"Nós, os monarcas, somos incontestavelmente constantes em um mundo em constante transformação. Pelo motivo de termos estado sempre aqui, mas também por não nos envolvermos na política cotidiana. Estamos informados das mudanças políticas que acontecem em nossas sociedades, mas não fazemos comentários sobre isso. É nisso que assumimos uma posição única. Nenhum dos outros monarcas europeus interfere na política."

Margarethe II, Rainha da Dinamarca

domingo, 4 de agosto de 2013

Afinal, para quê a república?

Muitos de nós brasileiros, devido ao sistema educacional e cultural que nos foi imposto (em especial para as pessoas que estudaram no período de Ditadura Militar), ao debater sobre os sistemas republicano e monárquico, vêem a república como “evolução” natural de um povo que antes era monárquico. Tal observação pode levar a erro, em especial se os interlocutores da conversa não tiverem um pouco de conhecimento político, histórico e geográfico.

Se nós aprofundarmos um pouco o debate, podemos perguntar enfim “OK, mas porque a república representaria necessariamente uma evolução?”. Aí nos responderão que a mesma “traz a Democracia, nós escolhemos os nossos representantes, porque sim”, além de outros argumentos superficiais. Mas será isto mesmo?

Antes de apresentar argumentos mais profundos sobre o caso, vamos somente ver dois fatos. De acordo com a pesquisa promovida pela revista “The Economist”, em 2010, que avaliou os índices de
percepção de democracia em mais de 160 países e territórios, dos dez países com maior percepção democrática, sete eram monarquias (Noruega, Dinamarca, Suécia, Nova Zelândia, Austrália, Canadá e Países Baixos), sendo que os outros três nunca “evoluíram” para a república, sempre tendo sistemas de governo mais comunitários (Islândia, Finlândia e Suíça) e os dez países menos democráticos, nove eram repúblicas e um (Arábia Saudita) é formalmente uma Monarquia, mas que não se enquadra nos moldes ocidentais, sendomais propriamente um Califado Islâmico.

O outro fato é o de que o sistema parlamentar moderno, no qual o povo exerce o governo através de seus representantes e é o mais comum nos considerados países desenvolvidos, surgiu na Inglaterra, e até hoje é seguido pelo Estatuto de Westminster.
Tais fatos já mostram, em si, que democracia não é antônimo de Monarquia, nem sinônimo de república.

O sistema republicano, modernamente como conhecemos hoje, surgiu com a Revolução Americana, na qual os Estados Unidos da América tornaram-se independentes da Grã-Bretanha, sendo seguidos quase imediatamente pelas demais republicas que se instalariam nos países recémindependentes latino-americanos, com exceção do Brasil. Nestes citados países, a implantação da república se justifica, pelo simples fato de que os mesmos se viram sem continuidade em seus governos, ao romperem laços com suas metrópoles.

Nos Estados Unidos, que criaram o sistema presidencialista, a república se caracterizou quase como uma “Monarquia eletiva periódica” na qual o presidente assume uma figura muito mais autocrática e concentradora de poder do que os Monarcas parlamentaristas pelo período em que está no poder.

Nas repúblicas recém independentes hispânicas, foi simplesmente uma maneira de legitimar os “caudilhos” que detinham o poder de fato nas colônias espanholas e que se aproveitaram da anomia no período napoleônico para se tornarem independentes do Reino da Espanha, quase ao mesmo tempo. Ademais, à medida que vemos outros exemplos de repúblicas ocidentais, verificamos que os motivos que as levaram a existir foram sempre grandes comoções nacionais.

Na França, se deu em virtude da Revolução Francesa (evento que em teoria trouxe boas idéias, mas péssimos resultados). Na Itália, Áustria, Alemanha, Checoslováquia, Hungria e Polônia, o fim da monarquia se deu por erros e derrotas humilhantes em guerras (o que também não justifica o fim do regime, mas é compreensível). Na Rússia a queda se deu por verdadeira falta de competência governamental que permitiu o ensejo da Revolução Comunista. E noutros países, a república decorreu na verdade de Golpes de Estado ilegítimos, como ocorreu no Brasil e em Portugal, neste inclusive com o direito a um regicídio prévio.

Assim, vemos que o sistema republicano em algumas hipóteses pode até ser natural para um povo que sofre da “Síndrome de Adão”, ou seja, que é órfão de instituições e precisa se erguer frente à comunidade internacional. Esta é a situação dos demais países americanos (exceto o Canadá e outros na América Central), mas não é o caso do Brasil.

O Brasil sim, como os demais, foi durante trezentos anos uma colôniaportuguesa. Contudo, ao contrário das outras colônias, não houve uma ruptura institucional, na qual o país deixou de ser uma colônia e passou a uma republiqueta independente politicamente mas dependente economicamente. O Brasil foi o único país nas Américas que evoluiu (ao contrário de rebelar-se) de uma colônia a parte do Reino, inclusive mais independente do que a parte européia do Reino Português, pois aquela chegou a ser ocupada pelos franceses durante certo período.

A partir daí, a entidade brasileira independente de Portugal continuou sua verdadeira evolução, quando ao separarse de sua parte européia continuou com seu sistema de governo monárquico totalmente legitimado, sendo que inclusive o primeiro estado a reconhecer a independência de nossa Monarquia Americana foi justamente o maior exemplo de república, que foram os Estados Unidos.

Aliás, esta não foi a única independência com continuidade monárquica, pois quando a Noruega viu-se independente da Suécia, Bélgica independente da Holanda e Grécia independente do Império Otomano, todas optaram pela continuidade monárquica, através da escolha de casas reais que deram continuidade ao projeto político daqueles países (sendo que a Grécia infelizmente acabou vítima de um outro golpe republicano).

Assim, por tal motivo pode se ver que o sistema republicano não é natural na história brasileira. Caso fosse natural, as várias revoltas como a Confederação do Equador, a Inconfidência Mineira e a Revolução Farroupilha teriam sido bem sucedidas, pois todas defendiam o sistema republicano. Esta última, em especial, chegou a lograr êxito em proclamar duas repúblicas distintas, a Rio-Grandense e a Juliana, e ao final ambas aceitaram retornar ao Império Brasileiro, e seus respectivos militares revoltosos foram anistiados e recebidos nas fileiras imperiais, num ato magnânimo do Império.

A república no Brasil, como em Portugal, não são fruto, portanto, do anseio popular, mas tão somente de um Golpe de Estado, e no caso do Brasil em especial, uma série de fatores confluíram contra o regime legítimo brasileiro. Em uma época carente de informação, não por falta de liberdade de imprensa, mas por carência tecnológica onde o único meio de divulgação era a imprensa escrita e um grupo de militares e pseudo-intelectuais que desejavam o poder apenas para si, levou a derrubada do Governo Imperial sem nenhum motivo relevante, como a derrota em guerras que levou à república na Alemanha, Itália ou Áustria.
Ao contrário, era ainda recente a vitória na Guerra do Paraguai. Muitos dizem que o povo brasileiro não se revoltou contra a instauração da República, e que teria anuído a ela tacitamente.

Porém, não é bem assim. O povo brasileiro é pacífico por natureza, mas certamente não deixaria seu Imperador indefeso. Sabendo disso, os promotores do golpe tiveram o cuidado de depor o Chefe de Estado e deportá-lo antes que o golpe fosse de conhecimento público. Ademais, o Imperador aceitou exilar-se, pois sabia que ao defendê-lo, o povo poderia ser vítima de um banho de sangue promovido pelos militares do Exército.

Tamanha era a nobreza do Magnânimo D. Pedro II que trocou seu poder pelo bem estar de seu povo, para o qual, inclusive, deixou o “preço” da república, que seriam cinco mil contos de réis oferecidos a título de “indenização” pelos golpistas (tão competentes no trato da “res publica” que poderiam ter causado no primeiro dia de governo uma crise financeira, sendo esta renúncia o último ato direto de governo do Imperador). Além disto, deve ser lembrado que o fato político que precipitou a renúncia de Deodoro fora exatamente a Revolta da Armada, que era embasada por militares da marinha que não tinham tomado parte no golpe de 1889 e que permaneceram fiéis ao Império.

Além destes argumentos históricos, também verificamos que todos os argumentos jurídicos, políticos ou sociológicos são derrubáveis por terra se defensores da república são interpelados (quando resolvem responder, pois estes nem preferem argumentar).

Se o argumento destes é a questão da democracia, a mesma já está comprovada no início deste texto. O Chefe de Governo é escolhido pela vontade popular em um sistema eleitoral em que os representantes do povo devem explicações a seus eleitores (através de um sistema distrital), e poderá trabalhar com o Imperador, porque o Chefe de Estado monárquico, ao contrário do presidente numa república, não se imiscui em questões político-partidárias, nem deve favores políticos. Seriam, assim, parceiros de trabalho e nunca inimigos políticos. Além disso, na hipótese de um mal governo, o primeiro-ministro pode ser derrubado por uma moção de desconfiança (movida inclusive pelo próprio Parlamento) e um novo gabinete se forma, sem que exista a hipótese de demissão do Premier por motivos escusos.

Se o argumento é o de que o Brasil é um país americano, também não conta, pois apesar de americano, conforme já dito, ele não seguiu em sua história a dinâmica dos demais países deste continente, por ter sido parte (não só colônia) de um reino centenário, e não ter tido uma fragmentação caudílica como as colônias hispânicas.

Também não cola o argumento de que a república foi desejada pelo povo, por ter sido ela fruto do desejo de poder de um grupo reduzido de golpistas (que para azar do Brasil, tinham entre si vários militares de alta patente).

Por fim, resta o derradeiro argumento do plebiscito, de que em 1993 o povo teria adotado a república. Você não convence uma pessoa de que um cachorro é um bom, fiel e útil animal de estimação se durante toda a vida lhe ensinaram que é um animal violento que só morde e late, mesmo que você nunca tenha visto um cachorro pessoalmente.

Desta maneira foi tratada a Monarquia, ao longo de um século. Com todas as vênias possíveis, realmente seria impossível para a causa monárquica ganhar. Depois de 99 anos de propaganda anti monárquica, de cerceamento ao direito de expressão que proibia a divulgação de ideiais monárquicos, de uma lavagem cerebral (ainda em curso) que tentou mostrar os benefícios de uma república que só atrasou o país, e ainda por cima adiantando em quase seis meses a data do pleito, não deixando o movimento organizar-se… sem falar na injustiça da própria propaganda, pois, até onde me recordo, nos dois horários de propaganda política, a tarde e a noite, a monarquia somente tinha a sua disposição horário à noite para falar, e, repito, sem que houvesse uma organização útil para a discussão de ideias.

Se a Monarquia ganhasse a república, seria uma vitória maior do que a própria vitória de Davi contra Golias, pois aquele ainda tinha uma funda como arma. A monarquia nem isso. Assim, diante do meu leitor, após apresentar tais argumentos, faço novamente a pergunta ao meu ficto interlocutor “Mas afinal, para quê a república?”  E, no seu silêncio eloqüente, respondo-lhe, “No Brasil? Para nada de bom!”

IBI

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