Que a imprensa esteja infiltrada de simpatizantes do bolivarianismo - mais por ignorância do que por ideologia -, disso não duvido. Mas reúne também muita gente sensata que está com medo de pensar; que se obriga a torcer os fatos para repetir o mantra: “golpe, golpistas…” Chamar Zelaya de presidente constitucional é, então, uma acinte.
Lula, com efeito, é “o Cara”. É o cara que fez correr sangue em Tegucigalpa. Com o apoio de boa parte da imprensa brasileira.
Lula, com efeito, é “o Cara”. É o cara que fez correr sangue em Tegucigalpa. Com o apoio de boa parte da imprensa brasileira.
Depois de ter feito o seu discurso na ONU - aquele em que pediu a reinstalação de Zelaya no poder e o fim do embargo à tirania cubana -, Lula se encontrou e se deixou fotografar com Ahmadinejad, presidente do Irã.
Por Reinaldo Azevedo , 24 de setembro de 2009
Há pontos sobre os quais já não resta a menor dúvida. Lembro-os apenas para que não se perca no dia-a-dia a memória do escândalo. O ponto deste artigo, no entanto, é outro. Falarei aqui de uma imprensa - a chamada “grande imprensa” - que vive sob patrulha e que passou a ter medo de pensar. Se preciso, ela vai contra os fatos para que não seja considerada “conservadora”, “reacionária” e “golpista”. Já chego lá. Antes, ao que é dado.
- O retorno de Manuel Zelaya a Honduras foi pensado para coincidir com a presença de Lula em Nova York. O que, por si, já seria notícia ampliou-se enormemente. Lula tratou do caso em seu discurso;
- Lula usa, de forma miserável, a tragédia de um pequeno e pobre país para robustecer a própria mitologia;
- em entrevista à Rádio Jovem Pan, Zelaya confirmou que conversou previamente com Lula e Amorim;
- Os presidentes Lula, Daniel Ortega (Nicarágua), Maurício Funes (El Salvador) e Hugo Chávez, que desapareceu do noticiário (?), articularam a ação;
- se Zelaya não é um asilado na embaixada brasileira, como diz Celso Amorim, então está usando a representação brasileira para insuflar a insurreição, o que viola uma penca de tratados internacionais;
- Lula não hesitou em usar o pobre povo hondurenho como massa de manobra ou bucha de canhão de seus sonhos megalômanos;
- É mentira - grotesca, estúpida, deslavada - que Zelaya tenha sido deposto por um golpe. Artigo que circula por aí e que me foi enviado por leitores sustentando que a Constituição hondurenha foi violada pelo governo Micheletti sai da pena de um delinqüente de aluguel. O mesmo delinqüente garante, por exemplo, que o mensalão nunca existiu;
- Já demonstrei aqui, por A + B, que a Zelaya é que violou a Constituição; a rigor, quando deixou Honduras, nem era mais presidente. A Carta prevê destituição automática para quem faz o que ele fez;
- Já demonstrei aqui, por A + B, que a Zelaya é que violou a Constituição; a rigor, quando deixou Honduras, nem era mais presidente. A Carta prevê destituição automática para quem faz o que ele fez;
- jornais e TVs ignoram o que é FATO, não o que é GOSTO: golpista era Zelaya, que deu uma ordem ao Exército contra decisão da Suprema Corte do país;- Lula mancha com sangue hondurenho a sua reputação de grande líder internacional - ainda mais asqueroso: alimenta-se desse sangue.
Tudo isso está dado. No arquivo vocês acham os artigos da Constituição que Zelaya violou. Agora vou comentar um pouco o transe em que a maior parte da imprensa brasileira está mergulhada. Não! Não é assim em todo o mundo, não. Tratei aqui de um editorial do Wall Street Journal que coloca as coisas em seus devidos termos. Escrevi ontem um texto afirmando, de forma um tanto irônica, que o chavismo havia chegado ao andar dos editoriais do Estadão. Agora, trato de um editorial da Folha. O jornal, vocês verão, percebeu que algo de errado se dá na embaixada brasileira. Mas recua diante do óbvio e recorre a uma mentira - ou desinformação - para ancorar seu ponto de vista. Trechos do editorial em vermelho. Sigo nas pretinhas.
A suspensão imediata do cerco [à embaixada do Brasil] acrescenta mais um item relevante ao conjunto de condições apresentadas pela comunidade internacional para superar-se o isolamento em que se encontra o atual governo hondurenho.As forças golpistas, entretanto, resistem a qualquer concessão. O governo Micheletti rejeitou a proposta de acordo apresentada por Oscar Arias, presidente da Costa Rica e Prêmio Nobel da Paz, que previa a volta de Zelaya ao poder, num governo de conciliação nacional, com anistia a todos os envolvidos na crise. Esse continua sendo o melhor caminho para superá-la.
Todavia, não são as resistências do atual governo o único fator de agravamento da situação. Nada é unívoco no quadro hondurenho, e as atitudes de Zelaya não correspondem em absoluto ao papel de mártir da democracia que lhe tem sido atribuído.
Não se esqueçam de que o jornal se refere ao governo Micheletti como “forças golpistas”. Já volto aqui. Observem que a Folha repete uma mentira que está em toda a parte: a história de que o governo provisório rejeitou o Plano Arias. Quem deu as negociações por encerradas foi o grupo de Manuel Zelaya. Basta consultar os jornais hondurenhos. O chamado Acordo de San José tinha um prazo estendido. No seu curso, Zelaya pôs fim à negociação e combinou com Chávez a sua volta - então malsucedida - a Honduras. Mas a Folha reconhece, que bom!, que ele não é um mártir da democracia. Vamos ver.
Zelaya tentou aplicar, contra uma cláusula pétrea da Constituição de seu país, o modelo chavista da permanência no poder, viabilizada por plebiscito popular. Naquela altura, já estava em curso a campanha para a sucessão presidencial -em que seu candidato tinha poucas chances de vencer.A tentativa de tumultuar o processo democrático -vale dizer, de golpe plebiscitário - foi condenada pelo Congresso e barrada na Corte Suprema. Roberto Micheletti, presidente do Congresso, assumiu conforme a linha sucessória estabelecida pela Constituição -já que o vice-presidente havia renunciado para concorrer nas eleições, marcadas para 29 de novembro.
A Folha reconhece, então, que Zelaya tentou a via bolivariana do golpe publicitário, condenado pelo Congresso e BARRADO pela Corte Suprema. Faltou o jornal lembrar neste ponto que, mesmo depois de o plebiscito ter sido declarado ilegal, o então presidente deu ordens para que fosse realizado e mobilizou para tanto o Exército.
O JORNAL E MUITA GENTE NÃO SE DÃO CONTA DE QUE AQUELA ORDEM JÁ ERA O GOLPE. Se os militares vão às ruas contra a Constituição e a Justiça, o que temos? Mas feliz fiquei mesmo quando a Folha escreveu: “Roberto Micheletti, presidente do Congresso, assumiu conforme a linha sucessória estabelecida pela Constituição”.
É MESMO? É MESMO! Assumiu segundo a linha sucessória estabelecida pela Constituição. Então não é golpe coisa nenhuma! Mas aí vem a patrulha: “Ih, vão chamar o jornal de golpista!” Vejam o que vem em seguida:
Foi o ato abusivo de expulsar Zelaya do país, “manu militari”, que configurou a ilegitimidade do atual governo. A partir de então, o justificado repúdio internacional ao golpe propiciou a Zelaya ocasiões para exercer, como nunca, o aventureirismo tumultuário que culmina em seu peculiar “asilo” na embaixada brasileira.Deixem-me ver se entendi bem. Zelaya tentou dar um golpe plebiscitário, mas sua ação foi “barrada” - isto é, ele caiu, perdeu o cargo (segundo a lei).
E, diz o jornal, Micheletti assumiu segundo a previsão constitucional. Estamos diante de uma inovação jurídica formidável: mesmo não sendo mais presidente, o golpe acontece quando Zelaya é tirado do país! Ora, ninguém podia surrupiar de Zelaya o que o próprio jornal admite que ele já não tinha. Ora, se ele foi mesmo tirado do país à força, isso até pode ser ilegal, criminoso, o diabo a quatro, mas golpe não é. E, como se nota, o que era uma sucessão constitucional virou golpe de novo.
Que a imprensa esteja infiltrada de simpatizantes do bolivarianismo - mais por ignorância do que por ideologia -, disso não duvido. Mas reúne também muita gente sensata que está com medo de pensar; que se obriga a torcer os fatos para repetir o mantra: “golpe, golpistas…” Chamar Zelaya de presidente constitucional é, então, uma acinte.
Lula, com efeito, é “o Cara”. É o cara que fez correr sangue em Tegucigalpa. Com o apoio de boa parte da imprensa brasileira.
Depois de ter feito o seu discurso na ONU - aquele em que pediu a reinstalação de Zelaya no poder e o fim do embargo à tirania cubana -, Lula se encontrou e se deixou fotografar com Ahmadinejad, presidente do Irã. Fica para o próximo post.
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