por: Carlos Chagas
A Constituição de 1988 criou o Conselho da República como órgão superior de consulta do presidente da República, dele participando o vice-presidente, os presidentes da Câmara e do Senado, os lideres da maioria e da minoria nas duas casas do Congresso, o ministro da Justiça e mais seis cidadãos brasileiros natos, designados dois pelo presidente, dois pela Câmara e dois pelo Senado.
O Conselho da República tem como competência pronunciar-se sobre intervenção federal, estado de defesa e estado de sítio, bem como sobre questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas.
Comporta-se o governo como se essa instituição não existisse. Jamais o presidente Lula reuniu o Conselho da República. Nem Fernando Henrique, nem Itamar Franco, muito menos Fernando Collor e José Sarney. No começo houve a designação dos seis brasileiros ilustres com mandato de três anos, como Paulo Brossard, Almino Afonso e outros. Agora, nem isso.
Exemplo mais recente de estar sendo descumprida a Constituição está na iniciativa do Procurador Geral da República de solicitar ao Supremo Tribunal Federal a intervenção em Brasília. O pedido dorme nas gavetas da mais alta corte nacional de justiça, sem prazo para deliberação, mas alguém tem notícia de que o presidente Lula convocou o Conselho da República para apreciar o ato do chefe do Ministério Público por ele mesmo nomeado? Descumpriu-se, assim, a nossa Lei Fundamental, sem que ninguém se desse conta.
Motivos para a convocação do Conselho da República acumulam-se através dos anos. Em 2005 as denúncias sobre o mensalão colocaram em xeque a estabilidade das instituições democráticas, tanto que no Congresso cogitou-se até do impeachment do Lula. Nada aconteceu. Ainda agora a tentativa de revogação da Lei da Anistia também caracterizou a hipótese de desestabilização institucional. Silêncio total no palácio do Planalto, ainda bem que o Supremo resolveu a questão.
Suponhamos a eclosão de uma crise nas instituições democráticas, como a decisão do Piauí de separar-se da União ou a mobilização dos monarquistas para coroar o Lula como Imperador Perpétuo do Brasil. Bobagens, dirão os doutos, mas possíveis, alerta a Constituição pela simples criação do Conselho da República em seus artigos 89 e 90. O problema é que se o presidente fosse obrigado a convocá-lo, da noite para o dia, não teria como. Porque não está constituído. Faltam os seis cidadãos maiores de 35 anos…
Na Defesa, repete-se a omissão
Outro órgão constitucional de consulta do presidente da República igualmente ignorado e desprezado pelos detentores do poder é o Conselho de Defesa Nacional, polvilhado de mais ministros e de comandantes militares. Também jamais se reuniu, ainda que em suas atribuições encontre-se opinar sobre a decretação de intervenção nos estados e no distrito federal.
A omissão do palácio do Planalto surge até mais gritante do que no caso do Conselho da República. Tome-se, em sua competência variada, a obrigação do Conselho de Defesa Nacional “de propor critérios e condições de utilização de áreas indispensáveis à segurança do território nacional e opinar sobre seu efetivo uso, especialmente na faixa de fronteira e nas relacionadas com a preservação e a exploração de recursos naturais de qualquer tipo”.
Há quanto tempo imensas glebas tem sido entregues a tribos indígenas? E nas faixas de fronteira, como o território hoje em poder dos Ianomani, como a reserva Raposa-Serra do Sol, posta à disposição de diversas etnias. Por coincidência, recursos naturais existem aos montes nessas regiões, de minerais nobres como nióbio e urânio até jazidas variadas de ouro e diamantes. Deram de ombros Fernando Henrique, que inaugurou essa singular temporada de doações próximas da irresponsabilidade e à disposição da cobiça internacional, e Luiz Inácio da Silva, que vem completando com rara diligência a alienação de partes do país.
Não teria sido o caso de múltiplas reuniões do Conselho de Defesa Nacional, nos últimos dezesseis anos, ao menos para apreciar a lambança? Mas alguém se reuniu?
Há quem atribua ao corporativismo partidário tamanha ausência de iniciativas obrigatórias. Primeiro os tucanos, agora os companheiros, igualam-se no desprezo e no medo da participação de setores infensos a rezar pelas suas cartilhas de governar. O absolutismo dos presidentes da República e de seus acólitos revela-se como razão maior desse comportamento egoísta. São eles que devem decidir sobre tudo, sem conselhos de qualquer espécie…
Por último, os ex-presidentes
Tanto na lei quanto nos costumes, são muitos os países onde seus ex-presidentes são freqüentemente convocados pelos governos atuais. Mesmo adversários, pertencendo a partidos distintos, em momentos cruciais eles contribuem com sua experiência para a solução de problemas graves. Alguns, até, tem assento nos respectivos Senados, faltando-lhes apenas o direito de voto, entre os demais.
Não raro a gente vê na televisão ex-presidentes dos Estados Unidos cumprindo missões ou reunidos para assessorar o último sucessor. Como ex-presidentes da França, também.
Aqui entre nós, numa única oportunidade, nos últimos oito anos, o presidente Lula reuniu seus antecessores, mesmo assim excluindo Fernando Collor, então respondendo a processo no Supremo Tribunal Federal. Foi quando voaram com ele, para Roma, José Sarney e Fernando Henrique, unindo-se lá a Itamar Franco, então embaixador do Brasil na Itália, para a coroação do papa Bento XVI.
É claro que agora, em período eleitoral, ficam mais difíceis os conselhos e até os diálogos entre personalidades tão díspares, mas o futuro presidente da República, seja José Serra, seja Dilma Rousseff, só teriam a ganhar se de quando em quando convocassem os antecessores, a começar pelo Lula, Fernando Henrique, Itamar Franco, Fernando Collor e José Sarney. Ou se deixarão levar pelo absolutismo?
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