Luisa sofreria certa crise de consciência. "Eu não digo que não me afastasse da boa vereda. Oh! Se me afastei dela. Mas sempre foi com a consciência do mal que eu fazia", escreve ela ao antigo amante.


A personalidade tímida e reclusa de dom Pedro II encontrou um complemento perfeito na extrovertida condessa de Barral. "Ela foi uma porta aberta para um mundo que ele só conhecia dos livros", diz Mary. Cosmopolita, Luisa sentia-se igualmente à vontade passeando na Champs-Élysées ou cavalgando pelas propriedades rurais da família, ouvindo Chopin tocar piano em um sarau parisiense ou vendo os escravos dançar lundu em dias de festa. Luisa teve uma educação liberal para sua época. Seu pai, o diplomata, político e senhor de engenho baiano Domingos Borges de Barros, acreditava que a educação feminina deveria ir além dos bordados. Mesmo assim, quis impor à filha o casamento com um amigo brasileiro, bem mais velho do que ela. Luisa, ainda adolescente, rebelou-se. Escolheu ela mesma um marido francês - o conde de Barral.


Muito próxima do ideário do pai, Luisa seria sempre uma liberal moderada. Defendia a abolição - ponto de vista que expressou na correspondência com o imperador. Paradoxalmente, não hesitava em mandar que seus próprios escravos sofressem castigos físicos - e registrava essas ordens no diário: "Roubaram os patos e o óleo de mamona: Ignácia chicoteada quinze vezes".


A condessa testemunhou de perto alguns acontecimentos críticos da história brasileira e francesa. Estava na Bahia em 1837 quando eclodiu a Sabinada, revolta contra a regência. Na França, como dama de companhia da princesa Francisca, casada com um dos filhos do rei Luís Felipe, assistiu à Revolução de 1848, que derrubou a monarquia, e seguiu com a corte dos Orléans para o exílio na Inglaterra. Estava de volta à França, em 1871, quando eclodiu a revolta popular conhecida como Comuna de Paris. Eram tempos conturbados para as casas reais. Luisa, no entanto, nunca deixou de acreditar no poder moderador e na autoridade moral da monarquia.

A proclamação da República, em 1889, foi uma desilusão: "Para mim não há mais pátria", escreveu a condessa brasileira, na França. O imperador, já sem império e sem casa, perambulava pela Europa, dependente da hospitalidade de amigos. Passou algum tempo no castelo de Luisa no interior da França. Romântico, gostava de colher flores para deixá-las à porta do quarto da antiga amante. Foram suas últimas manifestações de afeto - a condessa de Barral morreria poucos meses depois, de pneumonia, em janeiro de 1891. Pedro de Alcântara seguiu-a em dezembro do mesmo ano.

sábado, 14 de fevereiro de 2009

BRAVA GENTE BRASILEIRA !!!


Dezesseis anos se passaram desde o controverso Plebiscito de 1993. Embora república e presidencialismo tenham sido mantidos, a campanha monarquista não foi em vão, angariando milhões de votos. Decerto muitos se lembram perfeitamente daquela época, e sem dúvida das três propostas em jogo, a causa monárquica foi defendida pelos militantes mais aguerridos e apaixonados.


Enganam-se aqueles que dizem que a monarquia sofreu uma derrota. Ao contrário, “foi uma primeira vitória dentro de uma longa trajetória”, disse certa vez o príncipe D. Bertrand de Orleans e Bragança. Sua Alteza Imperial está certo. O sonho imperial continua vivo, haja visto que cada dia mais e mais jovens procuram conhecer nosso passado de honras e glórias e imaginar uma nova Idade de Ouro para o Brasil. Esta nova geração muito deve aos heróicos batalhadores de 1993, que tanto lutaram contra inimigos poderosíssimos.


Aos que viveram o plebiscito e às novas gerações, é com prazer que convidamos a todos a lerem nossa Revista, para descobrir fatos de nosso passado nacional muitas vezes escondidos ou deturpados por motivos escusos... Que as vendas sejam tiradas e os brasileiros recuperem o sentimento de orgulho patriótico conhecendo a própria História!


É hora de acordar, BRAVA GENTE BRASILEIRA!!!


Os Editores.


terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Casa Real das Duas Sicílias

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Os Partidos da Nação


Atualmente, a essência da democracia reside em dois princípios fundamentais: o voto e a existência dos partidos políticos. Os partidos servem para exprimir e para formar a opinião pública. São um foco permanente de difusão do pensamento político, além de estimular os indivíduos a manter, exprimir e defender suas opiniões.



Os partidos tem também hoje um papel muito importante na preparação das eleições e na escolha dos candidatos, pois o partido deve levantar perante o eleitorado todos os problemas que hão de ser respondidos e assim apresentar o plano do programa que propõe realizar, caso conquiste o poder. O partido apresenta também o candidato, o que significa fazer a primeira triagem para a decisão do eleitorado.



Mas através do estudo da própria história do Brasil, iremos identificar a importante atuação do partido político como meio para a realização de mudanças no contexto social e político da nação: a independência, a abolição da escravidão, a instalação da república, o federalismo, o regime democrático, entre outras, que tiveram como grande propulsor os ideais unidos através de agremiações políticas. O publicista inglês Mac Iver associa que sem o sistema partidário, os únicos métodos para chegar-se a uma mudança de governo vem a ser o golpe de Estado e a Revolução.



Dividimos o presente trabalho, mostrando o quadro partidário de cada momento histórico político do Brasil. Cada um destes ciclos políticos teve o seu próprio sistema partidário:















A história dos partidos políticos no Brasil - VI



Os Tempos Atuais (1985 em diante)


A eleição de Tancredo Neves em 1985 marcou o fim dos quase 21 anos de autoritarismo e o início de um novo ciclo político na história brasileira. Uma das primeiras medidas do governo da Aliança Democrática (formado pelos integrantes do PMDB e a Frente Liberal, dissidência do PDS) foi aprovar no Congresso a Emenda Constitucional nº 25 (15.5.1985), que restabeleceu as eleições presidenciais diretas e retirou da Constituição o dispositivo referente à fidelidade partidária. Ficou também autorizada a livre criação de novos partidos políticos e a reorganização de todas as siglas que tivessem tido os seus registros indeferidos, cancelados ou cassados durante a vigência do regime autoritário.


Ainda em 1985 foi aprovada a lei 7.454 que alterou vários dispositivos do Código Eleitoral em vigor desde 1965, permitindo, por exemplo, que todos os partidos com registro provisório ou em formação pudessem participar das eleições para a Assembléia Nacional Constituinte.


A Constituição vindo em 1988 alterou também a condição jurídica dos partidos, pois de entes públicos passaram a ser privados, concedendo plena autonomia para que cada agremiação partidária determinasse suas próprias regras internas de organização e funcionamento.


Ao longo da Quinta República cerca de setenta partidos já obtiveram registros junto ao TSE, entre provisórios e definitivos e vinte e cinco diferentes partidos conseguiram eleger pelo menos um deputado federal, um senador ou um governador ao longo deste período.

A história dos partidos políticos no Brasil - V



O Regime Militar(1964 - 1985)


As Eleições de 1965 e a Frente Ampla


Os partidos políticos da Terceira República continuaram a funcionar nos primórdios do regime autoritário. Em 1964, confiante no apoio popular, o governo manteve o calendário eleitoral que previa a eleição de um presidente por voto direto no ano seguinte. No início de 1965, porém, considerou o projeto muito arriscado e adiou a eleição, ampliando o mandato do presidente Castelo Branco por mais um ano. As eleições para governador, que ocorreriam em onze estados, foram mantidas. A fim de melhorar suas chances, o governo editou uma série de regras destinadas a dificultar a vitória de opositores. Além dos que já haviam sido cassados, foram proibidos de concorrer também os ex-ministros do governo Goulart. Enquanto perseguia os adversários, o governo cumulava de favores os aliados.


Forçou composições políticas nos estados comandados por políticos da UDN, o partido mais fiel ao golpe. Os candidatos escolhidos receberam ainda ajuda oficial para o momento da eleição. A grande preocupação dos militares era manter o governo de dois estados governados pela UDN: Minas Gerais, com Magalhães Pinto, e o Rio de Janeiro, com Carlos Lacerda. Apesar de toda a pressão, a oposição venceu ambas as eleições (e ainda ganhou em Santa Catarina e Mato Grosso). Nem mesmo as vitórias dos candidatos oficiais em sete estados menores apagaram a impressão de uma grande derrota para os militares.


As derrotas eleitorais do governo em 1965 e o AI-2 fortaleceram a oposição ao regime. Além da desaprovação popular, um novo fator influenciou muitos políticos, sobretudo da UDN, que haviam apoiado o golpe: a percepção de que os militares permaneceriam muito tempo em cena, e não apenas o necessário para afastar os adversários de ontem e entregar o poder ao partido.


Carlos Lacerda, governador do Rio de Janeiro, líder civil do golpe – e com grandes esperanças de ser presidente – foi o mais destacado político a ter esta percepção. Derrotado em seu estado, depois da edição do AI-2 passou para a oposição ao regime que ajudara a colocar no poder. Aliou-se a um antigo adversário, Juscelino Kubitscheck, que, embora cassado, era o líder do PSD. Juntos, criaram no final de 1966 a Frente Ampla, cuja principal bandeira era o retorno ao estado anterior ao golpe. Durante todo o ano de 1967, as articulações prosperaram. Lacerda chegou até mesmo a ir a Montevidéu, onde estavam exilados o ex-presidente João Goulart e o ex-governador Leonel Brizola, para acertar a entrada do PTB na Frente Ampla.


Embora esta nunca conseguisse realizar grandes ações conjuntas, o movimento assustava: uma grande coalizão civil contra o governo militar, reunindo líderes dos grandes partidos políticos. Mas era tarde demais. A vida política do país já estava sob o controle dos militares. Entre 1967 e 1968, os principais líderes da Frente Ampla foram cassados.


O Sistema Partidário


O Ato Institucional no 2, editado em outubro de 1965, reformou o sistema político de modo a enterrar de vez as veleidades dos políticos de oposição quanto a uma volta ao regime democrático.


As eleições presidenciais passavam a ser sempre indiretas. Os candidatos se apresentariam ao Congresso, que votaria em sessão pública e com escolha nominal – uma forma de tentar eliminar eventuais surpresas desagradáveis. O sistema partidário era extinto por decreto. Na prática, as condições para a criação de partidos só tornavam plausível o surgimento de um partido favorável ao governo e outro de oposição.


O AI-2 também criava a fidelidade partidária, que obrigava todos os eleitos a votar segundo as decisões da cúpula partidária sob pena de perda de mandato. Aumentava-se assim o poder de pressão do Executivo sobre o Legislativo e impediam-se manobras pluripartidárias como as da Frente Ampla. Foi exigido que as organizações partidárias provisórias registrassem, cada uma, a filiação de no mínimo 120 deputados federais e 20 senadores (a Câmara dos Deputados e o Senado Federal eram integrados por 409 e 66 membros respectivamente). Do ponto de vista matemático, até 3 partidos poderiam ter sido criados, mas na prática se observou um bipartidarismo colocado compulsoriamente de cima para baixo e não resultado da gradativa sedimentação das preferências eleitorais da opinião pública ao longo do tempo.


Arena


O partido de apoio ao governo previsto nas regras do AI-2 foi formado rapidamente. Quase dois terços dos parlamentares (250 deputados e 40 senadores) optaram por ficar na Arena (Aliança Renovadora Nacional), o partido que prometia todas as benesses aos obedientes. A maioria desses parlamentares provinha da antiga UDN, que havia apoiado o golpe e fora pouco atingida pelas cassações e perseguições.


A eles juntou-se a maior parte do PSD, o antigo partido de centro. Neste, a divisão interna surgida no momento do golpe, em abril de 1964, aguçada com a cassação de seu principal líder (o ex-presidente Juscelino Kubitschek) e de seus parlamentares, resultou em uma cisão. Os membros do PSD que optaram pela Arena não tinham simpatias especiais pelos militares, mas muito apreço pelo domínio de instituições no Estado, agora uma possibilidade aberta apenas a quem apoiasse o governo. A composição da Aliança Renovadora Nacional completou-se com a adesão de parte das bancadas trabalhistas (cerca de 25 parlamentares).


MDB


Os poucos políticos eleitos que tiveram coragem de se reunir na agremiação de oposição ao governo militar formaram o MDB (Movimento Democrático Brasileiro). Estar neste partido era um convite para sofrer a perseguição oficial, enfrentar a ameaça permanente de cassação de mandato e direitos políticos, exercitar a prudência nas críticas.


Mesmo assim o MDB conseguiu reunir 120 deputados e 20 senadores. A maior parte dos fundadores (cerca de 65% dos parlamentares), eram sobreviventes do antigo PTB que não haviam perdido seus mandatos. O segundo contingente mais importante (cerca de 30% dos fundadores) eram políticos do PSD que haviam preferido o caminho da oposição depois de mais de duas décadas como situação (desde sua criação, o PSD não esteve no poder somente durante o breve governo de Jânio Quadros).


Uma pequena fração do partido, cerca de 5% dos fundadores, era de antigos membros da UDN, o partido político dos golpistas. Arrependidos com as conseqüências do movimento que haviam ajudado a deflagrar, esses parlamentares udenistas passaram para a oposição num momento em que seus antigos colegas de partido praticamente haviam assegurado o monopólio da grande maioria dos cargos políticos importantes.


Cassações


As eleições de 1966 foram as primeiras feitas segundo os moldes previstos no AI-2 e no estilo truculento dos militares. Era um teste para os pleitos indiretos e não houve manobra que deixasse de ser realizada para garantir a vitória dos candidatos oficiais. O movimento começou na Câmara Federal. Cada crítica aguda ao governo era seguida por um festival de cassações. Os primeiros atingidos foram os líderes do recém-criado MDB, que ainda pensavam em disputa eleitoral apesar das regras draconianas impostas pelos militares. Mesmo os aliados do governo que se sensibilizavam com tantas arbitrariedades eram punidos de modo exemplar.


Foi o que ocorreu com o presidente da Câmara dos Deputados, o fundador e líder da UDN Adauto Cardoso, que convocou os líderes da oposição punidos para participarem de uma sessão legislativa. A reação do governo foi dura: não só cassou o mandato de Cardoso como suspendeu o funcionamento do Legislativo até depois das eleições. Com isso, a disputa concentrou-se nos estados, onde ao menos os opositores tinham uma tribuna para reclamar. Porém, toda vez que levantavam a voz, vinham as punições. No Rio Grande do Sul, quatro deputados governistas que elogiaram o candidato de oposição foram cassados, assim como quatro parlamentares oposicionistas.


A situação repetiu-se nos dez estados em que haveria eleições – e a reação do governo foi a mesma, cassando os mandatos de tantos quantos se pronunciassem. Criou-se assim uma realidade insustentável para os opositores. A única saída encontrada pelo MDB para sobreviver foi se abster dos pleitos para os cargos executivos estaduais, o que garantiu a vitória da Arena em todos eles. Mesmo concentrando seus esforços nas eleições parlamentares, o MDB não escapou da previsível derrota. A Arena, que tinha 254 deputados federais, elegeu 277. O MDB passou de 149 a 132. No Senado, das 22 vagas em disputa a Arena ficou com 18, deixando apenas 4 para o MDB.


Amigos do Poder


O emprego crescente da violência como método de ação política era tanto um castigo para os opositores como um prêmio para políticos que nunca se haviam destacado no período democrático. A revolução abriu uma oportunidade para eles. Sua grande arma de ascensão passou a ser a amizade nos quartéis. Falando para ouvidos certos ganharam a possibilidade de ser indicados para a disputa de cargos elevados, esmagar adversários através de cassações – com a vantagem de que os militares ficavam com todo o ônus da arbitrariedade –, vencer pleitos e controlar à força os descontentes.


Os favoritos do regime militar, em geral, eram antigos políticos udenistas, como o maranhense José Sarney, indicado para o governo do Maranhão; Antônio Carlos Magalhães, nomeado prefeito de Salvador; ou Roberto de Abreu Sodré, governador de São Paulo a partir de 1967. Antes inexpressivos, tornaram-se de repente importantes. E trouxeram consigo asseclas de variada espécie que foram ganhando os cargos de mando deixados vagos pela truculência. Passaram a apadrinhar secretários, deputados, prepostos do governo e presidentes de estatais. Tudo em nome de uma suposta “moralização”, que iria substituir os costumes “corrompidos” dos antigos políticos que sempre os venceram nas urnas. Assim o regime militar começava a criar uma casta de privilegiados políticos, a maior parte com profundo desprezo pela democracia e o Brasil atrasado que produzia representantes de outros interesses que não os seus.


Por outro lado, os próprios militares comprometiam-se cada vez mais com esses políticos. Apostando em nomes pouco representativos, obrigando-se a dar-lhes apoio integral, perseguindo os adversários, nunca tinham respaldo popular, o que os obrigava a aumentar a perseguição para garantir o poder dos escolhidos. A partir do AI-2, criou-se um caminho sem volta que vinculava as ambições de alguns políticos à permanência do regime militar. E uma situação na qual os militares faziam o serviço sujo e pesado em benefício dos civis que os apoiavam.


Mudança do Sistema Partidário


O governo do general Figueiredo começou com um novo quadro político. Pouco depois de sua eleição e antes da posse, o Congresso aprovou uma lei que modificava as regras para a criação de partidos políticos. A Lei n.º 6.767 de 1979 reformulou vários dispositivos da Lei Orgânica dos Partidos Políticos. Acabavam ali situação e oposição como as únicas posições políticas no país. A maior liberdade para criar partidos, somada à volta de todos os políticos cassados propiciada pela anistia, imprimiu novo dinamismo à vida política nacional.


A Arena transformou-se em PDS (Partido Democrático Social), mas continuou sendo o que era: o partido de sustentação do governo, sem idéias próprias. Parte dos parlamentares preferiu sair para o Partido Popular (PP), formado juntamente com moderados do antigo MDB, o mais destacado dos quais era Tancredo Neves.


O MDB, criado pelos sobreviventes do arbítrio militar, havia conseguido transformar-se num verdadeiro partido político. Tinha programa – então baseado na volta à democracia plena e na convocação de uma Constituinte –, organização nacional, um nome de apelo forte entre o eleitorado. Por isso, os principais líderes resolveram manter inclusive o nome da agremiação, adicionando apenas a palavra “Partido” – obrigatória por lei. O quadro partidário completou-se com o surgimento de três partidos na faixa trabalhista. O Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) renasceu, sob o comando de Ivete Vargas, sobrinha do presidente Getúlio Vargas. O ex-governador Leonel Brizola fundou o PDT (Partido Democrático Trabalhista). Mas os tempos haviam mudado.


O partido mais forte na área ficou sendo o PT (Partido dos Trabalhadores), fundado por políticos de esquerda e os novos sindicalistas que surgiram depois das greves de 1978 e 1979. Defendia a existência de uma organização independente do Estado – e tinha uma, a Central Única dos Trabalhadores.


A história dos partidos políticos no Brasil - IV



A Democratização (1945 - 1964)


A Terceira República foi um período onde a democracia foi observada com maior atuação no quadro nacional. Em nenhum momento anterior combinaram-se de modo duradouro o sufrágio universal e eleições competitivas, isto é, com efetiva alternância no poder.


Durante a Terceira República, o TSE concedeu registro provisório a 32 organizações partidárias. Entre 1947 e 1952, entretanto, 16 desses registros foram cancelados, em que quase todos os casos devido ao não cumprimento dos requisitos organizacionais para obtenção do registro definitivo e outras três legendas se incorporaram em outros partidos. Assim, quando do golpe de 1964, haviam 13 partidos políticos em funcionamento legal no Brasil, todos com o registro eleitoral definitivamente concedido. O Partido Comunista Brasileiro (PCB) atuava na clandestinidade desde 1947.


Os principais partidos desta fase são o PSD, a UDN e o PTB que ocuparam 79,8% de todas as cadeiras na Câmara dos Deputados e 86,2% dos assentos no Senado Federal, ao longo das cinco legislaturas que atuaram.


O Partido Social Democrático (PSD)


O Partido Social Democrático foi o maior do Brasil ao longo de toda a Terceira República, elegendo as maiores bancadas no Congresso Nacional em todos os pleitos que disputou. Foi o único partido que conseguiu se organizar em todas as unidades da federação para a disputa das eleições de 1945, o que já demonstrava a sua nítida vocação governista. Seu principal conflito interno travava-se entre o reformismo da Ala Moça e o fisiologismo das “raposas”. Foi por essa legenda que o general Eurico Dutra elegeu-se presidente em 1945, com 55,3% dos votos válidos. Na eleição de 1950, os setores mais importantes do partido deixaram o seu candidato oficial Cristiano Machado para apoiar Getúlio Vargas.


Obs.: Em razão deste fato, na política brasileira o termo “cristianização” passou a designar a situação em que a máquina partidária não concede apoio efetivo ao seu candidato registrado formalmente.


Em 1955, o partido voltaria a presidência com a candidatura de Juscelino Kubitschek, eleito com 35,7% da votação. Em 1960, concorreu o marechal Henrique Lott que ficou com 32,9% dos votos.


A União Democrática Nacional (UDN)


A UDN foi a segunda maior agremiação daquele sistema partidário. Apenas após a eleição de 1962 a sigla deixou de ter a segunda maior bancada no Congresso Nacional. A UDN foi o único dos três grandes partidos que não possuía vínculos com as estruturas remanescentes do Estado Novo, adotando uma plataforma liberal.


Desde sua criação, ainda no primeiro governo de Getúlio Vargas, a UDN não conseguia vencer uma eleição presidencial. As derrotas de 1945, 1950 (o candidato foi o brigadeiro Eduardo Gomes, que terminou nas duas eleições em segundo lugar) e 1955 (general Juarez Távora, também ficando em segundo) acabaram levando o partido a escolher, em 1960, um candidato que não era de suas fileiras, mas tinha apoio popular: o ex-governador de São Paulo, Jânio Quadros. A estratégia de trazer um candidato que tinha mais força que a legenda mostrou-se vitoriosa. Jânio recebeu 48,5% dos votos, quase o dobro de seu maior adversário.


Mas a vitória do candidato a presidente não se refletiu sobre a estrutura de poder. O vice-presidente eleito (na época, havia votações em separado para os cargos de presidente e vice) foi João Goulart, do PTB, cujas posições políticas eram opostas às do presidente em muitas questões. No Congresso, a UDN ficou com apenas 22% das cadeiras, contra 56% de seus adversários tradicionais, o PSD e o PTB.


Esta situação limitava bastante o raio de ação do presidente, que só conseguiria aprovar seus projetos no Congresso com o apoio dos adversários. Uma situação difícil, ainda mais no momento em que o candidato eleito havia feito uma campanha prometendo uma grande reforma nacional, só realizável com aprovação do Congresso.


O Partido Trabalhista Brasileiro (PTB)


O PTB constituía-se no terceiro maior partido da Terceira República, e foi a legenda com maior crescimento eleitoral ao longo desse período. Em 1962, suplantou a UDN e passou a ser o segundo maior partido dentro do Congresso Nacional. O partido era formado por uma corrente nacionalista e reformista e por um grupo tradicional clientelista. O PTB foi um constante aliado do PSD na disputa das eleições presidenciais, e apoiou as candidaturas pessedistas em 1945, 1955 e 1960. Em 1950, Getúlio Vargas elegeu-se presidente pelo PTB com 48,7% dos votos.


Outros Partidos

Além dos três grandes partidos destacaram-se também o Partido Social Progressista (PSP), partido de Adhemar de Barros, o Partido Republicano (PR), o Partido Democrata Cristão (PDC) que elegeu Jânio Quadros Presidente em 1960 e o Partido da Representação Popular (PRP) que era herdeiro da Ação Integralista Brasileira, tendo Plínio Salgado como seu líder.


O Partido Comunista (PCB)


O PCB, a mais antiga organização partidária do país (fundada em 1922), foi legalizado pela primeira vez em 1945. Naquela ano, elegeu 14 deputados federais (tornando-se o quarto maior partido na Câmara dos Deputados). O líder comunista Luis Carlos Prestes foi eleito para o Senado Federal. O partido chegou também a disputar a primeira eleição presidencial da Terceira República ficando em terceiro lugar com o candidato Yedo Fiúza. Em maio de 1947, porém, o PCB teve o seu registro eleitoral cancelado pelo Tribunal Superior Eleitoral, por razões ideológicas. Todos os parlamentares pecebistas tiveram os seus mandatos cassados. O partido continuou, porém, atuando politicamente na clandestinidade até retornar à legalidade em 1985.

A história dos partidos políticos no Brasil - III



A Era Vargas (1930 - 1945)

Antes da Constituinte de 1934, o Governo Provisório tinha promulgado o decreto 21.076, em 1932, regulando as eleições. Esta lei reconhecia a existência jurídica dos partidos e regulava o seu funcionamento. Considerava duas espécies de partidos: os permanentes, que adquiriam personalidade jurídica nos termos do artigo 18 do Código Civil, e os provisórios, que não adquiriam aquela personalidade e se formavam transitoriamente à véspera dos pleitos, apenas para disputá-los. Também eram equiparadas a partidos “as associações de classe legitimamente constituídas”. Permitia-se também as candidaturas avulsas, isto é, aquele candidato que não constava na lista de partido algum desde que tal fosse requerido por um número mínimo de eleitores. Com esta lei de transição se chegou à Constituinte de 1934.


A Constituinte de 1934 embora tenha criticado muito a política dos governadores e o oficialismo partidário, manteve no texto positivo da Constituição de 1934 os partidos estaduais. Mas confirmou o sistema proporcional e a Justiça Eleitoral, duas conquistas memoráveis, preparatórias da organização partidária do futuro. Por outro lado, adotou o hibridismo da representação profissional dentro das Assembléias eleitas por sufrágio universal, traço tipicamente fascista, que importava a criação de uma grande bancada apartidária, a qual funcionava, dentro das Assembléias, como uma espécie de instrumento permanente dos Governos contra a livre ação dos partidos.


Fora das bancadas profissionais classistas, que mais não eram que instrumentos do Governo, havia representantes do chamado partido Socialista Brasileiro, o qual se distribuía por diferentes estados, adotando como complemento da denominação os nomes das unidades federais de onde provinham. O mais evoluído e caracterizado deles era o de São Paulo, que se proclamava marxista, filiado à orientação da Segunda Internacional.


O Golpe Comunista de 1935


Fundado em 1922, em seus primórdios o Partido Comunista do Brasil teve como inimigos os anarquistas, muito ativos na segunda década do século XX. Estes, no entanto, foram perdendo força, sobretudo após a implantação do regime comunista na Rússia. Os comunistas brasileiros recebiam de Moscou não só a orientação política a ser seguida como ajuda material e a colaboração de camaradas de outros países.


Ao final dos anos 20, o partido já estava estruturado e tinha penetração entre os operários urbanos. A partir da primeira metade da década de 30, quando Luís Carlos Prestes entrou no partido, a organização ampliou suas bases, pois o líder da Coluna que levou seu nome gozava de muito prestígio junto à classe média e aos militares. Os comunistas ficaram à margem dos principais fatos políticos da primeira metade da década, como a Revolução de 30 e a Revolução Constitucionalista de 32, que, para eles, resumiam-se a conflitos internos à classe dominante, meros choques entre o “imperialismo americano” e o “imperialismo inglês”.


Mesmo assim os comunistas foram violentamente perseguidos pelo regime, atuando em geral na clandestinidade. Em 1934, no entanto, foi lançada a Aliança Nacional Libertadora, com Prestes como presidente de honra e um programa de conteúdo nacionalista capaz de obter a adesão de outros setores. A ANL, que oscilava entre a insurreição armada e a consolidação de uma aliança de classes para a conquista do poder, agregou quase 100 mil membros nos poucos meses em que teve existência legal. Um discurso criticando o governo foi o pretexto que o governo queria para fechar a ANL, em 1935. A partir daí fortaleceu-se no partido a tendência insurrecional e, enquanto se multiplicavam as prisões de seus militantes, o PCB começou a se preparar para um levante armado.


Talvez embalados pelo clima de efervescência política, e a despeito de todos os indícios, os comunistas julgaram ter chegado o momento da revolução, e em novembro de 1935 desfecharam uma tentativa de revolta – não uma revolução popular com ampla participação de operários e camponeses, como ocorrera na Rússia e como pregava o credo comunista, mas um golpe militar a partir de quartéis do Exército no Rio Grande do Norte, Pernambuco e Rio de Janeiro.


Da revolta resultaram várias mortes de parte a parte, e o movimento foi sufocado pelo governo em poucos dias, com uma feroz perseguição aos militantes. Foram para a prisão e o exílio não só os revoltosos, mas também simpatizantes da Aliança Nacional Libertadora, além de indivíduos considerados inimigos do regime.


Mas a situação brasileira tinha características próprias: o pensamento conservador vitorioso não contava com um partido organizado que mobilizasse as massas, pois os donos do poder não confiavam nos integralistas. O grande agente da modernização conservadora acabou sendo o Estado: para o pensamento conservador, a sociedade brasileira era politicamente atrasada e desarticulada, e as necessárias transformações sociais e econômicas só poderiam ser feitas pelo Estado, única força social de âmbito nacional e capaz, ademais, de promover tal modernização de maneira técnica e racional. Desta forma, a solução encontrada não privilegiou um partido totalitário, e sim um Estado autoritário.


A fracassada revolta comunista de novembro de 1935 desencadeou uma forte repressão aos movimentos de esquerda. Dois fatores exaltaram os rancores: a “traição” dos militares comunistas, que atacaram colegas de farda, e a agressão aos brios nacionalistas, pois o golpe fora apoiado pela Internacional Comunista.
Esta organização, controlada pelos russos, havia enviado agentes para ajudar nos preparativos da insurreição. A tentativa de golpe custou muito caro aos comunistas e seus simpatizantes – muitos foram mortos, torturados, presos sem culpa formada –, mas sobretudo custou caro às liberdades democráticas.


O Congresso aprovou todas as medidas de exceção pedidas pelo Executivo, aceitando até mesmo a prisão de parlamentares, que tinham imunidade. Também o poder Judiciário foi ferido em sua autonomia, pois foram criados tribunais e comissões especiais para julgar os prisioneiros segundo normas que não obedeciam aos princípios jurídicos constantes da Constituição; o chefe de polícia da capital teve seus poderes muito ampliados, passando a prestar contas apenas ao presidente da República, Getúlio Vargas.


Neste clima de crescente violência, de redução dos poderes da sociedade civil e de crescimento dos poderes do Estado, é que foram se preparando as candidaturas presidenciais para as eleições que deveriam se realizar em 1938: havia um candidato oficial, José Américo de Almeida, um candidato paulista, Armando Salles de Oliveira, e o integralista Plínio Salgado. Mas havia já um ditador em potencial, o plenipotenciário Getúlio Vargas.


A Extinção dos Partidos Políticos

Pelo Decreto-lei n.º 37, de 2 de dezembro de 1937, o ditador extinguia os partidos, declarando: “todas as arregimentações partidárias registradas nos extintos Tribunal Superior e Tribunais Regionais da Justiça Eleitoral, assim como as que, embora não registradas em 10 de novembro do corrente ano, já tivessem requerido o seu registro”.


Na mesma sentada, atingiu em cheio a Ação Integralista, ao proibir “as milícias cívicas e organizações auxiliares dos partidos políticos, sejam quais forem os seus fins e denominações” e ao vedar “o uso de uniformes, estandartes, distintivos e outros símbolos dos partidos políticos e organizações auxiliares...”


O Partido Único

De acordo com o pensamento político soleriano (George Sorel), todos os partidos são corrompidos, inclusive os socialistas, por isso previa a destituição de todos os partidos e a transferência da representação popular para os sindicatos.


O fascismo triunfante na Alemanha e Itália não adotou propriamente a tese de Sorel, ao contrário, transformou os sindicatos em órgãos apolíticos de apoio ao Governo, mas limitou-se a fazer o que lhe convinha, isto é, a destruir todos os partidos com a exceção de um, que era o seu próprio. Daí a tese do partido nacional único, o que era até um contra-senso, dado o fato de que a palavra “partido” origina-se justamente de “partes”. Foi assim conseqüência natural da adaptação fascista do pensamento soreliano.


Em determinado momento, Getúlio Vargas e seus companheiros estado-novistas pensaram seriamente em criar o partido único, típico das ditaduras fascistas. Testemunha Afonso Arinos de Melo Franco: “Para isso empreenderam, em 1938, debaixo de grande propaganda, a fundação de um organismo denominado Legião Cívica Brasileira, núcleo do futuro partido totalitário. Mas as Forças Armadas, co-responsáveis pelo golpe de 10 de novembro, viram nessa manobra uma clara ameaça à sua autonomia e se opuseram ao prosseguimento do plano que, se executado, viria colocá-las na situação subordinada em que se encontravam nos países verdadeiramente fascistas”.


Criação dos Partidos políticos em 1945


Após o fim da Segunda Grande Guerra, embora com margem de manobra cada vez menor, Getúlio continuava tendo condições de manejar a vida política do país. Em 1945, publicou um decreto que obrigava os partidos políticos a se organizarem em âmbito nacional para o seu registro no TSE (Lei Agamenon) Com isso, conquistou uma grande vantagem sobre seus eventuais adversários, que tinham poucas possibilidades de fundar partidos que abrangessem todo o país.


Enquanto tentavam, o ditador fez do esquema de centralização em torno do Estado um elemento de sustentação política. Com habilidade, criou dois partidos políticos baseados em áreas que ainda controlava. O principal deles foi o Partido Social Democrático (PSD), que aglutinou interventores, encarregados das instituições públicas e boa parte dos que se beneficiavam com o centralismo (fazendeiros cuja produção era comprada pelo Estado, industriais com cargos no sistema de federações e acesso ao governo etc.). Isto resultou em um partido voltado para a continuidade do esquema estadonovista – e muito pragmático, que via na ocupação dos cargos que permitiam a continuidade do estatismo uma forte razão de existência.


O segundo partido criado por Vargas baseava-se no sindicalismo estadonovista: o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Seus líderes eram dirigentes sindicais que controlavam verbas previdenciárias, compartilhadas com o governo através dos institutos classistas, então autarquias.


Esta estrutura dava um caráter dúplice ao partido, que ganhava força com o atendimento de reivindicações trabalhistas, mas só podia atendê-las com ajuda do Estado. Por isso, atuava no sentido de canalizar pedidos para o governo – o que só reforçava o esquema montado na ditadura.


A formação desses dois partidos deixou pouco espaço para os opositores. Eles conseguiram formar um terceiro partido nacional, a União Democrática Nacional (UDN). Embora fosse o único partido sem vínculos com o Estado, encontrou grandes dificuldades para sobreviver. Sua grande força estava no fato de se opor à ditadura. Por isso, reuniu no início liberais, adversários do governo, sobreviventes da primeira república, socialistas democráticos. Logo surgiram divisões. Depois de um tempo, dois elementos contraditórios compunham sua base: liberais e militares centralizadores.


Nas primeiras eleições, em 1945, a vitória foi do PSD. O partido conseguiu eleger 61% dos senadores e 52% dos deputados constituintes. Em segundo lugar ficou a UDN, com 24% do Senado e 27% da Câmara. Em terceiro, o PTB, com 5% do Senado e 8% da Câmara.


A partir desta eleição articulou-se uma aliança nacional que duraria quinze anos, vencendo três eleições presidenciais e mantendo a maioria no Congresso: PSD e PTB. O apoio conseguido para a centralização do Estado Novo transformou-se, no período democrático, em poder estabelecido.

A história dos partidos políticos no Brasil - II



A RepúblicaVelha (1889 - 1930)

.1ª República

Os Partidos Estaduais

Na Primeira República, a política nacional foi no fundo baseada na política dos grandes estados.
A autonomia estadual, garantida pela Constituição de 1891, foi um ideal republicano que permitiu a expansão de forças sociais e econômicas das regiões. Eis por que os partidos Republicanos Mineiro e Paulista – os famosos PRM e PRP – passaram a ser peças essenciais desta máquina da política dos governadores ou dos Estados. Atuando também com grande força no Congresso Nacional, estes dois partidos estaduais tiveram, de fato, na Primeira República uma função nacional.


Partido Democrático

O clima de convulsão no governo do presidente Artur Bernardes provocou uma divisão até mesmo em seus maiores aliados, os cafeicultores paulistas. Em março de 1926, alguns deles abriram a primeira fissura num bloco monolítico, lançando um partido dissidente, o Partido Democrático.


Até então, devido à política dos governadores, a vida política tinha sido completamente federalizada. Os partidos de peso eram todos de âmbito estadual, o que garantia o controle da política pelas lideranças locais. Com o poder garantido na relação com o governo central, esses partidos eram contrários a qualquer mudança nas regras eleitorais – a despeito dos protestos cada vez mais intensos.


O Partido Democrático foi o primeiro a romper com este esquema. Menos por sua importância eleitoral, que era pequena, e mais por ter incluído em seu programa algumas das principais reivindicações tenentistas, entre elas a do voto direto. Com sua criação, alterou-se o jogo político nacional. Até então, o domínio absoluto do Partido Republicano Paulista no cenário estadual havia sido uma garantia para a representação dos interesses cafeeiros no cenário nacional. A partir de 1926, no entanto, todos os opositores da política oficial encontravam um aliado em São Paulo. Essa divisão foi um prenúncio de crise no sistema de poder.


Assis Brasil, referindo-se em nota de 1931 a este partido, opina: “Das tentativas feitas na República para organização de partidos nacionais, a mais baseada em princípios, a mais metodicamente empreendida e a que mais caminhou no sentido do êxito definitivo foi a recentíssima do partido Democrático Nacional. As vicissitudes confusas, próprias do dia seguinte ao de uma revolução triunfante, perturbaram e detiveram, com exceção de poucos núcleos, a marcha tão promissoramente encetada; mas devemos ter fé em que não se estiolem as raízes que já penetraram tão vigorosamente o chão de sua cultura... É inegável que a Revolução, pelas suas declarações prévias contidas no programa da Aliança Liberal, avocou os princípios do partido Democrático Nacional.


Devemos, assim, considerar este partido como uma espécie de estuário do pensamento político progressista, ao mesmo tempo em que como uma demonstração patente da decadência da política dos partidos estaduais. Era o fruto de uma nova mentalidade, imposta por circunstâncias também novas.


É forçoso, por outro lado, reconhecer que o partido Democrático Nacional, pela sua estrutura e composição, exprimia apenas os anseios da reforma política, no sentido mais formal da expressão. Não se aprofundava até às necessidades da reforma social.