"Nós, os monarcas, somos incontestavelmente constantes em um mundo em constante transformação. Pelo motivo de termos estado sempre aqui, mas também por não nos envolvermos na política cotidiana. Estamos informados das mudanças políticas que acontecem em nossas sociedades, mas não fazemos comentários sobre isso. É nisso que assumimos uma posição única. Nenhum dos outros monarcas europeus interfere na política."

Margarethe II, Rainha da Dinamarca

sábado, 18 de janeiro de 2014

A busca por uma Corte Constitucional para chamar de nossa


Na última semana, ganhou ampla divulgação proposta de emenda à Constituição apresentada pela Deputada Luiza Erundina (PEC 275/2013), que tem por finalidade alterar a competência e a composição do Supremo Tribunal Federal. A proposta também altera o nome do tribunal, que passaria a chamar-se Corte Constitucional. Aparentemente, a PEC inspira-se em sugestão apresentada em 2013 pelo professor Fábio Konder Comparato.

A ideia não é totalmente nova. Há outras propostas parecidas, em trâmite no Congresso Nacional, relacionadas, por exemplo, ao método de escolha dos ministros que compõem o Supremo Tribunal Federal.

A proposta contida na PEC 275/2013 coincide, em alguns pontos, com o que venho defendendo há alguns anos. Em alguns textos da coluna Processo Novo, aqui na ConJur, tenho tratado do tema. Em 2012, analisando a PEC 209/2012, a Comissão Nacional de Acesso à Justiça da OAB apresentou sugestão semelhante, que, contudo, foi rejeitada pelo Conselho Federal da entidade.

A PEC 275/2013 tem vários pontos positivos.

Além de modificar os critérios de escolha dos membros do STF, com a apresentação de listas prévias à Presidência da República, altera a competência dos tribunais superiores, otimizando sua atuação. Assim, passa a caber recurso extraordinário somente contra decisões proferidas por tribunais superiores, a ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (ou Corte Constitucional, nome dado ao referido tribunal pela PEC); contra decisões proferidas por tribunais locais (Regionais Federais e dos Estados), cabe apenas recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça. A proposta também amplia o número de ministros do Superior Tribunal de Justiça. A PEC acerta, a meu ver, ao reduzir a competência originária do Supremo Tribunal Federal.

Considero, contudo, que a proposta deve ser aperfeiçoada.

Embora pretenda transformar o Supremo Tribunal Federal em uma corte constitucional, a PEC mantém-se presa a estrutura ultrapassada, prevista na Constituição Federal de 1988, que dividiu a competência dos tribunais superiores, no que respeita aos recursos extraordinário e especial, tendo em consideração a natureza das questões (constitucional ou federal infraconstitucional).

Essa separação não faz mais sentido. O Superior Tribunal de Justiça resolve questões federais à luz da Constituição — e não poderia ser diferente. Parece mais adequado, assim, que em recurso especial possa se alegar tanto violação à norma constitucional quanto federal-infraconstitucional. Essa solução teria também a vantagem de preencher o vácuo em que se encontra o sistema jurídico brasileiro, já que, hoje, inexiste tribunal de superposição que elimine controvérsias de interpretação acerca da norma constitucional, quando se entender que a questão não tem repercussão geral.

Considero que a PEC 275/2013 deve ser aprimorada também em outro ponto. Refiro-me à previsão de cabimento de recurso especial somente quando “a decisão recorrida der à lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal”, o que corresponde à hipótese prevista na alínea c do artigo 105, III da Constituição, em sua atual redação.

Nesse ponto, a sugestão é melhor que a prevista na “PEC do STJ”, que cria o requisito da relevância da questão federal para o recurso especial, pois enaltece um dos papéis fundamentais do Superior Tribunal de Justiça, que é o de promover a uniformidade de interpretação do direito federal. Peca a proposta, contudo, ao não admitir recurso especial quando se alegar violação à lei federal, ainda que inexista dissídio jurisprudencial. Pode suceder, assim, que questões de direito federal novas ou que emerjam de apenas um dos tribunais locais não possam ser objeto de decisão, pelo Superior Tribunal de Justiça. Penso que a hipótese de cabimento prevista atualmente na alínea a do artigo 105, III da Constituição não pode ser totalmente afastada — ainda que, no caso dessa alínea, se preveja o requisito da relevância da questão federal, tal como previsto na PEC 209/2012.

Quanto à conveniência de se alterar o nome do Supremo Tribunal Federal, que passaria a ser chamado de Corte Constitucional, confesso ter minhas dúvidas. Por um lado, a modificação do nome do tribunal, a rigor, não altera substancialmente sua função e razão de existir. Caso a Constituição passe a chama-lo de Corte Constitucional, contudo, é certo que isso terá importante papel simbólico, e poderá deixar marcas no modo como se comportam os juízes de tal corte.

José Miguel Garcia Medina 

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