"Nós, os monarcas, somos incontestavelmente constantes em um mundo em constante transformação. Pelo motivo de termos estado sempre aqui, mas também por não nos envolvermos na política cotidiana. Estamos informados das mudanças políticas que acontecem em nossas sociedades, mas não fazemos comentários sobre isso. É nisso que assumimos uma posição única. Nenhum dos outros monarcas europeus interfere na política."

Margarethe II, Rainha da Dinamarca

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Quais são os limites da imunidade parlamentar?


1. O que é?

É uma medida que obriga a Justiça a pedir licença à Câmara ou ao Senado para processar membros do Legislativo por crimes ligados às atividades parlamentares (discurso e voto, por exemplo). É adotada por quase todos os países democráticos do mundo e, na essência, visa a garantir a liberdade de expressão do Legislativo. Sem imunidade, a cada vez que um deputado de oposição fizesse um discurso desfavorável ao governo, por exemplo, ele poderia ser processado, o que dificultaria seu trabalho.

2. Quando foi criada?

No século 17, na Inglaterra. É resultado da teoria da separação dos poderes. A idéia é impedir que o Executivo e o Judiciário limitem o trabalho do Legislativo.

3. Como ela funciona?

Durante o mandato, deputados e senadores não podem ser presos (salvo em casos de flagrante de crimes inafiançáveis) e só podem ser processados pelo Supremo Tribunal Federal – instância máxima da Justiça brasileira (no caso de deputados estaduais, são processados pelo Tribunal de Justiça).

4. Ela gera impunidade?

Até 2001, a lei de imunidade no Brasil dizia que os membros do Legislativo podiam recorrer ao benefício mesmo em caso de crime comum (homicídio, por exemplo). A Constituição também mandava suspender automaticamente os processos movidos contra quem conseguisse uma vaga no Congresso. Uma emenda em 2001 mudou a situação. Os crimes comuns cometidos antes da eleição de um político não podem mais ser suspensos. E, em caso de crimes cometidos depois da eleição, o Supremo leva o processo adiante e só o interrompe se o Congresso se manifestar contra. Como os congressistas sabem que esse tipo de recurso soa quase como uma admissão de culpa para a opinião pública, a chance de se protegerem mutuamente é menor.


As polêmicas declarações do deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ) sobre negros e homossexuais reacenderam um debate que há anos divide os especialistas: quais são os limites da imunidade parlamentar?

O artigo 53 da Constituição diz que deputados e senadores não podem ser processados na Justiça por suas opiniões, mas muitos especialistas acreditam que essa proteção só é aplicável a situações relacionadas ao exercício do mandato.

Numa entrevista a um programa de televisão na semana passada, Bolsonaro disse que não corre o “risco” de ter um filho envolvido amorosamente com uma mulher negra porque seus filhos foram “muito bem-educados”.

Nos dias seguintes, o deputado disse que durante o programa entendeu que a pergunta se referia à possibilidade de um de seus filhos ter um caso homossexual, e não um romance com uma mulher negra.

O episódio provocou até agora sete representações contra Bolsonaro na Comissão de Ética da Câmara, por falta de decoro parlamentar. Vários grupos estudam a apresentação de ações contra Bolsonaro por racismo e discriminação.

Para o advogado Ives Gandra Martins, a Constituição protege Bolsonaro e não há o que fazer. “Sou daqueles que prefere sofrer o desconforto de manifestações [como essa] do que optar pelo cerceamento da liberdade de expressão”, disse.

O professor André Ramos Tavares, que dá aulas na PUC e no Mackenzie, pensa igual: “O parlamentar precisa fazer o uso da palavra sem se preocupar se vai ofender outro político, outro partido, se vai ser ameaçado de processo”.

Antonio Gonçalves, professor da PUC, acha que Bolsonaro deveria perder a imunidade nesse caso se ficasse caracterizado que ele foi racista na entrevista. “Liberdade de expressão e pensamento é uma coisa, racismo é outra”, disse. “É um crime imprescritível.”

A professora de direito constitucional da UnB Soraia da Rosa Mendes observa que Bolsonaro foi questionado “como pai” e não como deputado, situação em que perderia o direito à imunidade: “Não respondeu o parlamentar, respondeu o indivíduo”.

JURISPRUDÊNCIA

O STF (Supremo Tribunal Federal) examinou o problema pelo menos duas vezes. Em 2002, permitiu que Eurico Miranda, então deputado e presidente do clube Vasco da Gama, fosse processado por acusações feitas ao patrocinador de um time rival.

Em decisão unânime, o STF entendeu que ele fizera as acusações quando usava o chapéu de dirigente do Vasco, e não como deputado.

Em 2003, o Supremo rejeitou denúncia apresentada contra o então deputado estadual João Correia (PMDB-AC), que chamara um juiz federal de “juizinho papalvo, medíocre, suspeito, miúdo” em discursos e entrevistas. A denúncia foi rejeitada por 8 votos a 1.

“Como cidadão, lamento muito que o parlamentar possa chegar a excesso tal”, disse em seu voto o ministro Cezar Peluso, que hoje preside o STF. “Como juiz, não tenho dúvida de que a imunidade o resguarda.”


ROGERIO PAGNAN / JOSÉ BENEDITO DA SILVA

Editoria de Arte/Folhapress

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