Gustavo Garcia
São diversas as propostas de reforma previdenciária
apresentadas pelo governo, tendo como traço comum tornar mais difícil o direito
e o acesso às prestações previdenciárias.
A principal justificativa para tornar mais rigorosos os
requisitos de recebimento dos benefícios previdenciários decorre da necessidade
de equilíbrio financeiro da Previdência Social, objetivando reduzir o seu
suposto déficit.
Na verdade, qualquer reforma da Previdência Social precisa
considerar, primeiramente, a sua necessária inserção no âmbito mais amplo da
Seguridade Social, como sistema que também abrange a Saúde e a Assistência
Social, conforme determinação constitucional (artigo 194).
A manutenção da Previdência Social, assim, faz parte do
custeio da Seguridade Social, o qual ocorre não só de forma direta, ou seja,
por meio de contribuições sociais, mas também indireta, isto é, com a
utilização de recursos dos orçamentos fiscais dos entes políticos (artigo 195
da Constituição da República).
Nesse sentido, o princípio da diversidade da base de financiamento
da Seguridade Social (artigo 194, parágrafo único, inciso VI, da Constituição
Federal de 1988) impõe que o seu custeio, inclusive quanto à esfera
previdenciária, ocorra por meio de diversas formas, bases e sujeitos.
Portanto, as contribuições previdenciárias, destinadas
exclusivamente ao pagamento de prestações do Regime Geral de Previdência Social
(artigo 195, incisos I, a, II e art. 167, inciso IX, da Constituição da
República), não constituem a única fonte de custeio do sistema previdenciário. Além
de diversas outras contribuições para a Seguridade Social, há previsão
constitucional de seu financiamento por toda a sociedade.
As contribuições para a Seguridade Social do empregador, da
empresa e da entidade a ela equiparada não se resumem àquela incidente sobre a
folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados à pessoa
física que lhe preste serviço (mesmo sem vínculo empregatício), mas também
abrangem as contribuições sobre a receita ou o faturamento (Cofins), inclusive
do PIS/PASEP (artigo 239 da Constituição Federal de 1988), bem como sobre o
lucro (CSLL).
Além disso, há contribuições para a Seguridade Social do
trabalhador e dos demais segurados da previdência social, bem como sobre a
receita de concursos de prognósticos e do importador de bens ou serviços do
exterior (ou de quem a lei a ele equiparar).
Justamente por isso, torna-se frágil a alegação de déficit
da Previdência Social quando sabemos que esta faz parte da Seguridade Social,
tendo contribuições sociais que deveriam ser vertidas ao orçamento próprio
(artigo 165, § 5º, inciso III, da Constituição Federal de 1988) e utilizadas
apenas para o custeio das respectivas prestações.
Revela-se insustentável a suposta insuficiência de recursos
da Seguridade Social se o que existe, na realidade, é a desvinculação de
contribuições da Seguridade Social, fazendo com que parte de seus valores
deixem de ser utilizados em suas finalidades específicas, relativas à concessão
das prestações previdenciárias, de saúde e de assistência social.
Aliás, de modo manifestamente contraditório com o discurso
de déficit da Previdência Social, a Emenda Constitucional 93, de 08 de setembro
de 2016, ao modificar o artigo 76 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias, ampliou o percentual de desvinculação de recursos da União (DRU),
passando a prever que são desvinculados de órgão, fundo ou despesa, até 31 de
dezembro de 2023, 30% da arrecadação da União relativa às contribuições
sociais.
Isso significa a existência de permissão ao poder público
para utilizar recursos inerentes à Seguridade Social com finalidades diversas,
tornando incongruente qualquer alegação de que o seu custeio atual da
Previdência não é suficiente para manter o necessário equilíbrio financeiro.
Como se pode notar, a legitimidade da reforma previdenciária
exige amplo debate com a sociedade, com a apresentação de dados reais e
completos sobre os recursos públicos e a sua forma de utilização, sem se deixar
levar por discursos inconsistentes e padronizados.
Nenhum comentário:
Postar um comentário