"Nós, os monarcas, somos incontestavelmente constantes em um mundo em constante transformação. Pelo motivo de termos estado sempre aqui, mas também por não nos envolvermos na política cotidiana. Estamos informados das mudanças políticas que acontecem em nossas sociedades, mas não fazemos comentários sobre isso. É nisso que assumimos uma posição única. Nenhum dos outros monarcas europeus interfere na política."

Margarethe II, Rainha da Dinamarca

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

O EXÉRCITO E A MUDANÇA DA CAPITAL FEDERAL



Brasília, "a Capital da Esperança", é fruto do idealismo de pró-homens como 
José Bonifácio, que lhe sugeriu o nome e da férrea determinação em construí-la, do Presidente Juscelino Kubitschek.


Outros insignes patriotas também muito contribuíram para que hoje, majestática, em excepcional região geo-estratégica – o Planalto Central – se encontrasse Brasília, a "cidade monumento", patrimônio da humanidade.


É nosso intuito relembrar, de forma assaz breve, a saga de militares do Exército, precursores da mudança da capital brasileira, mencionando os seus  respeitáveis nomes.


Impende lembrar, inicialmente, que o ilustre historiador Francisco Adolfo de Varnhagen, também Ten Cel do Corpo de Engenheiros de nosso Exército Imperial,  cujo nome consta dos "almanaks" da Força, desencadeou, no século passado,
vigorosa campanha pela mudança da capital para o Planalto Central, área por ele  percorrida, ficando célebre o ofício que enviou, em 1877, da Vila Formosa da Imperatriz (hoje, Formosa-GO), ao ministro da Agricultura, expondo as vantagens da dita mudança.


Entretanto, a primeira medida efetiva visando à interiorização da Capital da República, somente se concretizaria por força do texto da Constituição de 1891, em
decorrência de uma emenda constitucional, de autoria do constituinte, Tenente do Exército Lauro Müller.


Em maio de 1892, foi criada uma comissão para explorar o Planalto Central, região prevista na citada Carta Magna de 1891, com vistas à localização do futuro Distrito Federal. Tal comissão foi chefiada pelo engenheiro belga, naturalizado
brasileiro, diretor do Observatório Astronômico e Major Honorário do Exército, Dr. Luiz Cruls, e procedeu à demarcação, durante nove meses, do que ficaria conhecido
como "quadrilátero Cruls".


Em resposta a: 1893, no governo do Marechal Floriano Peixoto – o brasileiro mais entusiasta pela transferência da Capital – foi formada nova comissão, sendo Cruls outra vez chamado para chefiá-la, com a incumbência de escolher, na região anteriormente demarcada, a definitiva área do futuro município neutro; os trabalhos, iniciados em 1894, foram interrompidos, por dificuldades financeiras, em 1897,
quando do governo de Prudente de Morais.


Ressalte-se que quase todos os componentes das duas comissões eram militares ou servidores civis do Exército. Assim, o relacionamento com o Dr. Cruls era excelente, máxime porque ele fora 1º Ten do Exército da Bélgica, era Major Honorário de nosso Exército e Lente da Escola Superior de Guerra (escola de formação de oficiais do Exército, que não deve ser confundida com a atual ESG),
tendo inclusive recebido, em 1895, a honorificência de Ten. Cel. Honorário do Exército Brasileiro. 


A Comissão Exploradora, de 1892, era basicamente militar, tanto que dezesseis dos seus vinte e dois membros eram oficiais do Exército ou funcionários do Ministério da Guerra, isso sem contar o contingente de apoio e segurança, também da Força. Entre os oficiais que serviram sob as ordens de Cruls, merecem ser citados o Maj Médico Dr. Pedro Gouvea, o Cap Pedro Carolino deAlmeida e os Tenentes Augusto Tasso Fragoso, Hastimphilo de Moura, Antônio Cavalcanti de Albuquerque e Alípio Gama.


Hoje, o augusto nome de Luiz Cruls, foi resgatado pelo Exército Brasileiro, que concedeu, em 1999, à 11ª Região Militar, sediada em Brasília, a denominação histórica de "Região Tenente-Coronel Luiz Cruls" e o respectivo estandarte histórico.


Na relembrança da memória de Luiz Cruls, merecem ser transcritas as palavras do historiador militar Gen Hans Gerd Haltenburg, contidas em seu precioso arquivo:


"Foi soldado. Alma de soldado, soube cumprir missões. Aprendeu a amar a nova Pátria. Aqui casou. Aqui deixou descendentes. Aqui repousa. Morreu pelo Brasil"...


Após a interrupção dos trabalhos da segunda Comissão Cruls, o assunto da mudança quedou esquecido. Isso se deveu, fundamentalmente, ao saneamento e modernização do Rio de Janeiro e às concomitantes restaurações das fortalezas
daquela cidade e reequipamento da Marinha, ocorridos no princípio do século, além da evolução tecnológica dos meios bélicos (mísseis, principalmente), de 1946 a 1960, o que invalidava, em parte, as estratégias de defesa da capital da República.


Somente em 1946, o assunto voltou à baila, quando o Presidente Gen Eurico Gaspar Dutra constituiu uma comissão de estudos para a localização da nova capital, cuja chefia coube ao Gen Djalma Poly Coelho. O relatório da comissão ficou pronto em agosto de 1948 (concluiu-se pela manutenção, com algumas modificações, do
"quadrilátero Cruls").


Em 1953, dá-se a formação da Comissão de Localização da Nova Capital, presidida pelo Gen Aguinaldo Caiado de Castro, Chefe da Casa Militar do Presidente Vargas, que cumpriu, integralmente, os objetivos previstos, mormente um minucioso levantamento fotogramétrico da área escolhida.


Em 1955, convidado pelo Presidente Café Filho, assume a presidência da mencionada comissão o Gen José Pessoa Cavalcanti de Albuquerque. A comissão foi responsável pela exata escolha do local, onde hoje, portentosa, se ergue Brasília.Muito importante é dizer-se que, por solicitação do Gen José Pessoa, o então governador de Goiás, José Ludovico de Almeida, exarou um decreto declarando de necessidade e utilidade pública e de conveniência ao interesse social, toda a área onde se sediaria o Distrito Federal. 


À tarde de 30 de abril de 1955, um sábado, reuniram-se
o governador José Ludovico e o Gen José Pessoa, para acerto de detalhes do decreto, linhas atrás referido, o qual foi assinado no dia seguinte, 1º de maio, com data de 30
de abril, causando grande surpresa, mas impedindo a especulação imobiliária que adviria, caso esse ato legal fosse do conhecimento prévio da população. José Pessoa,
acendrado patriota e idealista, assim antevia o radioso futuro do Planalto Central: 


"O altiplano brasileiro sempre exerceu poderoso fascínio sobre os nossos primitivos habitantes, como se deu na era aurífera de São Paulo e Minas e não tenhamos dúvidas
de que o mesmo acontecerá, num futuro próximo, com aquele Planalto; será com sangue novo que lhe faremos o povoamento e a grandeza"...


Por derradeiro, frise-se que em 1956, quando se iniciou a construção da Capital Federal, as primeiras moradias de Brasília, as dos candangos, foram as barracas
verde-oliva do Exército, trazidas em enorme quantidade para o Planalto, por ordem pessoal do ministro da Guerra, Gen Henrique Lott; outrossim, ele deu prioridade máxima à construção de quartéis, porquanto era um ardoroso admirador do obstinado ânimo do Presidente Juscelino, como nos ensina o emérito "Historiador de Brasília", Dr. Adirson de Vasconcelos. 


Eis, em síntese, mesmo que imperfeita e incompleta, o que foi, através de várias épocas, a participação do Exército, pelo benemérito labor de alguns de seus abnegados integrantes, na mudança da capital do País, inaugurada em 21 de abril de
1960 e consolidada pelos primeiros governos da Revolução de 31 de março de 1964.


De Varnhagen, ainda ao tempo do Império, a Lauro Müller e Floriano Peixoto (que efetivou as primeiras medidas para a transferência), passando por Cruls até o Gen Dutra (que retomou o ideário mudancista) e deste a Poly Coelho, Caiado de Castro, José Pessoa e Lott, muito foi feito pelo invicto e glorioso Exército Brasileiro, com vistas à materialização do sonho de interiorizar-se a capital do Brasil.


Eis por que os militares da Força Terrestre Brasileira, desde sempre, ufanam-se em pertencer à mais lídima e  representativa das instituições nacionais – o verdadeiro
índice do povo brasileiro, no dizer do inesquecível sociólogo Gilberto Freyre.
      
Manoel Soriano Neto     

 * O autor é Cel. Chefe do C Doc Ex

Nenhum comentário:

Postar um comentário