"Nós, os monarcas, somos incontestavelmente constantes em um mundo em constante transformação. Pelo motivo de termos estado sempre aqui, mas também por não nos envolvermos na política cotidiana. Estamos informados das mudanças políticas que acontecem em nossas sociedades, mas não fazemos comentários sobre isso. É nisso que assumimos uma posição única. Nenhum dos outros monarcas europeus interfere na política."

Margarethe II, Rainha da Dinamarca

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Monarquia & Pluralismo.


Em diversas ocasiões, onde ocorrem debates a respeito da MONARQUIA, surgem sempre questionamentos quanto à diversidade religiosa, étnica, política, regional, de opção sexual e etc, dentro de um regime monárquico.

Perguntas que sempre levam a assuntos como liberdade de consciência, federalismo, respeito às minorias, autonomia dos particulares e etc. Além de o grande público sempre confundir o monarquismo atual com aquilo que não existe há mais de dois séculos no Ocidente: o despotismo absoluto, muitos nem se dão conta de que a construção republicana sempre foi, de qualquer maneira, limitada, mesmo que declaradamente popular e universal.

Tanto pela sua natureza oligárquica restrita a direitos e liberdades apenas nominais, quanto pela sua natureza chauvinista, restrita àqueles que falam um determinado idioma ou pertencem a uma determinada tribo ou religião.

Qualquer sistema republicano nasceu de necessidades específicas de formações oligárquico-burguesas que ampliaram a sua base de participação popular e criaram um Estado capaz de ocupar-se de uma definição plausível dessa ficção chamada de povo, baseada numa língua, numa etnia ou numa religião. A aglutinação ocorreu sempre em torno de um núcleo étnico-linguístico-religioso específico que é tomado como modelo.



Na América hispânica, os descendentes de espanhóis, diante da acefalia de uma metrópole invadida por Napoleão e do medo de uma revolta das classes inferiores, incentivados pelos britânicos, tomaram de assalto a administração colonial e cooptaram em suas respectivas construções “criollas”, mesmo que não completamente, as massas indígenas nativas.

Nessas repúblicas, os nexos unificadores não mais se deram de acordo com relações de suserania e vassalagem com o soberano espanhol, mas segundo esse modelo imposto pelo núcleo de formação nacional. A América espanhola prévia a independência, era um mosaico de grupos de todo o tipo, formais e informais, intrincados ou sobrepostos uns aos outros que mantinham relações com autoridades dinásticas complexas e emaranhadas.

Os antigos Estados territoriais dinásticos tinham a capacidade de combinar em uma mesma unidade política populações completamente heterogêneas. Conseguiam reunir sob o comando político do soberano um conjunto de territórios de características distintas.


A relação direta com alguém que personifique o interesse público, um monarca, potencialmente preserva a própria maneira de ser de cada particular. Na realidade, num país monárquico o enquadramento do público não é um fim em si mesmo.

O que faz, por mais estranho que isso possa parecer, da monarquia constitucional uma organização capaz de ser bem mais pluralista do que qualquer república.

No parlamentarismo monárquico, a soberania do Estado continua nas mãos de uma família real, embora hodiernamente com a aquiescência, com a vigilância de seus súditos. Não é transferida para uma ficção a ser neuroticamente construída, chamada de povo. Os nexos unificadores são de outra natureza: materializam-se na figura do soberano.

Reino Unido, Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Belize, Jamaica, Gibraltar e Papua Nova Guiné são países diferentes, unificados apenas pela pessoa de Sua Majestade, Elizabeth II. O direito escocês é baseado no direito Romano, enquanto que o direito inglês é costumeiro. A língua oficial na Ilha de Man é o gaélico, enquanto que nas Ilhas Anglo-Normandas, é o francês.

Na Espanha, castelhanos, bascos, catalães, andaluzes e galegos se acomodam lado a lado. A unidade do Estado espanhol é representada pela figura do Rei Juan Carlos I. Na Bélgica, as disputas entre valões e flamengos são transcendidas pela presença de Alberto II.

Um país monárquico é definido pelos domínios de sua coroa, sejam eles franceses ou ingleses, cristãos ou muçulmanos, europeus ou africanos.


A proibição de símbolos religiosos nas escolas francesas demonstra claramente a imposição de um modelo republicano que é laico apenas no sentido religioso. Enquanto que na América hispânica, a república apenas seria amplamente realizável, se surgisse a partir de seus elementos indígenas, no Irã, ela somente pôde se configurar como uma proposta realmente popular, a partir de uma identidade religiosa islâmica.

Mesmo assim, é certa a insatisfação da maioria dos iranianos com os rumos da revolução dos mulás e não há garantias de que uma república indígena na América não resultaria no desastre que hoje é o Haiti. Esse país antilhano foi fundado por uma revolta de ex-escravos. Atualmente, as diferenças, apesar das semelhanças, entre o Haiti e a Jamaica talvez expliquem o porquê de Kingston ainda permanecer dentro do modelo de Westminster.

De qualquer forma, colocando de lado as conjecturas, resumindo e explicando melhor, a ideia de que a construção republicana é especialmente isenta, universal, pluralista e racional é uma falácia. Todos os nacionalismos republicanos, mesmos os mais populares ou populistas, revelam um quê de auto-afirmação, e às vezes até de super-imposição, do que seja o público.



por: Alexandre Otávio Cavalcanti de Carvalho é monarquista de Recife e sócio fundador do ex-Círculo Monárquico de Pernambuco

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