"Nós, os monarcas, somos incontestavelmente constantes em um mundo em constante transformação. Pelo motivo de termos estado sempre aqui, mas também por não nos envolvermos na política cotidiana. Estamos informados das mudanças políticas que acontecem em nossas sociedades, mas não fazemos comentários sobre isso. É nisso que assumimos uma posição única. Nenhum dos outros monarcas europeus interfere na política."

Margarethe II, Rainha da Dinamarca

sábado, 6 de novembro de 2010

Isabel a primeira

Regente do Império, princesa foi pioneira no poder feminino no Brasil

Flávio Henrique Lino
O GLOBO

As duas são filhas de Pedros. Uma nasceu em 1846; a outra, em 1947. Uma tinha pai brasileiro e mãe estrangeira; a outra, mãe brasileira e pai estrangeiro.

Uma veio ao mundo em berço nobre e virou plebeia pela força das armas; a outra nasceu plebeia e empunhou armas antes de virar “nobre”.

A primeira terminou sua carreira pública nos anos 1880; a segunda começou a sua nos anos 1980.

Uma foi tirada do cargo pela República; a outra ganhou o seu por causa dela.

Ambas herdaram o poder: uma do pai imperador, a outra do padrinho presidente.

No entanto, embora entre semelhanças e coincidências inversas suas biografias se encontrem nos desvãos da História — onde domingo passado Dilma Vana Rousseff escreveu seu nome como a primeira mulher eleita presidente do país — coube a outra brasileira a primazia de ser a primeira representante do sexo nem-tão-frágil-assim a governar de fato o Brasil independente.

Regente do Império em três ocasiões entre 1871 e 1888, durante viagens de Pedro II ao exterior, Isabel de Orleans e Bragança tornou-se chefe de Estado em exercício — esquentando o trono para o retorno do pai ausente.

A rigor a rigor, o bastão de pioneira seria da avó da Princesa Isabel, Leopoldina, nomeada chefe do Conselho de Estado e regente interina pelo ainda príncipe D. Pedro quando este viajou a São Paulo em agosto de 1822, véspera da Independência.

No fatídico 7 de setembro, data de nascimento do novo país, era Leopoldina quem respondia oficialmente pela direção do governo no Rio de Janeiro, enquanto D. Pedro ainda estava em terras paulistas.

Mas, com o marido a poucos dias a cavalo da capital, pode-se dizer que a futura imperatriz apenas fazia o meio de campo enquanto o futuro imperador não retornava para dar as ordens.

Já Isabel, com o pai ausente a um ou dois continentes de distância, ficou no cargo por 3 anos e 4 meses — quase um mandato presidencial.

Não que o tempo a mais e a distância do pai imperador tivessem feito grandes diferenças.

Segundo historiadores, a princesa — embora contasse com poderes garantidos pela Constituição de 1824 — não tinha gosto pelo exercício do governo, e ateve-se a um papel mais tradicional para uma mulher do século XIX.

— Ela sempre se encarregou da regência a contragosto, mantendose fiel e dócil ao sistema e estilo de governo do seu pai — disse ao GLOBO, de Vancouver, no Canadá, o brasilianista Roderick Barman, historiador do Departamento de História da Universidade da Colúmbia Britânica e autor da biografia “Isabel, Princesa do Brasil”.

— Seu marido, o conde d’Eu, é quem escrevia as cartas aos ministros e tomava para si o estudo dos documentos apresentados pelo Gabinete.

Despertada pelo abolicionismo

Um estilo que muitos apostam que pode se repetir agora com Dilma no governo, com a sombra de Lula por trás dela.

No entanto, diferentemente da presidente eleita, que já deu mostras de sobra de sua vontade de tomar nas mãos as rédeas das decisões e teve papel de virtual primeira-ministra no governo Lula, a princesa teria sempre mostrado apatia em relação ao poder nas duas primeiras regências, em 1871 e 1876.

Apenas na terceira, em 1888, com o país inflamado pelo abolicionismo, da qual era uma fervorosa defensora, Isabel teria resolvido exercer de fato suas prerrogativas de regente.

E aí fez História com H maiúsculo.

Decidida a apressar a libertação dos escravos, mas encontrando resistência obstinada por parte do chefe do Gabinete, o barão de Cotegipe, a regente finalmente meteu o pé na porta.

A gota d’água foi a violenta repressão policial a uma passeata abolicionista no Rio de Janeiro em março de 1888.

“Há tempos minhas ideias divergiam das do Ministério”, explicou em carta ao pai, na Europa, relatando como forçou a demissão do Gabinete.

“Não me arrependo do que fiz (...) e em consciência não devia continuar com um Ministério, quando eu por mim mesma sentia e estava convencida de que ele não preenchia as aspirações do país nas circunstâncias atuais”.

A regente, então, escolheu pessoalmente o novo chefe do Gabinete, João Alfredo, dando-lhe carta branca para agir, e deixando claro que não aceitaria mais protelações.

Uma defensora do voto feminino

No dia 13 de maio de 1888, colocou o trono na linha de tiro ao assinar a Lei Áurea, que aboliu a escravidão no país, mas tirou da monarquia seu último sustentáculo: a aristocracia cafeeira do Vale do Paraíba. Instada pelo marido a não assinar a lei aprovada pelo Parlamento, por seu potencial de perigo à Coroa, Isabel não titubeou:

“É agora ou nunca!”.

E ao barão de Cotegipe, que ao cumprimentá-la pelo ato, disse que a regente “libertou uma raça, mas perdeu o trono”, a princesa também foi categórica:

“Mil tronos tivesse, mil tronos daria para libertar os escravos do Brasil”.

— O movimento abolicionista despertou nela um gosto pelos assuntos públicos — ressalta Barman.

— A abolição teria acontecido mais dia menos dia, mas a ação da regente foi indispensável para o desfecho rápido e pacífico da crise.

A abolição renovou o prestígio da monarquia, e a nova Isabel, moldada na luta abolicionista, gostou do resultado que suas ações poderiam trazer ao país.

Numa carta ao visconde de Santa Victoria em agosto de 1889, três meses antes do golpe de Estado da Proclamação da República, deixou claras suas intenções para o momento — que nunca chegaria — em que se tornaria imperatriz.

Já removida da regência pelo retorno de D. Pedro II em agosto de 1888, a princesa deu seu apoio à indenização dos ex-escravos para que pudessem se estabelecer como agricultores, e também à revolucionária ideia do sufrágio feminino — que nenhum país da época instituíra.

“Quero agora dedicar-me a libertar as mulheres do cativeiro doméstico. Se a mulher pode reinar, também pode votar”.

— Ainda há um desconhecimento muito grande sobre quem foi a Princesa Isabel — aponta Bruno de Cerqueira, do Instituto D. Isabel I a Redentora.

— É um grande erro falar somente de sua atuação pela Lei Áurea, quando ela foi uma personagem muito mais rica.

6 comentários:

  1. Avante com o movimento imperialista no brasil!
    tem todo o meu apoio.

    HELENA.

    ResponderExcluir
  2. A República é a página negra que o BRASIL ainda está por virar em sua história.

    Mª Helena - BA.

    ResponderExcluir
  3. Confio em DEUS e no futuro promissor de meu País e hei de assistir a retomada para o imperialismo brasileiro. Nada pode ser mais justo e creio que seja por direito adquirido o que houve com a expulsão da coroa foi uma conspiração mentirosa, usurpadora e fracassada que fez com que o Brasil atravessasse momentos negros e confusos até os nossos dias.

    Mª Helena - Ba.

    ResponderExcluir
  4. Estamos vivendo os últimos dias de República no Brasil.

    ResponderExcluir
  5. É uma grande pena que essa personagem tão importante em nossa História tenha sido reduzida a uma coadjuvante nos livros escolares. A trajetória de vida da Princesa Isabel, antes e depois da Abolição, é fascinante e deveria inspirar a todos em nosso país.

    ResponderExcluir