“Se tomaremos a decisão por mais Estado ou menos Estado, resta claro que ele permanecerá lá, ainda firme. Não alcançaremos o status de Anarquia. Precisamos, todavia, aumentar sua capacidade de transparência e sua eficiência”
VINÍCIUS SOUSA
As reformas política, trabalhista e previdenciária em
tramitação na Câmara dos Deputados mostram que é inadiável o debate sobre qual
deve ser o tamanho do Estado brasileiro. Se no período de bonança não paramos
para discutir qual nível de participação do Estado queremos enquanto sociedade,
esse debate precisa acontecer agora, no momento da crise. Nós, cidadãos,
estamos reféns de um Estado visto como ineficiente e corrupto, em todos os
sentidos e ideologias. Isso não pode continuar assim por muito tempo.
É inegável que a constituição brasileira sofreu influências
dos modelos social-democrata e do Estado de Bem-Estar Social, muito comuns
entre os países europeus à época da sua proclamação. Estas concepções
políticas, que priorizam a distribuição mais equitativa das riquezas geradas
pela sociedade e o estabelecimento de mecanismos de proteção social,
respectivamente, foram importantes para a formação do quadro de políticas
públicas hoje existentes e para o nível de garantias e direitos estabelecidos
na Carta Magna.
Não obstante, tais modelos se concretizaram no período da
redemocratização brasileira, no final da década de 80, vindos de contextos de
crise, haja vista estarem sob constantes críticas por conta do aumento no nível
de desemprego nos países.
Como exemplo, o famoso informe da Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) de 1981, diagnosticava que o
Estado de Bem-Estar Social estaria em crise após seus “30 anos gloriosos”
(1945-1975). A justificativa se baseia na lógica de que o aumento do desemprego
acarreta impactos negativos nas finanças do Estado, pois este estaria impelido
a repassar o seguro-desemprego ao passo que o nível de contribuição estaria em
queda.
Isso talvez diga muito sobre o que percebemos do nosso texto
constitucional, tendo em vista a diminuição da sua capacidade de ser exequível
diante da situação crítica do país, com quase 13 milhões de desempregados e
deficit primário, dos últimos 12 meses, correspondendo a quase 2,5% do PIB.
Ademais, a alta taxa de endividamento mostra que precisamos
repensar a lógica dos gastos do Estado. Quais devem ser as prioridades do
“Estado empresário”? Em que agendas o Estado deve priorizar o investimento e a
participação? Quais são os limites do “Estado fiscal”? Qual o nível de
contribuição tributária é suficiente para regular a relação Estado-Sociedade?
Estas perguntas precisam, com urgência, fazer parte da realidade dos cidadãos,
para que possamos, conjuntamente, melhorar a máquina estatal.
Exemplo dessa urgência foi a operação deflagrada pela
polícia federal na semana passada. Denominada de Operação Bullish, ela
investiga possíveis fraudes e irregularidades na concessão de aportes
financeiros do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)
para a JBS, um dos maiores frigoríficos do Brasil e do mundo.
Esta operação apenas evidencia o que já se desconfiava, não
apenas em relação a este frigorífico, mas entre outros empreendimentos brasileiros
de grande porte: há a presença elevada e desnecessária de subsídios e
empréstimos de origem estatal.
Pesquisadores, como os economistas Sérgio Lazzarini e
Alexandre Schwartsman, não veem grandes justificativas para tal atuação
estatal, que mais se assemelha a uma versão do “Bolsa família”, o “Bolsa
Empresário”.
Eles atestam que empreendimentos semelhantes à JBS possuem
pouco impacto no desenvolvimento industrial do país e conseguiriam empréstimos
financeiros equivalentes na iniciativa privada – contando, contudo, com menos
benesses, como juros menores e maiores prazos para a quitação do débito.
Nos resta, porém, nos indignarmos com esta realidade e
reivindicarmos maior accountabillity das operações do BNDES, assim como o uso
dos empréstimos como investimentos em empreendimentos que realmente necessitem
do aporte financeiro de origem estatal.
Neste mesmo jornal, Andre Rafael, co-idealizador do Projeto
Brasil 2030, nos alerta que muitos dos problemas no modelo de financiamento do
Estado brasileiro são decorrentes da inexistência de esforço consistente e
contínuo de tornar a Constituição plenamente exequível.
Se não houver esta revisão do texto constitucional, seus
direitos e garantias, podemos ver se concretizar a visão do Estado mínimo, ao
qual André avalia que isso poderá surgir não pela crença da sociedade nos
princípios liberais, mas pela necessidade de ter o mercado como alternativa ao
Estado e sua dificuldade em fomentar políticas públicas que correspondam ao
interesse dos cidadãos.
Se tomaremos a decisão por mais Estado ou menos Estado,
resta claro que ele permanecerá lá, ainda firme. Não alcançaremos – seguramente
não nos próximos anos – o status de Anarquia.
Precisamos, todavia, aumentar sua capacidade de transparência e sua eficiência. Como disse José Murilo de Carvalho, em seu livro Cidadania no Brasil: o longo caminho, “os progressos feitos são inegáveis, mas foram lentos e não escondem o longo caminho que ainda falta percorrer”.
Precisamos, todavia, aumentar sua capacidade de transparência e sua eficiência. Como disse José Murilo de Carvalho, em seu livro Cidadania no Brasil: o longo caminho, “os progressos feitos são inegáveis, mas foram lentos e não escondem o longo caminho que ainda falta percorrer”.
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