O voto distrital não é panaceia infalível, mas deixaria o país mais próximo de fortalecer a sua própria democracia representativa
Sondagem do Instituto Paraná Pesquisas, feita sob encomenda deste jornal e divulgada na edição da última sexta-feira, traz uma revelação que, se não é surpreendente, constitui-se num sintoma pronto e acabado da desimportância que os eleitores curitibanos conferem aos vereadores e, por extensão, à própria Câmara Municipal. Segundo a pesquisa, no fim de dezembro, passados menos de três meses da eleição, quase 40% deles já diziam não se lembrar em que candidato a vereador votaram – índice que, com certeza, vai crescer ainda mais com a passagem do tempo.
A falta de memória dos eleitores em relação ao próprio voto não se restringe ao caso da Câmara de Curitiba, mas se estende certamente a todos os Legislativos em todas as esferas – municipal, estadual e federal. Poucos são capazes de recordar os nomes dos deputados que, há dois anos, ajudaram a colocar na Assembleia ou na Câmara Federal; no máximo, lembram-se dos candidatos que mereceram seus votos em pleitos majoritários, como os de prefeitos, governadores ou presidentes. A que se deve esta falta de memória? E há cura para ela?
São duas perguntas que, na aparência simples, levam a reflexões mais profundas. A primeira delas: a maioria da população ignora o papel institucional dos legisladores e dos Legislativos. A segunda: os próprios eleitos e as respectivas instituições a que servem contribuem para torná-los irrelevantes frente ao interesse público. É da soma destes dois fatores – ignorância involuntária dos eleitores e autoirrelevância dos eleitos – que nasce o expressivo e precoce esquecimento constatado pela pesquisa.
Imagina-se que a sonhada (e nunca realizada) reforma política possa contribuir para debelar esses fenômenos que tanto mal fazem à democracia. Das muitas propostas em trâmite no Congresso, algumas de fato urgentes, como a criação de cláusulas de barreira para impedir a proliferação de partidos de aluguel e o fim das coligações partidárias, pensa-se também na instituição do voto distrital (puro ou misto) em substituição ao sistema proporcional hoje vigente.
O voto distrital puro supõe a criação de territórios delimitados dentro dos quais os candidatos (um de cada partido) disputariam os eleitores da mesma circunscrição. Seriam pequenas eleições majoritárias: ganharia quem obtivesse mais votos – ao contrário do que hoje ocorre no sistema proporcional, pelo qual sagram-se vencedores não necessariamente os mais votados, mas os pertencentes aos partidos (ou coligações) que atingiram quocientes maiores, criando graves distorções quanto à verdadeira expressão da vontade popular.
A aparente vantagem desse sistema é a de permitir que os eleitores, dada à proximidade física com os candidatos, tenham melhor chance de conhecê-los (até pessoalmente) e, portanto, de não esquecer em quem votaram. Agregue-se a este outro fator importante: em tese, os candidatos obrigatoriamente estariam mais identificados com as aspirações dos eleitores do próprio distrito. Assim, para ficar no exemplo de Curitiba, mantido em 38 o atual número de cadeiras, a Câmara Municipal seria composta sempre pelos mais votados representantes dos supostos 38 distritos eleitorais em que a capital fosse dividida, de tal modo que nenhuma região da cidade deixaria de ter seu próprio vereador.
O defeito deste sistema é que ele pode limitar a representação popular aos chamados “líderes comunitários”, restringindo a chance de o Legislativo contar com a contribuição de outras categorias sociais importantes que vão além dos restritos interesses bairristas – por exemplo, especialistas ou líderes em áreas como educação, saúde, segurança ou esportes. Daí o fato de muitos defenderem um sistema misto, pelo qual determinado número de cadeiras seja disputado pelo processo proporcional.
Seguramente, não são panaceias infalíveis para curar o mal do esquecimento e do desinteresse da população tão logo termine a apuração dos votos.
Mas, com certeza, se o Brasil se espelhar no exemplo das melhores democracias do mundo e que, de modo geral, adotam o voto distrital, estará mais próximo de fortalecer a sua própria democracia representativa.
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