"Nós, os monarcas, somos incontestavelmente constantes em um mundo em constante transformação. Pelo motivo de termos estado sempre aqui, mas também por não nos envolvermos na política cotidiana. Estamos informados das mudanças políticas que acontecem em nossas sociedades, mas não fazemos comentários sobre isso. É nisso que assumimos uma posição única. Nenhum dos outros monarcas europeus interfere na política."

Margarethe II, Rainha da Dinamarca

segunda-feira, 18 de março de 2013

Fadiga presidencialista


Este ano a Constituição federal completará 25 anos. Um quarto de século não é muito, mas também não é pouco: bem ou mal, já deu para viver um bocado e, assim, ver o que pode ficar e o que deve ser mudado. Nesse interstício constitucional, algumas opções políticas brasileiras já estão consolidadas e outras aguardam a devida consolidação, enquanto ainda temos as que nem sequer deram o primeiro passo. Portanto, é hora de avaliarmos o que foi feito e o que há para fazer.

É certo que o passar do tempo pode ser um simples e pacato repetir de rotinas. Um dia, no entanto, pode ser suficiente para dar sentido a uma vida inteira. Neste teatro imprevisível do viver, alguns se vão cedo, mas vivem muito; outros se vão tarde, mas vivem pouco; e há os que fazem de sua experiência viva um momento que transcende o aspecto temporal da existência e, com isso, se tornam eternos. Como tem sido, então, a vida constitucional nascida em 1988?

Pois bem, a pergunta é rica e possibilita uma série de análises que superariam, em larga medida, os limites restritos do presente artigo. Atentando para a limitação do espaço, centraremos o foco no aspecto político da normatividade constitucional. Aqui, inegavelmente, andamos muito e por diferentes caminhos.

Sem sombra de dúvidas, a democracia brasileira é uma viva realidade pulsante e isso, por si só, já traduz uma vitória maiúscula da Constituição atual – nesse ínterim, o impeachment de Fernando Collor de Mello, o sucesso do Plano Real, o governo Fernando Henrique Cardoso e a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva bem demonstram a riqueza e a diversidade dos acontecimentos políticos, que se deram sem traumas nem rupturas institucionais importantes. Também não há dúvida de que o modelo presidencial contribuiu substancialmente para a estabilidade democrática. Logo, seria o presidencialismo uma virtude política?

Talvez não seja uma virtude definitiva, mas foi, sim, positiva naquele momento de transição. Vindo de uma doída experiência ditatorial, era necessário o estabelecimento de um mecanismo que evitasse influxos e variações que comprometessem o desenvolvimento dos nascentes institutos constitucionais. Seguindo as sempre lúcidas lições de Raul Pilla, temos como certa a superioridade do sistema parlamentar. Acontece que política, além de teoria, é circunstância e possibilidade. E naquele contexto histórico a escolha pela rigidez presidencialista teve fundamento e justificação. Todavia, passados 25 anos, é chegado o momento de reconhecermos que o sistema presidencial não consegue amadurecer e apenas quer viver uma irresponsável vida juvenil. E sem responsabilidade política é inviável a consolidação de uma democracia digna, profícua e austera.

Não é de estranhar, portanto, que neste presidencialismo de partidos tíbios e de lideranças baixas tenhamos de conviver com escândalos como o mensalão e quejandos. Aqui, aliás, reside um dos problemas centrais do sistema político brasileiro: nossos partidos, em vez de centros de preparação para a vida pública, se transformaram em simples confrarias de amigos que buscam apenas o poder pelo poder. Não há um projeto político de nação, pois os interesses partidários não conseguem olhar para além do próprio umbigo.

É triste reconhecer, mas a realidade não deixa mentir. Tanto é verdade que recente pesquisa do Ibope revelou que 56% dos entrevistados não têm preferência partidária alguma. Em 1988 apenas 38% se diziam apartidários, ou seja, de lá para cá, a ideologia e a confiança nos partidos se esfarelaram como broa de polvilho. Agrava a situação o fato de o sistema presidencial não ser favorável a uma visão orgânica da atividade política, centralizando o processo decisório nas mãos de ferro do presidente. E o presidente poderá ser um nulo ou um ás. E, mesmo nulo, terá o direito sagrado de permanecer no cargo durante a integralidade do mandato, por maior que seja a sua nulidade intestina. Ora, isso não é bom e não pode fazer bem a nenhuma nação que se queira respeitada.

A questão é: o que fazer?

Bem, se quisermos maturidade política, teremos de resgatar a dignidade da atividade parlamentar. Isso porque sem um Poder Legislativo forte, responsável e atuante a democracia fica sem a vigília crítica que o exercício político superior impõe. Dessa forma, precisamos parlamentarizar gradativamente o sistema presidencial. Poderíamos, por exemplo, buscar inspiração no sistema semipresidencial francês da V República, que deixa a chefia do Estado ao presidente, colocando-o teoricamente como um alto magistrado democrático, enquanto desloca as questões de governo para o primeiro-ministro. O sistema português, entre tantos outros, também poderia fornecer subsídios relevantes. Aliás, antes de pura e simples importação acrítica de modelos estrangeiros, devemos seguir como norte o conselho de Assis Brasil e buscar construir instituições políticas originais. Originalidade que foi uma das marcas do saudoso Partido Libertador, que tantos homens de bem reuniu em torno de sua bandeira, mostrando ao País ser possível fazer política com impessoalidade e desambição.

É chegada a hora das avaliações. Os 25 anos da Constituição de 1988 serviram para mostrar que o nosso sistema partidário está falido. Enquanto esse estado falimentar permanecer, de nada adiantará falarmos em voto distrital ou misto, listas fechadas, financiamento público de campanhas, entre outros temas da moda. Um rio começa a ser purificado pela nascente. E a nascente da atividade política são os partidos, pois as virtudes políticas precisam da orientação partidária para um florescer ordenado e ordeiro. Tampouco adianta insistir: sem bons partidos não há boa política. E sem boa política a democracia fica medíocre.
Será, aliás, que você se lembrou de alguém?

Sebastião Ventura Pereira da Paixão Jr

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