Não houve um só tiro que pudesse revelar que se tratava de um golpe e não de um desfile. Se ecoassem disparos (de fato, houve dois, mas ninguém os escutou), talvez aqueles 600 soldados percebessem que não estavam ali para participar de uma manobra, e sim para derrubar um regime. Na verdade, vários militares ali presentes sabiam que estavam participando de uma quartelada. Mesmo os que pensavam assim achavam que quem estava caindo era o primeiro-ministro, Ouro Preto Jamais o imperador D. Pedro II - muito menos a monarquia que ele representava.
Não é de estranhar a ignorância dos soldados do 1° e do 3° Regimento de Cavalaria e do 9° Batalhão. Afinal, até poucas horas antes, o próprio líder do golpe se mostrava indeciso. Mais: estava doente, de cama, e só chegou ao Campo de Santana quando os canhões já apontavam para o quartel. Talvez ele não tenha dado o "Viva o imperador" que alguns juraram tê-lo ouvido gritar. Mas com certeza impediu que pelo menos um cadete berrasse o "Viva a república", que supostamente estava entalado em muitas gargantas.
A cena foi bem estranha Montado em seu belo cavalo, o marechal Deodoro da Fonseca desfilou longa lista de queixas, pessoais e corporativas, contra o governo -o governo do ministro Ouro Preto, não o do imperador. O imperador – isso ele fez questão de deixar claro – era seu amigo: "Devo-lhe favores". O Exército, porém, fora maltratado. Por isso, derrubava-se o ministério. Difícil imaginar que Deodoro estivesse dando um golpe, ainda mais golpe republicano – ele era monarquista. Ao seu lado estava o tenente-coronel Benjamin Constant, militar que odiava andar fardado, não gostava de armas e tiros e, até cinco anos antes, também falava mal da república. Ambos, Deodoro e Constant contavam agora com o apoio de republicanos civis. Mas não havia sinal de "paisanos" por perto -esses apenas tinham incentivado a aventura golpista dos dois militares (por coincidência ou não, dois militares ressentidos).
O fato é que naquela mesma hora o ministro Ouro Preto foi preso e o gabinete derrubado. Mas ninguém teve coragem de falar em república. Apenas à noite, quando golpistas civis e militares se reuniram, foi que proclamaram - em silêncio e provisoriamente - uma república federativa "Provisoriamente" porque se aguardaria "o pronunciamento definitivo da nação, livremente expressado pelo sufrágio popular". E o povo a todas essas? Bem, o povo assistiu a tudo "bestializado, atônito, surpreso, sem conhecer o que significava", disse Aristides Lobo. Embora Lobo fosse republicano convicto e membro do primeiro ministério, seu depoimento tem sido contestado por certos historiadores (que citam as revoltas populares ocorridas naquela época). De qualquer forma, o segundo reinado, que começara com um golpe branco, terminava agora com um golpe esmaecido. A monarquia, no Brasil, não caiu com um estrondo, mas com um suspiro. E o plebiscito para "referendar" a república foi convocado em 1993 - com 104 anos de atraso. O império já havia terminado.
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