"Nós, os monarcas, somos incontestavelmente constantes em um mundo em constante transformação. Pelo motivo de termos estado sempre aqui, mas também por não nos envolvermos na política cotidiana. Estamos informados das mudanças políticas que acontecem em nossas sociedades, mas não fazemos comentários sobre isso. É nisso que assumimos uma posição única. Nenhum dos outros monarcas europeus interfere na política."

Margarethe II, Rainha da Dinamarca

quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

O problema são os políticos?



Helio Santos

Qual é realmente o problema do Brasil. Quem são os protagonistas desta peça teatral que vivemos cotidianamente?

Me faço sempre a pergunta de qual é o problema do  Brasil.

Por que um país com uma capacidade enorme e bem diversificada na produção, com terras férteis, sem grandes desastres naturais como vulcões, tempestades ou congêneres está constantemente em crise. Além disso,  somos um pais que por causa de seu relativamente simples processo de colonização não tem grandes conflitos internos atuais relacionados à política, a religião ou  a etnia.

Então novamente vem em  mente. Por que não somos uma potência mundial?

Por que somos um país pobre e com enorme desigualdades  sociais?

Tenho certeza que muitos falarão: Haa... o problema do Brasil  são os políticos. Haa.. o problema é a atual presidente  que não sabe governar. Haaa.... o problema é a corrupção dos parlamentares.

  
Pois bem, mas  quem são os políticos? Da onde eles vêm? Como são empossados?

Vivemos em uma sociedade muito individualista e "grupalista" em que todas as ações tem por objetivo único o bem-estar individual ou do seu pequeno grupo.

O outro não importa. Vivemos em uma sociedade em que o “meu” é muito mais importante que o “nosso”. 

E por este mesmo motivo é que considero que o real problema no Brasil não está nas mãos dos políticos.

Até porque os políticos do futuro são os jovens ou até as crianças de hoje que já crescem levando consigo valores distorcidos e pouco humanitários  de nossa sociedade atual.

Então como cobrar políticos descentes se nós mesmos não somos muita das vezes honestos e solidários?

As manifestações que ocorreram e que periodicamente ocorrem acerca do impeachment da atual presidente nada mais nada menos tem por objetivo a troca do poder. Mas tenha certeza que a corrupção não acabará e sim passará para as mãos de outro grupo.

O problema não está com o PT, o PMDB, o PZ ou o PW5. O problema está com o perfil dos brasileiros. Nós temos que mudar. Nós somos muita das vezes desonestos  e pensamos apenas em nós mesmos ao invés do outro.

Temos que agir para que todas as nossas ações sejam em pról do coletivo, em pról do bem-estar de todos e não apenas de nós mesmos ou de nosso pequeno grupo e isso se dá não na maior parte das vezes em pequenas ações do dia-a-dia como um bom dia, um aperto de mão, um sorriso, uma ajuda que você dá para o seu vizinho, a devolução de um troco recebido indevidamente, enfim. A grandiosidade do ato não está em sua concepção de importância e sim na repercusão que terá na vida da outra pessoa seja a curto ou médio prazo. 


E para fazer isso não é necessário ficar na inércia e se desmotivar porque ninguém faz o certo. Para contribuir para a mudança do Brasil é necessário apenas uma coisa: faça você primeiro! Assim seremos a força motriz de uma mudança plena e sustentável.

Semipresidencialismo: quando a separação entre Estado e governo pode ser desejável



Gilmar Mendes

A grave crise político-institucional que hoje atormenta o país, reforçada pelos cotidianos escândalos que revelam a capilaridade da corrupção na estrutura administrativa brasileira, não deixa dúvida de que é primordial repensar as formas pelas quais o Estado brasileiro é regido.

Coloquemos em foco o Poder Executivo Federal. Desde a promulgação da Constituição Federal de 1988 — fato que simboliza categoricamente a redemocratização do Brasil após os penosos anos de regime militar — elegeram-se quatro presidentes da República: Fernando Collor de Mello, Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Vana Rousseff. Dos quatro presidentes eleitos, apenas dois conseguiram terminar os mandatos sem serem destituídos compulsoriamente do cargo. Ou seja, em quase 30 anos de democracia, apenas a metade dos presidentes eleitos para governar o país não perdeu o seu mandato.

O quadro é deveras grave e a busca por solução deve ser, inquestionavelmente, prioridade para os atuais governantes. A resposta para essa questão passa certamente pela revisão do nosso sistema de governo.

Para Jorge Reis Novais, prestigiado constitucionalista português e professor da Faculdade de Direito de Lisboa, a expressão sistema de governo consistiria, em linhas gerais, no “relacionamento institucional entre os vários órgãos de exercício do poder político”.

O Brasil atualmente é regido sob o sistema de governo presidencialista. Nesse sistema, a partir de eleições populares, designa-se um presidente da República, o qual acumula as funções de chefe de Estado e de chefe de governo. Enquanto chefe de Estado, o presidente é quem representa o país nos países estrangeiros, é quem comanda as Forças Armadas e quem define políticas externas, por exemplo. Enquanto chefe de governo, por outro lado, o presidente é incumbido de exercer as funções executivas, de fato, como a de impor as políticas públicas e a de nomear os ministros de Estado, a título de exemplo.

Já se tornou evidente que, em nosso país, o acúmulo das funções de chefe de Estado e de governo não gera bons resultados, mas, na verdade, resulta em sérios desacertos nas relações institucionais entre o Poder Executivo e o Legislativo. Basta, para tanto, analisar a dificuldade para governar a nação enfrentada por um presidente da República que não tenha boa aprovação no Congresso Nacional.

Vê-se, assim, que o presidencialismo brasileiro, ao concentrar a chefia de Estado e a chefia de governo na pessoa do presidente da República, não distingue nitidamente os limites de cada atribuição, fazendo com que problemas de governo se tornem problemas de Estado.

Por outro lado, a adoção de um sistema de governo parlamentarista no Brasil também não seria oportuna. Isso porque, no parlamentarismo, o chefe de Estado possui atribuições meramente formais e representativas, motivo pelo qual a adoção do sistema ocasionaria um enfraquecimento drástico dos poderes conferidos ao chefe de Estado brasileiro.

Em vista disso, a melhor solução para o impasse parece ser a adoção de um sistema de governo semipresidencialista, um modelo situado entre o presidencialismo e o parlamentarismo.

O semipresidencialismo diz respeito a modelo intermediário, no qual o exercício do Poder Executivo é compartilhado entre um presidente da República — que desempenha a função precípua de chefe de Estado — e um primeiro-ministro — que desempenha a função de chefe de governo.

Nesse sistema, o presidente da República é escolhido por eleição popular — assim como ocorre no presidencialismo — e desempenha papel mais relevante do que o desempenhado pelo chefe de Estado no modelo parlamentarista. A depender das regras estabelecidas, o presidente da República, no semipresidencialismo, poderia indicar o primeiro-ministro, controlar a política externa do país, solicitar referendos, propor leis e, inclusive, dissolver o parlamento.

De outro lado, quem exerce a chefia de governo no sistema semipresidencialista é o primeiro-ministro. Nessa circunstância, a ele compete, por exemplo, a escolha dos ministros de Estado, a elaboração de políticas econômicas, bem como toda a articulação política com os membros do Poder Legislativo.

Como se vê, a adoção do sistema semipresidencialista resultaria na introdução de novas particularidades próprias do sistema parlamentarista — como o aumento da responsabilidade do processo decisório congressional —, sem abolir, no entanto, a inteireza das funções relevantes conferidas ao presidente da República.

Além disso, o sistema semipresidencialista permitiria a criação de mecanismos de destituição dos primeiros-ministros que porventura viessem a perder apoio político, sem, todavia, prejudicar a chefia de Estado e sem a necessidade de cometimento de crime de responsabilidade — que é hoje o que autoriza o processo de impeachment.

Há dois modelos de sistema semipresidencialista que merecem destaque: o modelo português e o modelo francês. Esses dois modelos possuem diferenças marcantes entre si, principalmente no que concerne às atribuições do presidente da República.

O semipresidencialismo francês guarda raízes na Revolução Francesa e nos ideais do general Charles de Gaulle, no pós-Segunda Guerra Mundial. A forte tradição parlamentarista foi herdada da revolução, com as competências centrais atribuídas à Assembleia Nacional. Já o pensamento de De Gaulle, por sua vez, possibilitou emergir uma nova ideia de participação no sistema político francês, apresentando, assim, a figura de um presidente que, além de exercer a chefia de Estado, participava ativamente da política.

Com a promulgação da Constituição Francesa de 1958, firmou-se um sistema político que conferia destaque às atribuições do chefe de Estado. De Gaulle coordenava diretamente a política externa do país, comandava as Forças Armadas e ainda tinha o poder de dissolver a Assembleia Nacional, em caso de crises políticas. O firmamento desses poderes fez com que o sistema de governo francês tornasse um híbrido entre parlamentarismo e presidencialismo.

Já no que diz respeito ao modelo semipresidencialista português, concebido na década de 1970, uma importante dessemelhança pode ser facilmente notada. Isso porque, apesar de antever eleições gerais para a escolha do presidente — tal qual ocorre no modelo francês — o sistema português se diferencia do sistema francês por não atribuir à Presidência o exercício de competências executivas relevantes, de modo que o presidente eleito apresenta-se como figura politicamente neutra, que arbitra, intervém e aconselha.

Ambos os modelos possuem suas virtudes, e uma eventual adoção do sistema de governo semipresidencialista no Brasil aconselharia a análise dos modelos já empregados em outras democracias, bem como o estudo do cenário político brasileiro, para se avaliar o modelo ao qual o Brasil melhor se adaptaria.

A adequação de mecanismos presidencialistas e parlamentaristas permitiria uma relação mais harmoniosa e amoldável às vicissitudes das instabilidades políticas que acometem o país. Contudo, tais premissas somente são válidas se, concomitantemente, todo o sistema político brasileiro acompanhar essa superação.

Com efeito, o engajamento também na remodelação do sistema partidário e eleitoral brasileiro, por exemplo, seria fundamental. É necessário que haja uma reforma política integral que acompanhe essa sistemática, para que se supere por inteiro a crise política. Por óbvio, a pura adoção do sistema semipresidencialista não seria, se individualmente considerada, capaz de extirpar a crise político-institucional brasileira. No entanto, se combinada a outros elementos, a implementação da medida guiaria a construção de novas práticas institucionais aptas a amenizar alguns dos problemas estruturais apresentados pelo país.

O Brasil tem enfrentado inúmeras digressões no andamento de seu sistema político e isso parece ocorrer de maneira cíclica. As sucessivas crises políticas que se alastram parecem conferir a ideia de que a instabilidade é algo intrínseco ao nosso sistema de governo.

Contudo, é importante destacar que tais períodos tormentosos, ao passo que desgastam os pilares democráticos, também fazem emergir a necessidade de mudanças.


Dessa forma, a instabilidade se mostra como uma importante e necessária fase do desenvolvimento de qualquer sistema. As crises políticas demonstram que o bom funcionamento do governo está sendo solapado e evidenciam a necessidade de mudança. Não se trata de acreditar que a simples mudança do sistema irá solver a crise política hoje vivenciada, mas sim de buscar atrelar, junto às mudanças em todo o cenário político, um sistema que confira maior segurança e eficácia à democracia brasileira.

Para ordem econômica, o STF deve ser um tribunal de direita ou de esquerda?


Rodrigo de Oliveira Kaufmann

O turbilhão de eventos políticos que vem assolando o país nos últimos anos trouxe uma polarização ideológica entre grupos ou correntes de pensamento que tentam se localizar no espectro político: a “direita” que, grosso modo, abarcaria os pensamentos conservador e liberal; e a “esquerda” que — também de forma resumida — seriam os herdeiros do pensamento marxista.


Por óbvio, essa descrição simplória não tem o condão de amarrar — com clareza de limites — a complexidade do pensamento político, especialmente se colocado em perspectiva histórica. Esses rótulos, com o tempo, ganham novas significações e não se pode negar a simbiose entre eles. Há, porém, um critério de natureza econômica que, embora também problemático, parece ser hoje aceito razoavelmente: dizer que alguém é de “direita” — afastados os preconceitos e as provocações — costuma descrever um pensamento mais orientado às restrições de atuação do Estado e, portanto, à proposta de encolhimento do chamado “espaço público” de intervenção. O pensamento de “esquerda” — também sem considerar os exageros e as insinuações — costuma atestar alguém que, priorizando alcançar a justiça social, destaca a importância da ação do Estado e, portanto, a inevitabilidade de seu intervencionismo. As deformações dessa ação estatal na esfera privada são consideradas geralmente por essa linha de pensamento uma espécie de efeito colateral de um remédio essencial e inevitável.


É com base nessa específica abordagem que se propõe aqui pensar estruturalmente a atuação do STF em questões contratuais e econômicas. De maneira mais ampla, esse debate vem sendo travado sob inúmeras perspectivas especificamente jurídicas, muito embora o ângulo de análise não tivesse ajudado nessa rotulação. Vejam que ponderações na linha da defesa do ativismo judicial ou do neoconstitucionalismo poderiam significar uma leitura constitucional de “esquerda”, uma vez que prestigiam, na linha da proteção às minorias e ao combate à discriminação, uma atuação judicial mais incisiva, mais intromissiva no espaço de liberdade e autonomia do cidadão e da empresa. É o Poder Judiciário a afirmar, nas decisões que representam essa linha de pensamento, que o particular não pode fazer tudo o que acha que pode ou a responsabilizar o Estado legislador ou Estado Executor por omissões ou incompetência na defesa dos direitos fundamentais, especialmente quando falha em limitar a liberdade na esfera privada.


A famosa discussão em torno da eficácia horizontal dos direitos fundamentais (a chamada drittwirkung na Alemanha) revelava um pouco dessa polarização quando discutia a possibilidade de incidência direta de direitos fundamentais nas relações privadas e nos contratos, inclusive no próprio STF. O tema, entretanto, pode ser perfeitamente descrito de outra forma (talvez uma forma mais fiel e correta sob a perspectiva da teoria constitucional): é possível que direitos fundamentais ligados à justiça social (e que sugerem a intervenção estatal na seara econômica) se sobreponham, em tese, aos direitos fundamentais ligados à liberdade (que sugere a não intervenção do Estado)? Ou, é possível que o direito civil e o direito comercial sejam abstratamente rebaixados em sua importância, fragilizados recorrentemente pela relativização de sua aplicação como garantias da livre iniciativa?


Essa é uma pergunta que vem sendo respondida positivamente pelo STF, contando, para tanto, com certo consenso irrefletido da doutrina. Esse critério (justiça social X liberdade) é tão importante na forma como se analisa o STF que é com base nele que juristas e ministros julgam o nível de “progressismo” do Tribunal em suas diversas épocas.


Certamente, encontra-se, com certa dificuldade, julgamentos que objetivavam o prestígio e a proteção da autonomia privada no STF. Toma-se, nessa linha, o exemplo no pós-1988, (i) da ADI nº 2.290, um eloquente exemplo da defesa do comércio, sob a perspectiva do princípio da proporcionalidade; (ii) do RE nº 193.749 ao se reafirmar a livre iniciativa contra leis restritivas de instalação de farmácias; (iii) do RE nº 407.688 quando se definiu que ao fiador de contrato de locação não beneficiava a cláusula de proibição de penhora do bem de família; (iv) do HC nº 72.131 ao se afirmar que, na alienação fiduciária em garantia, vigorava a sanção da prisão civil; (v) da ADI 493 que, ao definir, o regime constitucional do princípio da proteção ao ato jurídico perfeito, afirmou não ser possível no Brasil qualquer tipo de retroatividade (certamente uma proteção poderosa do vínculo contratual contra a alteração do regime jurídico); (vi) da ADI nº 1946 que, embora não trate da livre iniciativa propriamente dita, demonstra uma compreensão raramente serena da forma como funciona a lógica econômica desse espaço de autonomia (ao decidir sobre a licença-gestante e o eventual tratamento discriminatório da iniciativa privada, concluindo pela assunção integral do custo previdenciário pelo Estado); dentre outros.


É certo, entretanto, mesmo na composição anterior do Tribunal, encontrar a defesa sólida da intervenção do Estado na seara privada-econômica em certos contextos, tal como se fez no famoso caso da ADI nº 319-QO.


Da mesma forma como se discute hoje a eficácia e utilidade da intervenção do Estado (especialmente diante dos resultados conquistados nos últimos anos), é também chegada a hora de reavaliar essa “premissa” que tem servido de base para a definição, inclusive, da própria pauta do STF. É discurso relativamente comum, mesmo entre Ministros, defender que a pauta “natural” do STF são os casos de direito de minorias, combate à discriminação e limitação da liberdade de empreender e de comerciar.


A jurisdição constitucional como “realizadora da justiça social” paga um preço bastante caro e que até hoje era pouco percebido. Na medida em que o Estado é vista como protagonista de todas as atividades, como garante exclusivo da realização de todos os direitos fundamentais, estrangula-se a iniciativa privada e se reduz à filigrana princípios constitucionais como a livre iniciativa, a livre concorrência e a autonomia negocial, valores essenciais da ordem econômica (art. 170 da CF).


São raras as manifestações do STF em que a interpretação constitucional se orienta para a proteção da esfera privada nesse contexto e baseada em uma premissa de “self-restraint”. Nesse sentido, o ativismo judicial não apenas é perigoso sob a perspectiva política (da separação dos poderes), mas principalmente na dimensão econômica e social, quando parte do pressuposto de que o empresário, o produtor, o comerciante, o profissional liberal e o empreendedor formam uma classe suspeita e perigosa que precisa ser fiscalizada e controlada pelo Estado e que sua autonomia deve ser mínima. Esse estrangulamento da iniciativa privada — baseado, vale dizer, em puro preconceito ou visão distorcida —, além de matar a única força produtiva e autônoma do país, acaba por criar uma imagem equivocada do próprio STF que, nesse contexto, se resume a um papel de “Robin Hood” consistente em redistribuir a riqueza por meio da ação confiscatória do Estado-juiz. O século XX, entretanto, foi a prova viva da falência desse projeto.


Para um país que precisa se desenvolver economicamente (de forma a garantir a criação de mais riqueza), o que se precisa, para um novo paradigma da jurisdição constitucional, não é a criação de novos formatos de intervenção do Estado (o que serviu enormemente para a injustificada “inflação dos direitos”), mas sim, como podemos limitar a ação do Estado conservando a consistência de nossa liberdade responsável. Como já defendido por Dworkin, “direitos são trunfos”, e, por isso, — digo eu - não são eles que alicerçam o Estado Democrático de Direito. Essa idéia fundante está baseada, em realidade, na noção de obrigação e responsabilidade do cidadão, no dever recíproco de todos de respeitar as liberdades fundamentais, de conviver e de compartilhar interesses e espaços de ação autônoma.


Essa proposta de maior proteção à liberdade de empreender e de maior prestígio da livre iniciativa denuncia duas enormes contradições que nosso atual modelo de jurisdição constitucional “de esquerda” no Brasil está a patrocinar: em primeiro lugar, esse modelo indica um caminho diametralmente oposto à idéia original e histórica de direitos humanos que eram considerados verdadeiros “pontos de resistência” contra a ação e gigantismo do Estado (o discurso dos direitos humanos promovendo exatamente esse crescimento do Estado é um contrassenso perverso); e, em segundo lugar, os direitos humanos que deveria ancorar posições para a realização de uma política republicana pacífica, passaram a servir como verdadeiras “declarações de guerra” entre “minoria” e “maioria” ou entre “excluídos” e “incluídos”, grupos esses que, várias vezes, são criados artificialmente para sustentar esse discurso da inevitabilidade da ação e do controle do Estado.



A jurisdição constitucional no Brasil, para servir como pedra angular de um regime verdadeiramente democrático e republicano, deve, portanto, reescrever o seu papel, valorizando mais o cidadão, suas responsabilidades e a esfera privada (onde sua individualidade se realiza) e menos o Estado e suas prerrogativas de intervenção.