Superar os efeitos da crise econômica internacional é a tarefa do momento que se impõe ao país através da adoção de medidas necessárias de política econômica. Todavia, as mesmas não serão suficientes para, de forma sustentável, melhorar os aspectos estruturais brasileiros como o precário nível em que se encontra a educação, a saúde, a infraestrutura, aspectos estes, que obstaculizam a capacidade agregar competitividade e qualidade de vida ao país.
Mesmo considerando alguns avanços obtidos, como a estabilidade política e monetária, o grande desafio do Brasil está na capacidade de viabilizar as reformas estruturais e, apenas, por meio delas poderá aspirar a uma melhor condição de seu contexto econômico e social.
Mas afinal, por onde começar? A sociedade necessita compreender que existe um cronograma de reformas necessárias e que a inversão na ordem das mesmas representará tentativa de retardar e postergar a reorganização institucional do país. Nesse sentido, a ordem das reformas iniciaria pela reforma constitucional, seguida da reforma política, da reforma fiscal e da reforma tributária.
Estas reformas consideradas estruturantes viabilizariam outras reformas necessárias como a trabalhista e a previdenciária, as quais afetam diretamente a competitividade e a sustentabilidade do País.
A reforma constitucional é a primeira das reformas porque o Brasil não pode continuar submetido ao arcabouço anacrônico, confuso e irreal da constituição de 1988. A reforma constitucional via convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte exclusiva é necessária sob todos os aspectos, primeiro para resgatar a genuinidade de um processo constituinte sem vícios, e segundo, porque seu conteúdo mandatório possibilitará remover os anacronismos e as inadequações de uma constituição que foi elaborada sob o manto eleitoreiro e demagógico como foi em 1988.
A segunda reforma é a política para possibilitar o aperfeiçoamento da democracia corrigindo as distorções no sistema de representação popular, tais como: a desproporcionalidade da representação dos Estados na Câmara dos Deputados; o financiamento das campanhas eleitorais; a cláusula de barreira aos partidos inexpressivos; a proibição das coligações para as eleições proporcionais; rever o horário gratuito de rádio e televisão concedido pela lei eleitoral, aos partidos e candidatos; a fidelidade partidária; o voto distrital puro ou misto; e o voto facultativo.
Todos estes aspectos precisam ser tratados por que muitos deles são fontes potenciais da improbidade e da corrupção.
A terceira é a reforma fiscal, que significa revisar profundamente a atual forma de gestão orçamentária do Estado onde os atuais mecanismos de alocação de recursos estão descolados das demandas da sociedade. É urgente priorizar o investimento público para fazer frente as demandas sociais em detrimento das vinculações orçamentárias que sustentam a estabilidade das corporações públicas via aumento das despesas correntes.
A elaboração dos orçamentos dentro de uma ótica exclusivamente funcional é incompatível com a complexidade e visão sistêmica do mundo globalizado. Por exemplo, alocar recursos orçamentários na educação com base na destinação percentual (35%) do orçamento total significa engessar recursos desvinculados da avaliação dos resultados e de como a educação está focada para enfrentar os desafios do desenvolvimento.
A síntese deste processo se expressa na contradição do Brasil ter universalizado o acesso à educação, mas em contrapartida apresentar elevado índice de analfabetismo funcional (70%), ou seja, expressivo número de cidadãos brasileiros que, mesmo tendo aprendido a ler e escrever, não consegue interpretar um texto e/ou fazer raciocínio numérico envolvendo mais de uma operação matemática.
E, por fim, a reforma tributária que permita reverter o atual quadro de insustentabilidade da carga de impostos pagos pelos cidadãos brasileiros. Rever uma estrutura tributária complexa, cara, e desigual que fere o princípio do federalismo fiscal é condição essencial para reverter as desigualdades regionais e interpessoais de renda.
A União apropria a maior parcela do “bolo” tributário (59%) restando aos Estados (25%) e aos Municípios (16%). Por sua vez, gasta muito em custeio e pessoal e pouco em infraestrutura, educação e saúde.
Como exemplo, atualmente, o governo federal arrecada mais de um terço do Produto Interno Bruto (PIB) nacional em impostos e retorna em termos de investimento menos de 3%.
Elevar e agilizar e o investimento público é condição básica para obter crescimento econômico.
Portanto, o desafio do País está posto e cabe a sociedade e suas organizações pressionarem para que as reformas sejam levadas a efeito, caso contrário, continuaremos no sofisma de que somos uma nação emergente e, concomitantemente, ocupando os últimos lugares em indicadores de desenvolvimento.
por: Paulo de Tarso Pinheiro Machado
Publicado originalmente pelo autor em periódicos do RS em 2008
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