"Nós, os monarcas, somos incontestavelmente constantes em um mundo em constante transformação. Pelo motivo de termos estado sempre aqui, mas também por não nos envolvermos na política cotidiana. Estamos informados das mudanças políticas que acontecem em nossas sociedades, mas não fazemos comentários sobre isso. É nisso que assumimos uma posição única. Nenhum dos outros monarcas europeus interfere na política."

Margarethe II, Rainha da Dinamarca

domingo, 28 de novembro de 2010

Gazeta da Tarde, 15 de novembro de 1889.



"A partir de hoje, 15 de novembro de 1889, o Brasil entra em nova fase, pois pode-se considerar finda a Monarquia, passando a regime francamente democrático com todas as consequências da Liberdade.


Foi o exército quem operou esta magna transformação; assim como a de 7 de abril de 31 ele firmou a Monarquia constitucional acabando com o despotismo do Primeiro Imperador, hoje proclamou, no meio da maior tranqüilidade e com solenidade realmente imponente, que queria outra forma de governo.


Assim desaparece a única Monarquia que existia na América e, fazendo votos para que o novo regime encaminhe a nossa pátria a seus grandes destinos, esperamos que os vencedores saberão legitimar a posse do poder com o selo da moderação, benignidade e justiça, impedindo qualquer violência contra os vencidos e mostrando que a força bem se concilia com a moderação. 


Viva o Brasil! 


Viva a Democracia! 


Viva a Liberdade!" 

POR QUE A MONARQUIA FOI DERRUBADA SEM QUE NINGUÉM PEGASSE EM ARMAS PARA DEFENDÊ-LA?


Troca simples de poder, ou movimento ideológico? Será que o Brasil estava preparado para ser República? Afinal, que fatos levaram à queda da Monarquia?
A Professora Emília Viotti da Costa, referência na historiografia brasileira, autora de livros como A Abolição; Coroas de Glória, Lágrimas de Sangue;Da Monarquia à República - Momentos Decisivos, costuma resgatar em seus artigos e pesquisas a memória e os discursos que ficaram à margem da sociedade.
Confira abaixo o que ela pensa sobre os acontecimentos que levaram à Proclamação da República:
"A Proclamação da República não resultou de uma revolução, mas de um golpe militar. Isso não quer dizer que não tenha havido um conteúdo ideológico no golpe. Este, no entanto, foi produto da ação de homens pertencentes às classes média e alta, pequenos comerciantes, advogados, jornalistas, professores, médicos, alguns fazendeiros progressistas e oficias do Exército que adotaram idéias republicanas, filiaram -se ao partido republicano e empenharam-se desde sua fundação, nos anos 70, em fazer críticas à Monarquia e propor em seu lugar um regime republicano. Apesar dos seus esforços, no entanto, a República resultou não de um movimento popular, mas de uma conspiração entre uma minoria de republicanos civis e militares.
Para se entender as razões que moveram esse punhado de homens a derrubar a Monarquia não basta referirmos a suas idéias republicanas. É preciso explicar por que essas idéias, presentes no Brasil antes mesmo da Independência, só então se concretizaram. Por que a Monarquia foi derrubada sem que ninguém pegasse em armas para defendê-la? As respostas a essas questões encontram-se na falta de flexibilidade e adaptabilidade do sistema político existente em face das mudanças profundas que ocorreram no país no decorrer do século XIX e o desgaste da Monarquia.
A Monarquia sempre fora uma anomalia na América. Todos os demais países adotaram o regime republicano por ocasião da Independência. Circunstâncias históricas excepcionais: a invasão de Portugal pelas tropas napoleônicas e a transferência da Corte portuguesa para o Brasil em 18O8, a Revolução Constitucionalista do Porto, anos mais tarde, forçando a volta de D. João VI a Portugal, ficando em seu lugar o Príncipe D. Pedro fizeram com que o Brasil seguisse um caminho diverso dos demais países da América. Embora houvesse republicanos no Brasil, como demonstravam os movimentos em prol da Independência tais como a Inconfidência Mineira, a Revolução de 1817, e as sublevações que ocorreram mais tarde durante o período regencial, os monarquistas levaram a melhor e, com a ajuda do príncipe regente, instituíram o regime monárquico, que duraria até 1889.
Quando Pedro I renunciou à coroa e deixou o filho de cinco anos como seu sucessor, os políticos de então tiveram a oportunidade de estabelecer uma república, mas preferiram manter a Monarquia e governar em nome do jovem imperador. Quando este chegou aos 14 anos, no entanto, apressaram-se em conceder-lhe prematuramente maioridade, na expectativa de que sua presença na chefia do estado viesse a pôr fim à instabilidade política que existia no país. A partir de então, Pedro II tornou-se Imperador, embora o clima de insatisfação e faccionalismo continuasse. Somente a partir de 1848, com a derrota dos praieiros, a Monarquia se consolidou no país.
Criou-se um regime altamente centralizado, elitista, e oligárquico, um sistema bicameral, com um senado vitalício e uma câmara renovável periodicamente. O regime era pouco representativo. Apenas uma minoria possuía o direito de voto. Ficaram excluídos os escravos, as mulheres e a maioria dos trabalhadores e todos os que não possuíam renda mínima estabelecida por lei. As eleições eram indiretas, isto é, os votantes qualificados como tal escolhiam os eleitores e estes votavam nos candidatos. O resultado é que durante todo o Império o corpo eleitoral correspondia a uma porcentagem mínima da população. Além disso, a fraude eleitoral era generalizada. Pela carta constitucional outorgada por Pedro I após a dissolução da Assembléia Constituinte, o Imperador possuía o Poder Executivo e o Poder Moderador que além de outras atribuições permitia a ele interferir no Poder Legislativo, dissolvendo a câmara e convocando novas eleições. Dois partidos: o conservador e o liberal alternavam-se no poder, dependendo dos resultados eleitorais. Entretanto, quando o Imperador usava do Poder Moderador convocando novas eleições e estas resultavam na queda do partido que estava no poder e na vitória da oposição, os primeiros queixavam-se da interferência do Imperador. Através desse processo o Imperador atraiu muitos inimigos e a Monarquia desmoralizou-se.
A existência de um Conselho de Estado também vitalício e nomeado pelo imperador, com o objetivo de assessorá-lo em questões vitais para a nação, também criou resistências. Dessa forma, a organização política vigente no Império levava a um desgaste inevitável do imperador e da Monarquia. Já nos fins da década de 70 começaram os ataques ao regime e o partido republicano foi criado.
A Guerra com o Paraguai contribuiu ainda mais para desgastar o governo e irritar as forças armadas, que sofreram sérias perdas, sentiram o seu despreparo e se ressentiram da interferência dos políticos civis. O positivismo e o republicanismo cresceram entre os militares. Ao mesmo tempo, a interferência do governo na vida eclesiástica e religiosa, em virtude do direito que lhe fora conferido pela constituição, fez multiplicar os conflitos com a Igreja, base natural da Monarquia. Ao mesmo tempo, levas de imigrantes protestantes que chegavam ao país constituíam um desafio aos privilégios da Igreja Católica que até então monopolizava a educação, presidia os casamentos e controlava os cemitérios. Crescia o número daqueles que desejavam a separação entre Igreja e Estado. O número de descontentes aumentava.
O desenvolvimento econômico do país criava novas oportunidades de investimento na construção de estradas de ferro, nas indústrias, no comércio interno, no sistema bancário, nas companhias de seguros. No entanto, apesar das reformas eleitorais, a fraude eleitoral e a falta de representatividade continuavam. Estas somadas à vitaliciedade do Senado e ao Conselho de Estado garantiam a sobrevivência das oligarquias tradicionais dificultando a renovação dos grupos dominantes mantendo marginalizada a maioria das classes subalternas. O desequilíbrio entre o poder econômico e político e os conflitos de interesse entre as províncias alimentava o número dos que condenavam a excessiva centralização e almejavam a federação.
Foi dentro desse clima de descontentamento crescente que o movimento abolicionista e as idéias republicanas ganharam expressão política. Conquistada a abolição só restava dar o golpe final à Monarquia, que se revelou incapaz de realizar as reformas almejadas.
Proclamada a República aboliu-se a vitaliciedade do senado, eliminou-se o Conselho de Estado, decretou-se a separação da Igreja e do Estado, adotou-se o regime federativo e instituiu-se o sufrágio universal, excluindo, no entanto, as mulheres do direito de voto. Aboliram-se os títulos de nobreza. A família real foi exilada.
A fraude eleitoral e o domínio das oligarquias persistiram. Para muitos a República foi um desapontamento. "Essa não era a república de meus sonhos", expressão atribuída a um republicano, simboliza a situação em que se acharam todos aqueles que almejavam uma República mais inclusiva e democrática."
por: Emília Viotti da Costa

sábado, 27 de novembro de 2010

Privilégios dos Ex-Presidentes da República...


Presidência da República 
Casa Civil  Subchefia para Assuntos Jurídicos




DECRETO Nº 6.381, DE 27 DE FEVEREIRO DE 2008.

Regulamenta a Lei no 7.474, de 8 de maio de 1986, que dispõe sobre medidas de segurança aos ex-Presidentes da República, e dá outras providências.


O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto na Lei no 7.474, de 8 de maio de 1986,


DECRETA:


Art. 1o Findo o mandato do Presidente da República, quem o houver exercido, em caráter permanente, terá direito:


I - aos serviços de quatro servidores para atividades de segurança e apoio pessoal;


II - a dois veículos oficiais, com os respectivos motoristas; e


III - ao assessoramento de dois servidores ocupantes de cargos em comissão do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores - DAS, nível 5.


Art. 2o Os servidores e motoristas a que se refere o art. 1o serão de livre escolha do ex-Presidente da República e nomeados para cargo em comissão destinado ao apoio a ex-Presidentes da República, integrante do quadro dos cargos em comissão e das funções gratificadas da Casa Civil da Presidência da República.


Art. 3o Para atendimento do disposto no art. 1o, a Secretaria de Administração da Casa Civil da Presidência da República poderá dispor, para cada ex-Presidente, de até oito cargos em comissãodo Grupo-Direção e Assessoramento Superiores - DAS, sendo dois DAS 102.5, dois DAS 102.4, dois DAS 102.2 e dois DAS 102.1.


Art. 4o Os servidores em atividade de segurança e os motoristas de que trata o art. 1o receberão treinamento para se capacitar, respectivamente, para o exercício da função de segurança pessoal e de condutor de veículo de segurança, pelo Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.


Art. 5o Os servidores em atividade de segurança e os motoristas aprovados no treinamento de capacitação na forma do art. 4o, enquanto estiverem em exercício nos respectivos cargos em comissão da Casa Civil, ficarão vinculados tecnicamente ao Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional, sendo considerados, para os fins do art. 6o, inciso V, segunda parte, da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003, agentes daquele Departamento.


Art. 6o Aos servidores de que trata o art. 5o poderá ser disponibilizado, por solicitação do ex-Presidente ou seu representante, porte de arma institucional do Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional, desde que cumpridos os seguintes requisitos, além daqueles previstos na Lei no 10.826, de 2003, em seu regulamento e em portaria do Ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional:


I - avaliação que ateste a capacidade técnica e aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, a ser realizada pelo Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional;


II - observância dos procedimentos relativos às condições para a utilização da arma institucional, estabelecidos em ato normativo interno do Gabinete de Segurança Institucional; e


III - que se tratem de pessoas originárias das situações previstas noart. 6o, incisos III e V, da Lei no 10.826, de 2003.


Parágrafo único. O porte de arma institucional de que trata o caput terá prazo de validade determinado e, para sua renovação, deverá ser realizada novamente a avaliação de que trata o inciso I do caput, nos termos de portaria do Ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional.


Art. 7o Durante os períodos de treinamento e avaliação de que tratam os arts. 4o e 6o, o servidor em atividade de segurança e motorista de ex-Presidente poderá ser substituído temporariamente, mediante solicitação do ex-Presidente ou seu representante, por agente de segurança do Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional.


Art. 8o O planejamento, a coordenação, o controle e o zelo pela segurança patrimonial e pessoal de ex-Presidente caberá aos servidores de que trata o art. 1o, conforme estrutura e organização própria estabelecida.


Art. 9o A execução dos atos administrativos internos relacionados com a gestão dos servidores de que trata o art. 1o e a disponibilidade de dois veículos para o ex-Presidente serão praticadas pela Casa Civil, que arcará com as despesas decorrentes.


Art. 10. Os candidatos à Presidência da República terão direito a segurança pessoal, exercida por agentes da Polícia Federal, a partir da homologação da respectiva candidatura em convenção partidária.


Art. 11. O Ministro de Estado da Justiça, no que diz respeito ao art. 10, o Ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional, no que concerne aos arts. 4o, 5o, 6o e 7o, e o Secretário de Administração da Casa Civil, quanto ao disposto nos arts. 2o e 9o, baixarão as instruções e os atos necessários à execução do disposto neste Decreto.


Art. 12. Este Decreto entra em vigor na data da sua publicação.





Brasília, 27 de fevereiro de 2008; 187o da Independência e 120o da República.



LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA


Tarso Genro


Jorge Armando Felix



Este texto não substitui o publicado no DOU de 28.2.2008

Dragões da Independência

O Regimento de Cavalaria de Guardas foi criado pelo Príncipe Regente Dom João, em 13 de maio de 1808, para guarnecer a sede do governo que estava sendo instalado no Rio de Janeiro, em conseqüência da invasão francesa em Portugal.

A história do Regimento Dragões da Independência está ligada ao desenvolvimento do Brasil e, em todas as ações em que esteve empenhado, a bravura, a destreza e a disciplina foram apanágios dos militares que ombrearam nas fileiras da tropa formada. Durante a Colônia, o Reino Unido, o Império e a República, o Regimento desempenhou papel operacional relevante em várias missões, em diversos pontos do território brasileiro.

Dentre as participações na história do País, a unidade esteve presente na proclamação da Independência do Brasil, em 7 de setembro de 1822, por meio dos elementos da Imperial Guarda de Honra do Príncipe D. Pedro - tropa que formou o atual 1º Regimento de Cavalaria de Guardas. Na Proclamação da República, o Marechal Deodoro da Fonseca montou num corcel baio, cedido por um membro dessa unidade.

Em 1º de janeiro de 1968, a responsabilidade de trazer para o Planalto Central a sede dos "Dragões" coube ao Cel. João Batista de Oliveira Figueiredo, Comandante do Regimento. Em Brasília, a unidade é responsável, juntamente com o Batalhão da Guarda Presidencial, pela proteção do Palácio da Alvorada, do Palácio do Planalto, do Palácio do Jaburu e da Residência Oficial da Granja do Torto, bem como pela realização do cerimonial militar da Presidência da República.

A farda característica dos Dragões da Independência, que traz brilho e garbo para as atividades de cerimonial da Presidência, foi concebido pelo pintor francês Jean Baptiste Debret, durante a missão artística francesa no Brasil, em 1816. 


O fardamento homenageia a Imperatriz Maria Leopoldina, Arquiduquesa d' Áustria, e tem inspiração na tropa de Cavalaria de Dragões daquele Império. Originalmente metálico, o capacete é dourado e escamado, possui um dragão heráldico do brasão da Casa de Bragança, escorrendo farta crina por entre as asas abertas emolduradas. Atualmente, a cor do penacho obedece ao seguinte padrão: o branco, de uso exclusivo do Comandante do Regimento, o amarelo, para os oficiais, o vermelho, para os praças e o verde, para a Fanfarra.

O Regimento é formado pelos 1º e 2º Esquadrões de Dragões, cujas incumbências são a escolta a cavalo de autoridades, a apresentação do Carrossel Militar e o desfile alusivo à Independência do Brasil, pelo Esquadrão de Cerimonial, empregado em solenidades especiais, na qual se destacam a posse do Presidente da República, a entrega de credenciais aos Embaixadores e a recepção de Chefes de Estado estrangeiros em visita ao Brasil e pelo Esquadrão de Choque, para a garantia da lei e da ordem no âmbito de sua competência.

Além desses, há, ainda, o Centro Hípico Dragões da Independência que é responsável pelos esportes eqüestres no âmbito da Capital Federal, o Esquadrão de Comando e Apoio, cujo mister é a prestação de suporte logístico e operacional aos demais esquadrões, e a Fanfarra que se exibe em todas as solenidades que envolvam o cerimonial militar representativo do País.

A interação com a comunidade ocorre por meio de atividades de alcance social como a eqüoterapia, a equitação recreativa e competições hípicas diversas, momento em que o quartel abre suas portas para representantes de outras regiões do Brasil e do exterior.

domingo, 21 de novembro de 2010

Consciência Negra e o racismo brasileiro

Cada ano, em novembro, crescem em todo o Brasil as comemorações ligadas ao Dia da união e consciência negra. Desde alguns anos, a data do martírio do Zumbi dos Palmares se integra no calendário nacional. Até alguns anos, poucos livros de história do Brasil contavam que, em 1695, senhores de engenho, bandeirantes vindos de São Paulo e militares de Pernambuco invadiram o Quilombo dos Palmares, no alto da Serra da Barriga, hoje Alagoas, onde viviam pacificamente mais de 30 mil pessoas, negras, índias e brancas, em uma sociedade livre e mais igualitária. 


Os invasores, com respaldo da sociedade e da Igreja, mataram milhares de homens, mulheres e crianças. O líder Zumbi dos Palmares, traído por um companheiro, preferiu entregar-se aos inimigos para evitar um massacre maior. No dia 20 de novembro de 1765, foi fuzilado e teve seu corpo esquartejado em uma praça do Recife. Até hoje, na comunidade de Muquém (AL), sobrevivem do artesanato de argila descendentes de alguns sobreviventes do massacre.

Mais de 300 anos depois, as comunidades negras e os quilombos são exemplos de resistência cultural e social do povo negro em meio ao conjunto da sociedade brasileira, ainda injusta e discriminadora. Conforme o censo mais recente, 44% da população brasileira é afro-descendente, mas só 5% das pessoas se declaram negras. Estes dados se tornam mais ainda espantosos quando sabemos que, da população brasileira mais empobrecida, 64% são pessoas negras.

Não basta a lei

A lei proíbe o racismo, mas mantém estruturas sociais e econômicas que o alimentam. Pode evitar que um viole o direito do outro, mas não tem como levar brancos e negros a se amarem e menos ainda como ajudar cada pessoa a se sentir bem em sua pele e em sua identidade cultural.

A violência nas cidades da França é conseqüência terrível e nefasta da forma desumana com a qual a sociedade francesa, tão racista quanto a norte-americana, trata os migrantes, principalmente negros, vindos de países que a França, a Inglaterra e a Bélgica saquearam durante séculos para construir a riqueza que, hoje, ostentam. Como superar esta espiral da violência?

No Brasil, os dados oficiais mostram que as desigualdades sociais são mais profundas à medida que as pessoas pobres não só são empobrecidas, mas são negras. O Brasil branco é 2,5 vezes mais rico que o Brasil negro. Nos últimos anos, as diferenças entre negros e brancos vêm se mantendo. Na educação, um branco de 25 anos tem, em média, mais do que o dobro de anos de estudo do que um negro da mesma idade.

Os governos têm procurado solucionar esta desigualdade através de medidas que continuam compensatórias e provisórias, já que a solução mais profunda exige um processo de reestruturação da sociedade, que é lento e muito exigente. Entretanto, para quem vive a dor da exclusão social, é melhor contar com essas medidas do que viver no desamparo como, durante a história, tem sido, muitas vezes, o destino dos mais pobres.

Sistema meritocrático

O chamado sistema de cotas, adotado por algumas poucas instituições públicas, continua provocando polêmica. Para concursos públicos e universidades, existem cotas para mulheres, deficientes físicos e, mais recentemente, para afro-descendentes e indígenas. As cotas dadas a afro-descendentes e índios circunscrevem-se apenas ao modo de entrar na universidade. Muitos se opõem ao sistema de cotas, argumentando com o critério do mérito para os que obtêm melhores resultados no vestibular, independente de quaisquer outros critérios. 

Alguém já denominou de meritocracia o governo dos mais capazes. De acordo com este critério, entra na universidade quem, nas provas do vestibular, consegue provar ser melhor que os outros. Todos que acompanham as lutas dos jovens para ser aprovados em vestibular sabem que a aprovação depende de fatores que não são apenas intelectuais. 


Na maioria dos casos, rapazes e moças que obtêm aprovação nos melhores cursos são os que vêm de escolas privadas de elite e dos cursinhos aos quais nenhum pobre pode pagar. Portanto, o tal mérito gruda na pele e na alma de cada estudante aprovado/a o carimbo de sua classe social, a cor da sua pele e o preço que pode pagar.

Em uma sociedade na qual a competição entre as pessoas é norma vigente, é compreensível que se ache justo o sistema meritocrático. No mundo antigo, Aristóteles já dizia que tratar de modo igual a pessoas que são desiguais seria a mais profunda injustiça. Fazer de conta que a desigualdade não existe e tratar uma pessoa vítima da exclusão social com o mesmo tratamento e condições que tem o privilegiado só reforça a desigualdade.

É claro que somente o sistema de cotas não resolverá a desigualdade social ou racial. Mas, se além das cotas, a universidade garante um acompanhamento especial e o sistema de cotas é integrado a critérios de justiça para evitar abusos, pode ser importante instrumento de integração social. Não se trata de formar maus profissionais ou doutores medíocres apenas para se ter índios ou negros diplomados. 


Abrir a universidade e outros espaços da vida social a todos os brasileiros exige não só garantir uma vaga na instituição, mas dar um acompanhamento direto e investir nesta integração.

Um exemplo

A PUC de São Paulo, desde alguns anos, estabeleceu um convênio com comunidades indígenas e recebe, anualmente, vinte alunos e alunas índios/as para os mais diversos cursos oferecidos pela Universidade. Eles entram na universidade sem vestibular e com acompanhamento especial, direto e contínuo. Este conhecimento universitário e acadêmico, posto a serviço das comunidades indígenas que são as mais empobrecidas do país, tem representado uma ajuda imensa à caminhada indígena e enobrece a todos os brasileiros.

No centro de São Paulo, funciona atualmente a Faculdade Zumbi dos Palmares, com cursos de administração oferecidos, especialmente, a pessoas afro-descendentes. De acordo com dados oficiais, entre os 3,5 milhões de universitários/as brasileiros/as, os negros já constituem quase um milhão. Segundo o IBGE, no ensino fundamental são 45%. É uma realidade diferente e bem melhor do que há poucos anos, quando a proporção era escandalosamente maior.

Daqui a pouco, não acontecerá mais o que me contava um amigo pastor. Ao visitar uma grande empresa nacional, foi convidado ao escritório do diretor-presidente. Quando entrou naquela sala luxuosa e viu do outro lado da mesa não um senhor louro de paletó e gravata, mas uma moça negra e jovem, levou um choque. A sociedade inteira precisa deste choque de amor e justiça. Dom Pedro Casaldáliga diz: “a solidariedade é o novo nome da sociedade humana: a ternura dos povos”.


Marcelo Barros,
monge beneditino, escritor. Goiânia, GO.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

DOM PEDRO I, LIBERTADOR DA NAÇÃO

A personalidade de D. Pedro I nas vias da Independência.

Quando veio ter a D. Pedro o decreto das Cortes portuguesas, ordenando-lhe o imediato regresso à pátria, a conspiração pela independência já estava feita. O resultado, logo o tivemos a 9 de janeiro de 1822:

— Se é para bem de todos e felicidade geral da Nação, diga ao povo que fico.

Estava começada a luta. Daí por diante, o Príncipe é de uma vigilância, de uma atividade, de uma decisão que nada consegue abater. D. Pedro tinha a atração dos perigos. Resolvido a adotar a causa brasileira, perdeu todas as vacilações que antes o prendiam nos seus movimentos. Seguiu o seu caminho resolutamente, impavidamente, até o desfecho de 7 de setembro.

A atitude das Cortes de Lisboa em relação ao Brasil havia congregado os patriotas, deliberados a emancipar a antiga colônia com ou sem o auxílio do Príncipe Regente. As combinações para isso marchavam céleres, multiplicando-se os emissários especiais entre São Paulo e Rio, estabelecendo ligações para o grande movimento libertador.

Incumbido pelos patriotas do Rio de ir a São Paulo com uma mensagem verbal aos conspiradores, o capitão Pedro Dias Pais Leme, que foi mais tarde Marquês de Quixeramobim, entendeu que era seu dever, como amigo do Príncipe, passar na Quinta da Boa Vista e narrar-lhe o que se tramava.

D. Pedro ouviu com calma a narrativa, e ao fim, em vez de agradecer-lhe ou dar-lhe qualquer ordem, pôs-se a falar de viagens e caçadas. Até que, a certa altura, chegando à janela, começou a olhar o horizonte, no rumo do Sul. E apontando-o a Pais Leme, disse:

— Que belo dia para se viajar!

O oficial compreendeu tudo. Beijou, comovido, a mão do Príncipe, desceu rapidamente as escadas, montou a cavalo, e partiu a galope.

Dentre as influências que recebeu D. Pedro I, conduzindo-o a proclamar a Independência, destaca-se a da Imperatriz. A convivência diária com D. Leopoldina ampliava muito o horizonte de D. Pedro I, que escutava atento, com interesse, o que ela contava de sua terra natal, da corte vienense, de Napoleão, da política e história européias, dos monarcas no Velho Mundo, etc. 


A cultura de D. Leopoldina impressionava D. Pedro. Era o meio que lhe garantira, após conquistar a confiança do marido, uma ascendência crescente sobre o seu irrequieto espírito. Para o bem da verdade histórica, convém frisar que D. Pedro, apesar da pouca instrução, não ficava alheio aos assuntos científicos e intelectuais.


D. Pedro I e o senso da oportunidade na política.
O Brasil havia vencido a guerra da Independência, mas faltava Portugal reconhecê-la oficialmente. Travou-se então uma batalha diplomática, na qual a Inglaterra, maior potência de então, entrava como fiel da balança, e também impondo seus interesses. Para reconhecer a independência, a Inglaterra exigia que o Brasil lhe pagasse 1,4 milhão de libras esterlinas devidas por Portugal, e mais 600 mil libras de indenização a Portugal, além de um contrato comercial vantajoso. 


D. Pedro I reuniu o Conselho de Ministros, presidido pelo Visconde de Barbacena, e transmitiu a proposta. O ministro da Guerra objetou:

— Mas é um recuo, Majestade! Depois da luta, depois de vencidos todos os estorvos, e já senhores do País, vamos nós agora voltar para trás? Vamos pagar, em dinheiro, o que já conquistamos com sangue? Por quê? Não há motivo que justifique.

— Neste caso, Senhor Ministro, a Inglaterra intervém a favor de Portugal.

— E que mal há nisto, Majestade? Se a Inglaterra intervier, nós enfrentaremos a Inglaterra. Nós nos bateremos até a última gota de sangue.

— Mas enfrentar com o quê, Senhor Ministro? Nós não temos nada. Enfrentar com o que?

— Enfrentar de qualquer jeito, Majestade.

D. Pedro ficou furioso. Viu nitidamente que o espírito brasileiro não admitia acordos. Se entre os próprios ministros havia aquela absurda atitude patrioteira, que barulhada não haviam de fomentar os deputados? 


À vista disso, D. Pedro resolveu o caso temerariamente. Assinou dois tratados. Um ostensivo, público, pelo qual D. João VI reconhecia simplesmente a independência do Brasil. Mas assinou também outro, secreto, pelo qual o Brasil se obrigava a pagar 2 milhões de libras e a fazer com a Inglaterra novo tratado de comércio.

D. Pedro cumpriu a palavra. Pagou a dívida e assinou o tratado. O seu ato se ressente de uma ilegalidade clamorosa. Mas essa ilegalidade foi a mais abençoada das que praticou, pois permitiu-lhe alicerçar a sua grande obra. Evitou a guerra, serenou as agitações patrióticas, não se derramou mais uma gota de sangue. E criou afinal um império. O Brasil, como por encanto, apareceu como nação livre aos olhos do mundo, e isto se deveu à ousadia e temeridade do Imperador.

O major Luiz Alves de Lima e Silva, futuro Duque de Caxias, ofereceu a D. Pedro I, dias antes da abdicação deste em 7 de abril de 1831, os planos da reação contra as agitações que se avolumavam. O Imperador os recusou nos seguintes termos:

— O expediente proposto é digno do major Lima e Silva, mas não o aceito, porque não quero que por minha causa se derrame uma só gota de sangue brasileiro. Portanto, siga o major a sorte de seus camaradas reunidos no Campo de Santana.

No momento supremo da abdicação, quando era intimado a demitir o Ministério, D. Pedro I respondeu:

— Diga ao povo que recebi a representação. O Ministério passado não merece a minha confiança, e do atual farei o que entender. Sou constitucional, e caminho com a Constituição. Admitir o mesmo Ministério, de forma alguma. Isto seria contra a Constituição e contra a minha honra. Prefiro abdicar.

Foram os nossos dirigentes, depois de 15 de novembro de 1889, que implantaram o desrespeito à Constituição, e a infringiram tanto que acabaram reduzindo-a a um maço de papéis esfarrapados. Nenhum dos nossos presidentes da República teve o espírito constitucional de D. Pedro I ou de D. Pedro II, e foram eles que deram ao povo o exemplo de violar a Magna Carta do País.

Em 1831, se D. Pedro I desembainhasse sua invencível espada, a uma só palavra, a um só aceno seu, ondas de sangue tingiriam nossas praças, e as fúrias de uma indômita guerra civil invadiriam o Império inteiro, talvez por longos anos. 


A sua abdicação espontânea teve ainda a vantagem de arrancar o Brasil ao estigma de revolucionário. Foi a coroa devolvida na ordem da sucessão, segundo o direito fundamental, e por ato legal e voluntário do Imperante. Não houve combate, nem sangue nem resistência.

Testemunha ocular dos fatos afirma que durante os dias em que D. Pedro I esteve a bordo da nau inglesa, recebeu valiosíssimos oferecimentos de algumas das mais leais espadas. Agradecendo, pediu a todos que as reservassem para defesa do trono de seu filho, acrescentando:

— Desde que livremente abdiquei, o desembainhar a minha espada já não seria ato de rei, mas de rebelde.

O reinado de D. Pedro I figura, sem dúvida, como uma grande página da história nacional. A opinião de Armitage é expressiva: 


“Apesar de todos os erros do Imperador, durante os dez anos de sua administração o Brasil fez certamente mais progressos em inteligência do que nos três séculos decorridos do seu descobrimento à proclamação da Constituição Portuguesa de 1820”.

As fortunas não se originavam de favores recebidos da Coroa.


Eram a conseqüência do esforço hercúleo, do trabalho, do cultivo do solo e da conquista das florestas e das terras do interior. E por isso a sociedade, no tempo de D. Pedro I, foi honesta, sem venalidade.

Cenas da vida de D. Pedro I em família.

Naquela noite de 2 de dezembro de 1825, todo o Palácio de São Cristóvão estava ansioso e em grande expectativa. A Imperatriz Leopoldina ia dar à luz, e todos desejavam um príncipe, que seria o herdeiro da coroa. O Dr. Guimarães Peixoto saiu um pouco, para tranqüilizar a todos, e anunciou a D. Pedro:

— Tudo normal. Pode Vossa Majestade sossegar. Não há incidente nem complicação. Mais um pouquinho de paciência, e terá logo um novo príncipe nos braços.

— O seu palpite, doutor?

— Para mim, desta vez, é homem. Para mim, não resta dúvida. É príncipe.

— Príncipe?! Pois se for homem, meu caro doutor, pode pedir o que quiser, e lhe será concedido.

— Tenho a palavra de Vossa Majestade?

E voltou para os aposentos de D. Leopoldina. Algum tempo depois, sai o médico com brados de júbilo:

— É príncipe, Majestade! É príncipe!

Havia nascido D. Pedro II. O Dr. Guimarães Peixoto tinha a promessa de D. Pedro I. Podia pedir o que quisesse, mas foi muito modesto. Solicitou uma simples comenda para um filho. Fiel à palavra, o Imperador criou esse comendador de 6 anos de idade.

Chegando de uma viagem ao exterior, o Visconde de Barbacena foi ao Palácio de São Cristóvão visitar o Imperador. E um dos primeiros cuidados deste, com a amizade que votava ao discreto titular, foi mostrar-lhe o Príncipe Imperial, que seria Pedro II, e tinha apenas dois anos de idade:


— Este será bem educado, hás de ver. Eu e o mano Miguel havemos de ser os últimos malcriados da família.

D. Pedro I recebeu de Minas um belo cavalo, e resolveu dá-lo ao pai. Quando foi entregar o presente, D. João VI já havia sido prevenido pela maledicência dos adversários do Príncipe, que diziam que o cavalo era velhaco, e que o derrubaria na primeira ocasião. Disse então ao filho:

— Sim, Pedro. Já sei tudo. Queres dar-me um cavalo velhaco, que me derrube. Monta-o tu.

D. Pedro ofendeu-se. Montando o cavalo, gritou que ninguém mais o montaria, e saiu num galope furioso, até o arrebentar.

Depois da abdicação, e já a bordo da nau Warspite, que o levaria para a Europa, D. Pedro I escreveu ao seu filho D. Pedro II, que tinha apenas 6 anos: 


“Muito estimarei que esta o ache com saúde, e adiantado nos estudos. Sim, meu amado filho, isso é muito necessário, para que você possa fazer a felicidade do Brasil. 


Lembre-se sempre de seu pai, ame a sua e minha Pátria, siga os conselhos que lhe derem aqueles que cuidarem da sua educação, e conte que o mundo o há de admirar, e que eu me hei de encher de ufania por ter um filho digno da Pátria”.

Impetuoso e de bom coração, um Príncipe de medida incomum.

Deveria partir para o Sul um corpo de caçadores alemães, a fim de reforçar o exército brasileiro que lá batalhava sob as ordens do Marquês de Barbacena. D. Pedro I ordenara que o Tesouro efetuasse o pagamento dos soldos atrasados dos mercenários. 


À última hora, estando já o batalhão embarcado, foi D. Pedro avisado pelo oficial encarregado de recolher a quantia do Tesouro, que os funcionários não queriam fazer o tal pagamento. 


D. Pedro se encolerizou e dirigiu-se para o Tesouro, empunhando grossa chibata. Momentos depois fazia entrada impressionante na sala onde se achavam os funcionários responsáveis pelo não cumprimento da ordem imperial. Sobre esses, que se encolhiam temerosos, despejou o Soberano uma avalanche de censuras, seguida de golpes de chicote.

D. Pedro I passeava pelos arrabaldes do Rio, seguido por grande escolta, quando o cavalo que montava perdeu uma das ferraduras. Procurou o ferrador mais próximo e confiou-lhe o trabalho. Apenas esse começara o serviço, sentiu-se rudemente empurrado pelo Imperador, que lhe disse numa voz irritada:

— Sai daí, porcalhão, que não sabes o teu ofício.

E ele mesmo, o Imperador, em pouco tempo ferrou o animal.

Resolvida a morte de João Guilherme Ratcliff, por sua participação na Confederação do Equador, o presidente do tribunal que o julgou levou a D. Pedro I a sentença de morte, para assinatura. Era um documento longo, minucioso e violento, em que a vítima era tratada com insolência e desprezo. Devolvendo o papel, para o alterarem, rugiu:

— Não assino! Morra o homem, que é quanto basta, mas não o insultem numa sentença!

Passeando a cavalo, em companhia da Imperatriz, D. Pedro I deparou com três homens, um dos quais estava no chão, sem sentidos. Eram marinheiros americanos, cujo navio estava ancorado no Rio. Um deles fora atirado ao chão pelo cavalo, e os outros dois não sabiam o que fazer. O Imperador se aproximou, prestando ao ferido os cuidados necessários. 


Quando o viu voltar a si, deu providências para que fosse internado num hospital, para tratamento mais adequado.

Fernando de Almeida, empresário teatral, havia mandado vir da Europa uma companhia dramática, que chegou ao Rio em 1829, no dia exato em que faleceu o empresário. Abandonada a companhia, os artistas lastimavam-se por toda parte, como um rebanho que tivesse perdido o pastor. Um desses atores se queixava, quando ouviu, de repente:

— E não estou eu aqui?

Era D. Pedro I. Nesse mesmo dia, nomeou uma comissão para dirigir oficialmente a companhia.

Quando soube da decisão de D. Pedro I de terminar a aventura com a Marquesa de Santos, o Marquês de Queluz foi um dos primeiros a patentear a sua alegria, dizendo ao Imperador:

— Caístes como homem, mas vos erguestes como herói, e a admiração da Europa será a vossa recompensa.

A bordo do navio Warspite, após a abdicação, D. Pedro I teve notícia das aclamações que o seu filho recebera no dia 9 de abril, nas ruas do Rio de Janeiro. E suspirou então:

— Há pouco, iguais vivas retumbaram em honra minha. Possa a fortuna ser mais fiel a meu filho.

Evaristo da Veiga, ao receber a notícia da morte de D. Pedro I, a quem ele tanto combatera, escreveu num julgamento que se antecipava ao da posteridade:

“O ex-Imperador do Brasil não foi um príncipe de ordinária medida, e a Providência o tornou um instrumento poderoso de libertação, quer no Brasil, quer em Portugal. 


Se existimos como corpo de Nação livre, se a nossa terra não foi retalhada em pequenas repúblicas inimigas, onde só dominasse a anarquia e o espírito militar, devemo-lo muito à resolução que tomou de ficar entre nós, de soltar o primeiro grito de nossa Independência”.

Não foi um príncipe de ordinária medida, mas uma prodigiosa natureza humana, um ser de escândalo e contradição, cuja vida, tão breve, se marcou de rasgos generosos que lhe redimem erros e pecados.

Ao tomar conhecimento da morte de D. Pedro I, em 1834, José Bonifácio exclamou:

— D. Pedro não morreu. Só morrem os homens vulgares, e não os heróis!