Em diversas ocasiões, onde ocorrem debates a respeito da MONARQUIA, surgem sempre questionamentos quanto à diversidade religiosa, étnica, política, regional, de opção sexual e etc, dentro de um regime monárquico.
Perguntas que sempre levam a assuntos como liberdade de consciência, federalismo, respeito às minorias, autonomia dos particulares e etc. Além de o grande público sempre confundir o monarquismo atual com aquilo que não existe há mais de dois séculos no Ocidente: o despotismo absoluto, muitos nem se dão conta de que a construção republicana sempre foi, de qualquer maneira, limitada, mesmo que declaradamente popular e universal.
Tanto pela sua natureza oligárquica restrita a direitos e liberdades apenas nominais, quanto pela sua natureza chauvinista, restrita àqueles que falam um determinado idioma ou pertencem a uma determinada tribo ou religião.
Qualquer sistema republicano nasceu de necessidades específicas de formações oligárquico-burguesas que ampliaram a sua base de participação popular e criaram um Estado capaz de ocupar-se de uma definição plausível dessa ficção chamada de povo, baseada numa língua, numa etnia ou numa religião. A aglutinação ocorreu sempre em torno de um núcleo étnico-linguístico-religioso específico que é tomado como modelo.
Na América hispânica, os descendentes de espanhóis, diante da acefalia de uma metrópole invadida por Napoleão e do medo de uma revolta das classes inferiores, incentivados pelos britânicos, tomaram de assalto a administração colonial e cooptaram em suas respectivas construções “criollas”, mesmo que não completamente, as massas indígenas nativas.
Nessas repúblicas, os nexos unificadores não mais se deram de acordo com relações de suserania e vassalagem com o soberano espanhol, mas segundo esse modelo imposto pelo núcleo de formação nacional. A América espanhola prévia a independência, era um mosaico de grupos de todo o tipo, formais e informais, intrincados ou sobrepostos uns aos outros que mantinham relações com autoridades dinásticas complexas e emaranhadas.
Os antigos Estados territoriais dinásticos tinham a capacidade de combinar em uma mesma unidade política populações completamente heterogêneas. Conseguiam reunir sob o comando político do soberano um conjunto de territórios de características distintas.
A relação direta com alguém que personifique o interesse público, um monarca, potencialmente preserva a própria maneira de ser de cada particular. Na realidade, num país monárquico o enquadramento do público não é um fim em si mesmo.
O que faz, por mais estranho que isso possa parecer, da monarquia constitucional uma organização capaz de ser bem mais pluralista do que qualquer república.
No parlamentarismo monárquico, a soberania do Estado continua nas mãos de uma família real, embora hodiernamente com a aquiescência, com a vigilância de seus súditos. Não é transferida para uma ficção a ser neuroticamente construída, chamada de povo. Os nexos unificadores são de outra natureza: materializam-se na figura do soberano.
Reino Unido, Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Belize, Jamaica, Gibraltar e Papua Nova Guiné são países diferentes, unificados apenas pela pessoa de Sua Majestade, Elizabeth II. O direito escocês é baseado no direito Romano, enquanto que o direito inglês é costumeiro. A língua oficial na Ilha de Man é o gaélico, enquanto que nas Ilhas Anglo-Normandas, é o francês.
Na Espanha, castelhanos, bascos, catalães, andaluzes e galegos se acomodam lado a lado. A unidade do Estado espanhol é representada pela figura do Rei Juan Carlos I. Na Bélgica, as disputas entre valões e flamengos são transcendidas pela presença de Alberto II.
Um país monárquico é definido pelos domínios de sua coroa, sejam eles franceses ou ingleses, cristãos ou muçulmanos, europeus ou africanos.
A proibição de símbolos religiosos nas escolas francesas demonstra claramente a imposição de um modelo republicano que é laico apenas no sentido religioso. Enquanto que na América hispânica, a república apenas seria amplamente realizável, se surgisse a partir de seus elementos indígenas, no Irã, ela somente pôde se configurar como uma proposta realmente popular, a partir de uma identidade religiosa islâmica.
Mesmo assim, é certa a insatisfação da maioria dos iranianos com os rumos da revolução dos mulás e não há garantias de que uma república indígena na América não resultaria no desastre que hoje é o Haiti. Esse país antilhano foi fundado por uma revolta de ex-escravos. Atualmente, as diferenças, apesar das semelhanças, entre o Haiti e a Jamaica talvez expliquem o porquê de Kingston ainda permanecer dentro do modelo de Westminster.
De qualquer forma, colocando de lado as conjecturas, resumindo e explicando melhor, a ideia de que a construção republicana é especialmente isenta, universal, pluralista e racional é uma falácia. Todos os nacionalismos republicanos, mesmos os mais populares ou populistas, revelam um quê de auto-afirmação, e às vezes até de super-imposição, do que seja o público.
por: Alexandre Otávio Cavalcanti de Carvalho é monarquista de Recife e sócio fundador do ex-Círculo Monárquico de Pernambuco
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